terça-feira, 4 de novembro de 2025

O Caos como Política de Segurança

 


 

Nota Política do Comitê Regional do PCB RJ

A política de segurança no estado do Rio de Janeiro, do governo de Cláudio Castro (PL), segue a tradicional lógica do enfrentamento entre polícia e bandido, como ficou claro na chacina dos Complexos do Alemão e da Penha. Uma lógica que já demonstrou há décadas a sua falência, pois coloca a população em meio ao fogo cruzado sem conseguir trazer segurança.

E foi justamente o que ocorreu neste 28 de outubro de 2025, quando a segunda maior cidade do país, a capital carioca, acordou sob o signo do terror. Estava em andamento mais uma operação policial desastrosa contra organizações criminosas que controlam a maior parte do território da cidade e da política no estado. Vale lembrar que, dentre as organizações criminosas, não está apenas o tráfico, mas também as milícias, com profundo enraizamento nos aparatos do Estado. É no mínimo estranho que haja silêncio e omissão sobre o combate a essas organizações.

A operação mais letal das forças policiais do Rio de Janeiro foi responsável pela morte, segundo o próprio governo do estado, de 64 pessoas, das quais quatro eram agentes do estado. As demais pessoas, sem a devida identificação, foram tratadas como sendo bandidos.

Para nós comunistas, a promoção do terror em favelas e comunidades mostra que o estado entende como inimigo interno a própria população, ou seja, a classe trabalhadora.

O caos tomou conta do município do Rio e da Região Metropolitana. A população, sem qualquer orientação das autoridades e deseperada, tentou voltar para casa com segurança e, com a ausência de ônibus, o metrô e os trens da Central do Brasil superlotados se tornaram alternativas viáveis, mas de risco.

O crime organizado respondeu com arrastões e vias públicas fechadas, onde o estado não chega com políticas públicas, mas com represão e morte.

Cabe destacar, entretanto, que apesar de o governador Cláudio Castro (PL) ter sido reeleito no primeiro turno nas eleições de 2022 com a promessa de enfrentar o crime organizado, ele não se constituiu em solução, mas em parte do problema que a população vive hoje. Basta lembrar que em 2021 foi utilizada a mesma estratégia para aparentar uma preocupação em relação à segurança pública, quando se promoveu a chacina do Jacarezinho. Ou seja, quatro anos depois o governador se valeu, às vésperas de mais uma eleição, de mais uma chacina nas áreas pobres da cidade.

O caos que a cidade viveu neste dia 28 de outubro de 2025 faz parte, mais uma vez, do jogo eleitoreiro do governador e do seu grupo político de extrema direita. Essa suposta guerra é portanto uma grande farsa “pirotécnica” e espetacular. As armas do tráfico não são oriundas das favelas, mas sim desviadas dos aparatos policiais e forças militares. Assim como as drogas, que não são produzidas nesses espaços, mas sim trazidas de fora com o beneplácito de poderes corrompidos.

O confronto armado indiscriminado acaba servindo também para retroalimentar a lógica de disputa e partilha territorial do crime, privilegiando algumas das organizações criminosas (milícias) em suas expansões de influência, sob tutela de alguns políticos, enquanto espalha terror na população inocente. Trata-se de um jogo que coloca em risco de vida a população pobre das áreas periféricas e os próprios policiais que são deixados à própria sorte.

O PCB no Rio de Janeiro se coloca publicamente contra a política de segurança pública do governo de Cláudio Castro (PL), que vê a população favelada como inimiga interna.

Cláudio Castro e a extrema direita são parte do problema!

Fora Cláudio Castro, responsável pela maior chacina da história do Rio de Janeiro!

PCB RJ

domingo, 2 de novembro de 2025

Chico Alencar sobre massacre no Rio: chacina foi resultado de uma ação 'política e eleitoreira'

O deputado do PSol denuncia que a megaoperação no Complexo do Alemão e na Penha repete o modelo de “guerra às drogas” que nunca traz resultados


Chico Alencar e Cláudio Castro (Foto: Reprodução)


 





 



Por  Dayane Santos

247 - O deputado federal Chico Alencar (PSol-RJ) rechaçou a megaoperação policial no Rio de Janeiro, que contabiliza mais de 100 mortes, além de dezenas de feridos. Em entrevista, o parlamentar classificou a ação como “irresponsável, sem inteligência, sem planejamento e de viés político-eleitoreiro”, responsabilizando o governador Cláudio Castro (PL) pela tragédia.

