O problema central a ser enfrentado pelo governo Lula, neste ou no próximo mandato, é a armadilha dos juros altos
03 de junho de 2025

Gabriel Galípolo (à esq.) e Lula (Foto: Reprodução (YT))
Por Leonardo Attuch (Jornalista)
Nesta segunda-feira, o ministro Alexandre Silveira,
de Minas e Energia, apresentou ao
presidente Lula um plano engenhoso para superar o impasse
do aumento do IOF no Congresso e criar uma receita extraordinária a partir da
exploração de petróleo. Com a proposta, estima-se arrecadar R$ 35 bilhões até
2026. Uma vitória tática, que revela a capacidade do governo de encontrar
soluções criativas para resistências políticas imediatas. Mas também escancara
um limite estratégico: não há ajuste fiscal sustentável enquanto o Brasil
carregar a âncora de uma política monetária suicida, que drena quase R$ 1
trilhão por ano dos cofres públicos em pagamento de juros
da dívida.
A tentativa do ministro da Fazenda, Fernando
Haddad, de construir um pacto de responsabilidade fiscal é louvável, mas sua
agenda esbarra num muro de concreto: a resistência do Congresso Nacional a
novos impostos, como se viu no
caso da IOF, e a Selic em 14,75% ao ano, que sozinha explica
quase todo o déficit nominal do setor público. Em 12 meses, até fevereiro de
2025, o Brasil gastou R$ 923,9 bilhões com juros — 7,78% do PIB — contra um
déficit primário de apenas R$ 15,9 bilhões. Ou seja: o Brasil não gasta demais
com saúde, educação ou previdência. O Brasil paga demais aos rentistas.
É aqui que a fala do presidente do Banco Central,
Gabriel Galípolo, ganha contornos dramáticos. Ao dizer que o país precisa de
“estômago de crocodilo e queixo de pedra” para suportar
esse ciclo de juros altos, ele propõe resiliência estoica de quem vive da
produção e do trabalho — enquanto o Banco Central oferece mel aos rentistas,
que seguem se banqueteando com títulos públicos que pagam um dos maiores juros
reais do mundo.
Ainda que a chegada de Galípolo represente uma
guinada importante no comando do Banco Central, seu discurso revela o quanto a
autoridade monetária ainda está capturada por uma ortodoxia paralisante. A
justificativa é sempre a mesma: a necessidade de “âncoras fiscais e monetárias”
para manter as expectativas de inflação sob controle. Mas o que realmente se
ancora com juros de 14,75% ao ano é a inércia de um sistema que transfere renda
de forma brutal do Estado — e, portanto, da sociedade — para uma elite
rentista.
A manutenção dessa taxa desproporcional cria uma
casta parasitária que se acostumou a viver de rendimentos sem risco, sem
trabalho e sem produção. Não se trata de meritocracia ou de livre mercado.
Trata-se de um dos mais perversos sistemas de extração de riqueza já montados
em um país periférico. E o pior: sob o pretexto de “prudência”, essa política
limita o potencial de crescimento econômico e restringe o investimento público
e privado.
O plano de Silveira, ao explorar as riquezas do
petróleo nacional para gerar receita, é válido, mas também insuficiente. Gera
alívio momentâneo, mas não resolve o desequilíbrio estrutural. O mesmo vale
para o esforço permanente de Haddad em domar o Orçamento. Enquanto o Estado for
forçado a sacrificar gastos produtivos para remunerar capital ocioso, qualquer
ajuste será equivalente a enxugar gelo.
O que se espera do governo Lula, neste ou no próximo mandato, é coragem
política para desmontar a armadilha dos juros abusivos. Mais do que articular
mudanças pontuais em tributos ou buscar receitas não recorrentes, é preciso
recolocar o debate sobre a política monetária no centro do projeto nacional. Em
algum momento, o governo Lula terá que demonstrar disposição política para
romper esta armadilha. E, para isso, mais do que “queixo de pedra”, será
preciso enfrentar a financeirização da economia brasileira.
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