Eugênio Aragão e protesto contra aprovação do PL 490 na Câmara (Foto: Reprodução/TV 247 | Lula Marques/ABr) |
"Não pode chegar uma lei e mudar aquilo que a Constituição diz”, assegurou o ex-ministro da Justiça em entrevista à TV 247
30 de maio de 2023
247 - O advogado e ex-ministro da Justiça Eugênio Aragão participou nesta terça-feira (30) do Boa Noite 247, da TV 247, e comentou sobre a aprovação do PL 490 pela Câmara, o chamado marco temporal, que restringe a demarcação de terras indígenas e desmonta uma série de direitos dos povos originários brasileiros.
Aragão disse que a
matéria aprovada pela Câmara fere a Constituição de 1988. “É uma proposta
flagrantemente inconstitucional”. O jurista lembrou que a Constituição
estabeleceu um marco temporal para as terras ocupadas por quilombolas até a
promulgação da Carta, em 5 de outubro de 1988. “Para os indígenas, não. A única
condição para a caracterização das terras indígenas é sua ocupação tradicional
ou imemorial. E isso daí é qualquer tempo, desde que eu consiga mostrar que é
imemorial. Você tem que ter uma demonstração concreta da imemorialidade em cada
caso”, afirmou Eugênio Aragão.
Para o ex-ministro
da Justiça, a aprovação do PL 490 pela Câmara representa uma cobiça sobre as
riquezas das terras indígenas. “As reservas fundiárias no Brasil são muito
restritas hoje. Se você quiser avançar, ou tem as terras devolutas, que são da
União, ou as terras protegidas pelo meio ambiente, ou as terras indígenas.
Então, a cobiça sobre estas terras é muito grande, principalmente quando elas
estão incrustadas em áreas valorizadas por causa do agronegócio, ou áreas
urbanas”, afirmou. “Na verdade, o que se quer é expulsar os indígenas das
terras que são preciosas”, acrescentou Aragão.
Para Eugênio
Aragão, está muito claro no Artigo 231 da Constituição que a imemorialidade
está garantida, apesar da aprovação do projeto de lei pela Câmara. “Isso é um
marco constitucional do artigo 231 da Constituição de 1988 e ponto final. Não
pode chegar uma lei e mudar aquilo que a Constituição diz”, acrescentou.
Câmara aprova projeto do marco temporal, em retrocesso para demarcação de terras indígenas
A Câmara dos
Deputados aprovou nesta terça-feira (30), por 283 votos a 155, o texto base do
Projeto de Lei 490, que restringe a demarcação de terras e desmonta uma série
de direitos dos povos indígenas. Houve uma abstenção. Deputados agora analisam
os destaques, sugestões de alteração no texto. Concluída esta etapa, o texto
vai ao Senado.
O projeto restringe
a demarcação de terras indígenas àquelas já tradicionalmente ocupadas por esses
povos em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da nova Constituição
federal.
De acordo com o
substitutivo, para serem consideradas terras ocupadas tradicionalmente deverá
ser comprovado objetivamente que essas terras, na data de promulgação da
Constituição, eram, ao mesmo tempo, habitadas em caráter permanente, usadas
para atividades produtivas e necessárias à preservação dos recursos ambientais
e à reprodução física e cultural.
Dessa forma, se a
comunidade indígena não ocupava determinado território antes desse marco
temporal, independentemente da causa, a terra não poderá ser reconhecida como
tradicionalmente ocupada.
Entre outros
pontos, o projeto, relatado pelo deputado Arthur Maia (União-BA), flexibiliza o
uso exclusivo de terras pelas comunidades e permite à União retomar áreas
reservadas em caso de alterações de traços culturais da comunidade (leia
mais abaixo).
O texto também:
- cria um “marco temporal” para
as terras consideradas "tradicionalmente ocupadas por
indígenas", exigindo a presença física dos índios em 5 de outubro de
1988
- permite contrato de
cooperação entre índios e não índios para atividades econômicas
- possibilita contato com povos isolados “para intermediar ação estatal de utilidade pública”