 “Essa operação foi política e eleitoreira. Foi uma ação sem estratégia, sem diálogo com outras forças, e com resultados desastrosos. O governador está em baixa popularidade e tenta capitalizar o senso comum do ‘bandido bom é bandido morto’”, afirmou Chico Alencar em entrevista ao programa Brasil Agora, da TV 247.

Segundo o deputado, a operação foi anunciada como uma “declaração de guerra” ao tráfico nas comunidades do Complexo do Alemão e da Penha, regiões onde vivem mais de 200 mil pessoas. A ofensiva paralisou a cidade e provocou um rastro de medo e destruição.

“Cinco unidades de saúde foram fechadas, 28 escolas no Alemão e 17 na Penha ficaram sem aula, mais de cem linhas de ônibus tiveram itinerários alterados. O Rio vive um cenário de guerra, resultado direto da irresponsabilidade de quem deveria garantir segurança, não espalhar terror”, disse.

Alencar também contestou as declarações do secretário estadual de Segurança, Vitor Santos, que classificou a ação como “necessária e planejada”.

“Necessária, sim porque não se pode permitir que territórios fiquem sob controle de traficantes ou milícias, mas planejada, pensada, com inteligência? De jeito nenhum. Se fosse, não teria esse número absurdo de mortos”, criticou o deputado.

Para o parlamentar, o problema central da segurança pública no Rio de Janeiro é a ausência de políticas sociais e de inteligência. Ele lembrou que o governo federal enviou ao Congresso a PEC da Segurança Pública, que prevê um sistema nacional de integração entre forças policiais e políticas preventivas, mas que vem sendo barrada pela direita e pelo centrão.

“A direita não quer votar a PEC da Segurança. Diz que o governo federal vai tirar poder dos estados, mas ao mesmo tempo Cláudio Castro pede ajuda e culpa Brasília. É o cinismo e a hipocrisia típicos de uma política que vive de discurso e cadáveres”, declarou.

Chico Alencar relembrou também o fracasso de experiências passadas, como as UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora), que começaram com uma proposta de proximidade e prevenção, mas se perderam pela falta de continuidade e corrupção dentro das próprias corporações.

“Sem ocupação social, o crime volta. Depois da megaoperação, tudo se reinstala como antes. Falta política pública de verdade — educação, cultura, saúde, emprego — e sobra bala. Isso não é política de segurança, é política de extermínio”, afirmou.

O deputado lamentou ainda o discurso de parte da sociedade que aplaude operações letais, reforçado por líderes da extrema direita e pela retórica bolsonarista.

“A população precisa perceber que essas operações só produzem dor e revolta. São jovens, negros e pobres sendo mortos. Enquanto essa lógica prevalecer, nada muda. É preciso enfrentar o senso comum e a estupidez dos governantes em nome da vida e da civilização.”

quarta-feira, 29 de outubro de 2025

Organizações denunciam chacina policial mais letal da história do Rio à ONU e à CIDH

Organizações cobram investigação e responsabilização do Estado brasileiro por massacre

29 de outubro de 2025


 

Dezenas de corpos são trazidos por moradores para a Praça São Lucas, na Penha, zona norte do Rio de Janeiro. Operação Contenção. (Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil)

 

Por Paulo Emilio

247 - A operação policial que resultou em mais de 64 mortes - segundo dados oficiais - nos Complexos do Alemão e da Penha, na Zona Norte do Rio de Janeiro, chegou às instâncias internacionais de direitos humanos. O Instituto Marielle Franco (IMF) e diversas entidades encaminharam nesta terça-feira (28) uma denúncia à presidenta da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), Roberta Clarke, e a órgãos da Organização das Nações Unidas (ONU), relatando graves violações cometidas pelas forças de segurança.

A “Operação Contenção” é a mais letal ação policial da história do estado, com 60 civis e quatro policiais mortos até as 17h de terça-feira. O documento solicita que a CIDH e a ONU cobrem do Estado brasileiro medidas urgentes de investigação, responsabilização e redução da letalidade policial, além da garantia de segurança às famílias das vítimas.Nesta quarta-feira (29), o governo do Rio revisou os números e a contagem de vítimas fatais subiu para 119. 

Denúncia internacional e apelo por medidas urgentes

O ofício foi assinado por várias organizações, entre elas o Instituto Marielle Franco, a Coalizão Negra por Direitos, a Justiça Global, o Centro pela Justiça e o Direito Internacional (Cejil), o Instituto de Estudos da Religião (ISER), o Fórum Popular de Segurança Pública (FPOPSEG) e a Rede Nacional de Mães e Familiares de Vítimas do Terrorismo do Estado.

Essas entidades afirmam que a chacina revela a continuidade de um projeto de extermínio da população negra e periférica, contrariando compromissos assumidos pelo Brasil perante o Sistema Interamericano de Direitos Humanos. As operações, segundo elas, são marcadas por um padrão racialmente determinado de violência estatal.

“O que acontece hoje no Rio de Janeiro não é uma operação: é uma chacina. É a repetição do mesmo padrão de extermínio que há décadas vitima as mesmas populações. O Estado brasileiro descumpre decisões internacionais e naturaliza a morte de jovens negros e favelados”, afirmou Luyara Franco, diretora executiva do Instituto Marielle Franco e filha de Marielle. 

Descumprimento de decisões internacionais

O documento enviado à ONU e à CIDH aponta que o Brasil não cumpre as medidas de não repetição determinadas pela Corte Interamericana, que exigem políticas públicas de controle externo das forças de segurança e redução da letalidade policial. As entidades também denunciam a disseminação de desinformação e discursos de ódio usados para legitimar a violência estatal.

Entre as recomendações, as organizações pedem que a CIDH e a ONU façam declarações públicas sobre o caso, cobrem investigações independentes e garantam proteção às famílias das vítimas. O texto também solicita que o governo federal informe quais mecanismos estão sendo adotados para assegurar perícias imparciais e investigações diligentes em casos de mortes causadas por operações policiais.

Histórico de violações e condenações anteriores

As entidades lembram que o Brasil já foi condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos em casos semelhantes, como Favela Nova Brasília vs. Brasil (2017) e Mães de Acari vs. Brasil, que reconheceram execuções sumárias, tortura sexual e impunidade nas investigações.

Durante a operação desta semana, o Rio viveu um cenário de guerra: escolas e comércios foram fechados, mais de 120 linhas de ônibus alteraram seus trajetos e a prefeitura declarou “estágio 2” de alerta devido ao alto risco das ações policiais. 

Continuidade das denúncias

O Instituto Marielle Franco e as demais entidades reafirmaram que continuarão denunciando, em instâncias nacionais e internacionais, as políticas de segurança pública baseadas no extermínio e na violação sistemática dos direitos humanos.

domingo, 26 de outubro de 2025

Reunião com Trump foi 'tremenda vitória' de Lula, mas não garante fim do tarifaço, diz cientista político

 

Negociações devem se alongar, e o desfecho dependerá da disposição de cada lado em fazer concessões, avalia Hussein Kalout

26 de outubro de 2025



O presidente Luiz Inácio Lula da Silva - 26/10/2025 (Foto: Reuters)

 




Por Leonardo Sobreira

BBC News Brasil - O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) conseguiu, em poucos meses, reverter o mal-estar com o governo dos Estados Unidos e se reuniu com o presidente Donald Trump neste domingo (26/10), na Malásia, onde ambos participam da cúpula da Associação das Nações do Sudeste Asiático (Asean). A conversa foi marcada pelo clima cordial, com Trump se dizendo "honrado" em encontrar o presidente brasileiro.

Para o cientista político Hussein Kalout, ex-secretário de Assuntos Estratégicos no governo Michel Temer (MDB), o encontro foi uma "tremenda vitória" do petista e "terá impacto eleitoral significativo" em 2026, quando Lula tentará um quarto mandato presidencial. Do outro lado, ele vê o campo bolsonarista enfraquecido, com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) condenado por tentativa de golpe de Estado e Trump, seu mais importante aliado, tecendo elogios a Lula.

 

sábado, 25 de outubro de 2025

Herzog, 50 anos depois: família cobra revisão da anistia

 

  • Texto extraído do Blog do   Magno Martins
  •  Edição de Thaís Leandro
Em 25.10.2025



 

 

 

 




Do jornal O Globo

A família do jornalista Vladimir Herzog, torturado e morto pela ditadura militar, segue em busca de justiça 50 anos após sua morte e cobra a responsabilização dos envolvidos — um ato na Catedral da Sé, em São Paulo, para marcar a data ocorre neste sábado (25) a partir das 19h. Ninguém foi punido até hoje pelo crime, apesar do empenho de Clarice Herzog, mulher do jornalista, da identificação dos responsáveis pela Comissão Nacional da Verdade e do reconhecimento do Estado brasileiro de que agentes civis e militares mataram Herzog.

O Instituto Vladimir Herzog e outras entidades de defesa dos direitos humanos têm procurado ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) para destravar julgamentos na Corte que podem ajudar a responsabilizar os autores do crime. Em 2010, o tribunal já decidiu, por 7 votos a 2, que não cabe ao Judiciário rever a Lei da Anistia, mas ainda há ações pendentes que questionam a extensão do acordo.

Filho do jornalista, Ivo Herzog defendeu esta semana que há uma mudança de contexto na Corte ao defender que o tema seja analisado novamente. “Agora pode ser diferente não só pela composição do STF, mas também pelo contexto. A sociedade foi trazida para esse debate, com a tentativa de golpe do 8 de Janeiro. Não são mais só os familiares que estão participando, e o Supremo responde um pouco a essa demanda e a essa pressão”, disse em entrevista ao Roda Viva, da TV Cultura.

O ministro Dias Toffoli é relator de um dos casos, de autoria do PSOL, de 2014, que questiona a aplicabilidade da anistia a graves violações de direitos humanos e que, segundo tratados internacionais aos quais o Brasil é signatário, não seriam passíveis de anistia. O processo é considerado o mais abrangente sobre o tema e ganhou o status de repercussão geral, ou seja, o entendimento firmado pela Corte passaria a orientar todos os processos similares no Judiciário.

Gestos recentes alimentaram as esperanças das famílias dos vitimados de que a nova configuração da Corte seria mais receptiva aos apelos. Em fevereiro, em meio à repercussão do filme “Ainda Estou Aqui”, de Walter Salles, sobre o desaparecimento do ex-deputado federal Rubens Paiva, o STF concordou em dar repercussão geral a um recurso do Ministério Público que interpreta como crime permanente práticas da ditadura como a ocultação de cadáver, o que a tornaria punível para além do período abrangido pela anistia. A relatoria está com o ministro Flávio Dino.

Outros recursos do Ministério Público, distribuídos ao ministro Alexandre de Moraes, questionam a validade da anistia para os crimes de sequestro e cárcere privado. Os casos também serão julgados sob status de repercussão geral.

O ato deste sábado, organizado pelo Instituto Vladimir Herzog e pela Comissão Arns, terá presença de parentes e amigos de “Vlado” e de outras vítimas, além de lideranças religiosas, artistas e do presidente em exercício, Geraldo Alckmin. Em outubro de 1975, cerca de oito mil pessoas estiveram no mesmo local para protestar contra a farsa de suicídio propagada pela ditadura.

Assassinato no DOI-Codi

Então diretor da TV Cultura e professor da USP, Herzog foi assassinado durante um interrogatório, após se apresentar voluntariamente na sede do DOI-Codi, em São Paulo, para depor sobre a sua relação com o Partido Comunista Brasileiro (PCB), que à época operava na clandestinidade por imposição dos militares e defendia a redemocratização do país.

O Exército alegou que ele teria cometido suicídio em sua cela, o que se provou falso. Com auxílio da polícia científica, os agentes anexaram ao laudo do Instituto Médico Legal (IML) uma foto que se tornou um marco para representar os abusos cometidos pelo regime: Herzog aparecia com o pescoço envolto com uma cinta de pano, com os joelhos dobrados e os pés tocando o chão, cena em que seria impossível o suicídio.

Em 1978, Clarice Herzog conseguiu o reconhecimento da culpa do Estado em uma sentença histórica. No ano seguinte, porém, o Congresso aprovou a Lei da Anistia. O texto tinha como objetivo permitir que exilados retornassem ao Brasil e que opositores da ditadura fossem libertados, mas acabou modificado de modo a atender também a torturadores e militares golpistas.

“A ideia de se ter uma sentença é muito importante, mesmo que essas pessoas não vão para a cadeia”, afirma Camilo Vannuchi, primo de segundo grau e biógrafo do estudante de geologia da USP Alexandre Vannucchi Leme, morto pela ditadura em 1973. “Viver mais de 50 anos num cenário em que ninguém que matou sob tortura foi sentenciado e condenado no Brasil equivale a um salvo-conduto”, conclui.

quinta-feira, 23 de outubro de 2025

Captura de carbono na Amazônia está em risco, diz estudo

Para pesquisadores, preservação é vital para conter aquecimento global

23 de outubro de 2025


 

Captura de carbono na Amazônia está em risco, diz estudo (Foto: Divulgação/Polícia Federal )

 




Por Paulo Emilio

Camila Boehm, repórter da Agência Brasil - A Amazônia deixará de capturar 2,94 bilhões de toneladas de carbono até 2030 se os governos de países amazônicos aplicarem pouco ou nenhum controle sobre o desmatamento no bioma.

Caso persistam a manutenção das atuais políticas ambientais e as recentes taxas de desmatamento na região, ainda haveria perda na captura de carbono da ordem de 1,113 bilhão de tonelada nos próximos cinco anos.

A conclusão é de levantamento da Rede Amazônica de Informação Socioambiental Georreferenciada (RAISG), divulgado nesta quinta-feira (23), formada por oito organizações da sociedade civil. A rede engloba todos os países amazônicos, no entanto, para essa análise, foram considerados Brasil, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela.

Para os pesquisadores, a proteção das florestas mais preservadas da região, principalmente em terras indígenas e Áreas Naturais Protegidas é decisiva para conter o aquecimento global. Na Amazônia, os territórios protegidos abrigam as florestas mais conservadas e com menores taxas de desmatamento. Além disso, segundo a RAISG, tais áreas concentraram 61% do carbono florestal capturado em 2023 em toda a região amazônica.

“Estamos diante de uma contagem regressiva ambiental: se não forem fortalecidas as políticas de proteção e se não for reconhecido o papel central dos povos indígenas e das comunidades locais, a Amazônia deixará de ser um aliado climático e se tornará uma fonte de crise”, alertou Renzo Piana, diretor executivo do Instituto do Bem Comum, membro da RAISG, em nota.

Entre as recomendações da rede figuram priorizar políticas que articulem ciência e saberes dos povos amazônicos e desenvolver modelos econômicos e tecnologias baseadas em baixas emissões de gases de efeito estufa, além de promover o uso sustentável de florestas e sistemas hídricos. É necessário, ainda, implementar estratégias que eliminem o desmatamento, incêndios florestais e o avanço de atividades ilegais e crimes ambientais no bioma. 

Devastação histórica

Nas últimas décadas, segundo a RAISG, a Amazônia já teve suas funções de combate às mudanças climáticas enfraquecidas. Em 2023, suas florestas deixaram de capturar 5,7 bilhões de toneladas de carbono em comparação com o ano 2000 - uma redução de 6,3%. “Entre 1985 e 2023, mais de 88 milhões de hectares de florestas que regulavam o clima global foram transformadas em terras agropecuárias, urbanas e mineradoras”, divulgou a RAISG.

Além disso, a organização aponta que tais atividades não apenas fragmentaram as florestas, mas causaram um dano silencioso às árvores remanescentes, afetando sua mortalidade, capacidade de regeneração e processos de fotossíntese, que são fundamentais para a captura de carbono.

O estudo divulgado hoje foi feito dentro do projeto Ciência e Saber Indígena pela Amazônia, da RAISG e do Woodwell Climate Research Center. Ele projetou três cenários futuros para as reservas de carbono.

Para isso, os pesquisadores utilizaram a ferramenta de simulação Dinâmica Ego - plataforma de modelagem ambiental gratuita - e dados atuais de monitoramento por satélite, com o objetivo de orientar melhores políticas públicas. 

Pior cenário

No primeiro cenário, a Amazônia passaria a capturar 82,257 bilhões em 2030, em vez das mais de 85 bilhões de toneladas de carbono capturadas em 2023, representando uma redução de 3,5%. “Isso ocorreria caso os governos aplicassem pouco ou nenhum controle sobre o desmatamento, permitindo o avanço descontrolado de atividades como agricultura, pecuária, infraestrutura e mineração”, informou a entidade.

Para Mireya Bravo Frey, coordenadora regional do Projeto Ciência e Saber Indígena pela Amazônia, cada tonelada de carbono que se consegue manter nas florestas amazônicas é um investimento no futuro do planeta.

“Fortalecer a proteção das Terras Indígenas e das Áreas Protegidas significa conservar as maiores reservas de carbono florestal do mundo”, ressaltou. No Brasil, os territórios protegidos correspondem a 44% de toda a floresta bioma.

No melhor cenário analisado, em que os governos não promoveriam mudanças significativas nas políticas ambientais e as atuais taxas de desmatamento se manteriam constantes, as áreas florestais deixariam de capturar 1,113 bilhão de toneladas de carbono até 2030, em relação a 2023, ou seja, 2% a menos. Assim, mesmo que as políticas e condutas atuais dos governos fossem mantidas, haveria piora nos resultados de captura de carbono da região. 

O que é a captura de carbono?

A Rede Amazônica de Informação Socioambiental Georreferenciada (RAISG) explica o que é a captura de carbono florestal e qual sua importância no contexto atual. “Durante a fotossíntese, árvores e vegetação capturam carbono, um elemento do dióxido de carbono (CO) presente na atmosfera, e o retêm em raízes, troncos e folhas. Dessa forma, ajudam a controlar esse gás de efeito estufa, produzido em excesso principalmente pelo uso de combustíveis fósseis e pelo desmatamento causado por atividades econômicas, como a pecuária.”

A captura de carbono ganha maior destaque no contexto de agravamento da emergência climática. Especialista em Sistemas de Informação Geográfica e Sensoriamento Remoto da RAISG, Jose Victorio alerta que ter menos florestas equivale a ter menos reservas de carbono na Amazônia, o que significa mais emissões poluentes para o mundo.

“Isso gera temperaturas mais altas no planeta e eventos climáticos extremos cada vez mais frequentes, como secas, inundações, florestas mais suscetíveis a incêndios e chuvas mais imprevisíveis. Um cenário que compromete não apenas a biodiversidade e a cultura amazônica, mas também a segurança hídrica e alimentar do planeta”, explicou.

No cenário intermediário, que considerou uma regulação mais permissiva e que ocorreria se os países amazônicos aplicassem políticas ambientais e marcos legais mais fracos do que os atuais nos próximos cinco anos, o resultado foi também uma queda na captura de carbono florestal.

Considerando esse contexto, haveria uma mudança radical na função do solo, transformando grandes áreas de florestas amazônicas e agroflorestas em terras agropecuárias, urbanas e mineradoras.

A Amazônia deixaria de capturar 2,294 bilhões de toneladas de carbono em 2030 em relação a 2023, devido ao avanço do desmatamento e da degradação florestal, uma redução de 2,7% nas reservas de carbono.

quarta-feira, 22 de outubro de 2025

Boulos desconversa sobre sucessão, foca na reeleição de Lula e prevê disputa acirrada em 2026

Segundo o novo ministro, "cada dia tem a sua agonia" e o foco agora é "ajudar o governo e contribuir para a reeleição do presidente Lula em 2026"

22 de outubro de 2025

Guilherme Boulos (Foto: Raffa Neddermeyer/ABr)



 


 



Por Paulo Emilio

247 - A nomeação do deputado federal Guilherme Boulos (Psol-SP) para o comando da Secretaria-Geral da Presidência, anunciada nesta segunda-feira (20), reacendeu o debate sobre quem poderá suceder o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no futuro político do país. Aos 85 anos no fim de um eventual segundo mandato, Lula ainda não apontou um nome para herdar seu legado, mas reforça aliados de peso no governo.

Em entrevista à coluna de Mônica Bergamo, da Folha de S. Paulo, Boulos desconversou sobre qualquer intenção de se colocar como herdeiro político do presidente e afirmou que aprendeu com a avó “que cada dia tem a sua agonia”. Segundo o novo ministro, o foco agora é “ajudar o governo e contribuir para a reeleição do presidente Lula em 2026”.

“O jogo político é sempre acirrado”

Questionado sobre as chances de reeleição do petista, Boulos manteve cautela. “No cenário polarizado em que a gente vive, o jogo político eleitoral é sempre muito acirrado. E jogo não se ganha de véspera”, afirmou. Apesar disso, mostrou otimismo: “Lula lidera em todas as pesquisas, o governo cresce em aprovação e reforça sua conexão popular”.

O ministro destacou ainda que sua principal missão será fortalecer o diálogo com os movimentos sociais. “O presidente Lula me chamou para dialogar com o povo, e não com a Faria Lima, definitivamente”, disse, em referência ao centro financeiro de São Paulo. 

Defesa do governo e críticas à extrema-direita

Boulos elogiou o desempenho do governo e a política econômica conduzida por Fernando Haddad, ressaltando os indicadores positivos. “Temos a menor taxa de inflação acumulada da série histórica e o menor desemprego. O Brasil voltou a crescer acima de 3%”, destacou. Ele também citou o aumento real do salário mínimo e o retorno de programas sociais como o PAC e o Minha Casa, Minha Vida.

Na entrevista, o novo ministro também prometeu combater o que chamou de “política rasteira da extrema-direita” e defender “as agendas fortíssimas do governo Lula, que se colocou firmemente na defesa do povo contra os bilionários e na defesa do Brasil contra o ataque estrangeiro [dos EUA]”. 

Relação do governo com Trump e soberania nacional

Ao comentar a postura do governo brasileiro frente às tarifas impostas pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, Boulos afirmou que Lula foi “firme” e “pragmático, sem ceder um milímetro na defesa da soberania nacional”. Segundo ele, “Lula virou capa do New York Times como o único presidente que enfrentou Trump”.

Boulos avaliou que há uma “reconfiguração geopolítica” com a disputa entre Estados Unidos e China pela liderança global, o que exige do Brasil uma posição soberana. “O governo do Lula tem travado a luta das ideias e a luta política como nenhum outro governo progressista da nossa história”, declarou.

Críticas ao Congresso e ao bolsonarismo

O ministro também criticou a atuação de parte do Congresso, que, segundo ele, tem barrado medidas de interesse popular, e voltou a apontar o bolsonarismo como o principal polo da direita. “Todas as tentativas de criar um bolsonarismo light fracassaram. Quando a coisa esquentou, tiveram que tirar a fantasia para manter a base social”, afirmou.

Sobre a relação com o deputado federal Eduardo Bolsonaro, Boulos foi contundente: “É uma vergonha que Eduardo Bolsonaro ainda não tenha sido cassado e siga atuando como traidor da pátria em Miami. É inaceitável”. 

“Cada dia com a sua agonia”

Ao ser questionado sobre uma possível candidatura em 2026, o novo ministro negou qualquer plano eleitoral. “Lula me convocou para uma missão. Entrar agora e sair em abril não permitiria que o trabalho tivesse começo, meio e fim”, explicou.

Para ele, discutir o “pós-Lula” seria precipitado. “A minha preocupação agora é ajudar a reforçar o governo do presidente Lula e contribuir para a sua reeleição. Pós se discute depois”, concluiu.

quinta-feira, 16 de outubro de 2025

Um agente laranja ronda a América Latina

 



 

Leonardo Silva Andrada – militante do PCB de Juiz de Fora (MG)




“[O imperialismo] Na aparência é muito poderoso, mas, na verdade, não é nada a temer;
é um tigre de papel. De fora um tigre, dentro é feito de papel, incapaz de resistir ao vento e à chuva.”
Mao Zedong

Um fantasma ronda a América Latina: o fantasma da intervenção imperialista. Aumento de tarifas, deslocamento da marinha de guerra e declarações ameaçadoras foram algumas das expressões recentes, na busca por encurtar a rédea que controla a região. Nas últimas eleições presidenciais, o centro do império escolheu um CEO com postura comercial agressiva, como opção tática no enfrentamento aos efeitos mais sensíveis de sua debacle. Donald Trump executa a plataforma anunciada como marca de seu governo, para tentar reverter os índices negativos que traduzem a derrocada.

Circulam opiniões garantindo que testemunhamos o colapso do domínio estadunidense, mas a história do capitalismo – sua vertente yankee incluída – recomenda cautela, em face da comprovada capacidade para contornar crises com paliativos mais ou menos eficientes. Em qualquer caso, ainda que ajustes de grande impacto consigam postergar o colapso final, são inegáveis os sintomas de um período historicamente denso, que demanda operações de grande alcance para adequar-se às condições presentes. 

Do tipo, pelo menos, que vimos em 1973, quando o esgotamento do modelo gestado em Bretton Woods reclamou transformações profundas na engenharia institucional que estruturou o capitalismo pós guerra, visando se conformar às necessidades da fração financeira – modelo que pautou um novo ciclo, em seguida chamado de neoliberalismo. Ou talvez o rearranjo de menor escopo operado em 2001, ano que marca historicamente o início da hegemonia estadunidense isolada que ora dá sinais de fadiga.

A guerra ao terror de Bush Junior foi a síntese propagandística de uma gama de movimentos táticos necessários à estruturação do poder imperialista no período de fim da história, como peremptoriamente alardeavam seus ideólogos. Ao longo da década transcorrida em seguida ao fim da União Soviética, os organismos multilaterais a serviço da dominação financeira espraiaram o projeto neoliberal gestado em 73 por uma ampla parcela do planeta; a tarefa para a administração imperial, nesse momento, foi reorganizar a política global de forma a garantir que o excedente produzido em economias desregulamentadas continuasse fluindo em direção a Wall Street, para seguir financiando os déficits fiscal e comercial que sustentam o militarismo e o consumismo destrutivo do american way of life, além de atualizar a secular prática colonialista de garantir o acesso a recursos e mercados.

quarta-feira, 15 de outubro de 2025

Efeito Kirk: como um assassinato desencadeou a virada de Trump sobre Israel

 

Um tiro que atravessou fronteiras: o assassinato de Kirk transformou o epicentro do trumpismo e expôs a ruptura entre o sionismo político e ala “America First”

Por Reynaldo José Aragon Gonçalves (Jornalista Geopolítico)



Ativista e influenciador de extrema direita estadunidense, Charlie Kirk fala antes de ser alvo de um atentado a tiros, em evento na Utah Valley University, em Orem, Utah, EUA - 10/09/2025 (Foto: Trent Nelson/The Salt Lake Tribune via REUTERS)




A morte de Charlie Kirk, fundador do Turning Point USA e ícone da nova direita americana, detonou uma crise interna que já vinha latente: parte do movimento MAGA quer cortar o cordão financeiro e simbólico que une os EUA a Israel. Em meio ao colapso moral do genocídio em Gaza e à pressão internacional, Trump cedeu — e empurrou Netanyahu ao cessar-fogo. O caso Kirk é o gatilho que revelou a guerra civil dentro da própria direita global. 

O Disparo que Ecoou no Oriente Médio

O assassinato de Charlie Kirk, ocorrido em 10 de setembro durante um evento na Utah Valley University, ultrapassou rapidamente o território do crime político para se tornar um terremoto simbólico dentro do movimento MAGA. O episódio mobilizou a base trumpista, reacendeu disputas internas e forneceu ao governo dos Estados Unidos uma oportunidade de reconfigurar sua narrativa no exato momento em que a guerra de Gaza já se tornava um fardo moral e diplomático. A sequência foi meticulosamente administrada: a prisão imediata do suspeito, a comoção nas redes, e o gesto calculado de Donald Trump ao conceder postumamente a Kirk a Medalha Presidencial da Liberdade. O mártir estava criado, e com ele um novo enquadramento simbólico para o poder — o da pacificação performativa.

A mesma semana marcou a consolidação do cessar-fogo em Gaza, com Trump assumindo o papel de fiador do acordo e exercendo pressão direta sobre Benjamin Netanyahu. O premiê israelense resistiu, ausentando-se da cúpula realizada no Egito, mas o movimento já era irreversível: a pressão doméstica, a fadiga de guerra e a erosão internacional da imagem dos Estados Unidos exigiam uma virada de curso. A Casa Branca percebeu a janela e aproveitou o luto como instrumento político. A figura do presidente-estadista emergiu das cinzas da comoção, transformando um trauma interno em legitimidade externa.

Não se trata de afirmar que um assassinato em Utah causou, sozinho, a suspensão dos bombardeios em Gaza. O que ocorreu foi um acoplamento estratégico de causalidades: a tragédia de Kirk funcionou como acelerador simbólico dentro de um processo já em marcha. A fadiga social com a guerra, as fissuras no MAGA entre doadores pró-Israel e isolacionistas, e o colapso moral do Ocidente diante das imagens de Gaza criaram o cenário ideal para que Trump reinterpretasse o próprio papel. O disparo que silenciou um ícone da direita americana reverberou como uma licença política — o som que permitiu ao presidente mover-se da retórica de confronto para a coreografia da paz, não por convicção humanitária, mas por puro instinto de sobrevivência. 

A Guerra que Sairia do Controle

A guerra em Gaza, iniciada com a promessa de “erradicar o Hamas”, tornou-se rapidamente o espelho de um colapso moral global. O que o establishment político israelense e seus aliados no Ocidente acreditavam ser uma operação de “legítima defesa” transformou-se, aos olhos do mundo, em um genocídio transmitido em tempo real — uma sequência interminável de corpos, ruínas e crianças soterradas sob a justificativa da segurança nacional. A narrativa de “combate ao terror” perdeu tração. O prolongamento da ofensiva não apenas multiplicava as vítimas, mas corroía a imagem de Israel e dos Estados Unidos, que insistiam em respaldar o massacre com ajuda militar e veto diplomático no Conselho de Segurança da ONU.