terça-feira, 5 de dezembro de 2023

Exercício dos EUA na Amazônia pode ter sido estágio para base militar na Guiana

 

(Foto: REUTERS/Lucas Jackson | REUTERS/Bruno Kelly)


"O discurso dos militares dos EUA, para penetrarem com 'exercícios' na Amazônia foi o de sempre, mas nada é por acaso", escreve Denise Assis

5 de dezembro de 2023

 


De acordo com um informativo voltado para o meio militar, a aproximação entre as fileiras dos EUA e da Guiana estão sendo estreitadas nos últimos dias. “Coincidentemente”, quando a Venezuela acaba de realizar um referendo (03/12), apontando que 95% da população quer que os 74% do território da região de Essequibo - na Guiana Inglesa -, seja incorporado ao seu país. Nos dias 27 e 28 de novembro ocorreram encontros entre a 1st Brigada de Assistência às Forças de Segurança (SFAB) do Exército dos Estados Unidos que tiveram como objetivo - segundo o Comando Sul estadunidense -, o estreitamento de relações para que seja estabelecida uma base militar na área contestada.

A agenda teve o caráter de “recado” para o presidente Nicolás Maduro, de que os EUA podem tomar o lado da Guiana, caso a Venezuela insista em sua reivindicação e escale para um conflito ou invasão do território almejado.

O SFAB é uma unidade especializada do Exército dos EUA criada para “aconselhar e ajudar as nações parceiras”, segundo eles, evidentemente. Desde 2022, o SFAB realizou vários exercícios de formação conjuntos com o GDF para reforçar a “sua capacidade e a capacidade a nível táctico e operacional”. E, não por acaso, aqui (no Brasil) também.

Desde setembro (ou até mesmo antes disso), a inteligência estadunidense já havia detectado a movimentação venezuelana nesta direção, a de incorporar o território de Essequibo, onde a Exxon (dos EUA) vem explorando rios de petróleo e aumentando abruptamente a arrecadação da Guiana. Estimativas do Banco Mundial dão conta de que só neste ano, a economia da Guiana deve crescer 48%, a taxa mais rápida do planeta. Na mesma época, em setembro, o representante da Venezuela denunciou em uma reunião da ONU que os Estados Unidos estavam decididos a estabelecer uma base militar na região/alvo do litígio no norte da América do Sul.

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 “Denunciamos que o governo dos Estados Unidos da América pretende militarizar a situação. O Comando Sul pretende estabelecer uma base militar no território contestado… (disse o ministro dos Negócios Estrangeiros Venezuelano, Yvan Gil Pinto)”. Enquanto isto, o Comando Sul “(…) com o seu foco no reforço das capacidades das forças parceiras, é uma prova dos esforços de colaboração entre as nossas nações. Esperamos ver o impacto positivo contínuo (…)”.

Como já citado acima, a inteligência estadunidense caminhou a passos largos nesta questão. Conforme descrito no informe, “de acordo com o site oficial da Embaixada dos Estados Unidos na Guiana, as forças de defesa dos Estados Unidos e da Guiana discutiram os próximos compromissos para incluir sessões e processos de planeamento estratégico para melhorar a prontidão militar e as capacidades de ambos os países para responder às ameaças à segurança”.

Os Conselheiros da SFAB declararam: “Estamos gratos pela oportunidade de treinar com as Forças de Defesa da Guiana como nossos parceiros e amigos. Esperamos aprofundar a parceria nas próximas semanas e meses.” Certamente. Onde há fumaça de conflito...

A disputa entre a Venezuela e a Guiana Inglesa pela região data do século 19, quando a Guiana ainda era uma colônia britânica. Ao longo dos anos ela delimitou seu território a leste do rio, mas gradualmente expandiu-se para o oeste, que já fazia parte da Capitania Geral da Venezuela. Uma disputa que vem desde 1841. O que os historiadores observam nesta contenda é que as autoridades britânicas ao fazerem a movimentação já reconheciam a fronteira fluvial do rio Essequibo. Difícil imaginar um desfecho para o questionamento.

 “Coincidentemente”, de novo, na quinta-feira (19 de outubro), apenas um mês depois que os estadunidenses se movimentaram no sentido de implantar base militar em Esequibo, o presidente Lula assinou um decreto que permitiu a entrada de 294 militares das Forças Armadas dos Estados Unidos no Brasil, para participar da operação conjunta conhecida como "Core 23" (Combined Operation and Rotation Exercise - Exercício de Operação Combinada e Rotação). Desta vez, e pela primeira vez desde sua implementação em 2015, a operação militar anual “ocorrerá em território amazônico”. E bota coincidência nisto! Ou melhor, ingenuidade. Faltou alguém dizer para o presidente que havia um conflito encomendado à vista.

O discurso dos militares dos EUA, para penetrarem com “exercícios” na Amazônia foi o de sempre: a operação "Core", estabelecida como parte de um acordo de cooperação entre os governos do Brasil e dos Estados Unidos, “visa a troca de experiências e táticas de defesa. Este ano, entre 24 de outubro e 20 de novembro, militares brasileiros e americanos participaram de treinamentos nas cidades de Pará e Amapá, na região amazônica. De acordo com o Comando Militar do Norte, é a primeira vez que a cooperação militar entre os dois países será realizada nesta área sensível do território brasileiro”.

Nada é por acaso. Àquela altura, tanto a Venezuela já havia se movimentado para reivindicar Esequibo, quanto o Comando Sul (EUA) planejava a base militar na região. O que eles – os estadunidenses – não tinham, era a menor intimidade com Amazônia, ou como atuar naquele emaranhado de selva que poderia ser mais traiçoeira para os incautos, do que foi a investida deles no Vietnã. O exercício e a aprendizagem com o Batalhão de Selva brasileiro viria a calhar. Com esse estágio, eles poderiam aprender, por exemplo, como entrar na Venezuela, pela selva, caso fosse necessário. Ou não?

Em se tratando dos EUA, todas as teorias são válidas. Pois mais cedo ou mais tarde elas invariavelmente se confirmam. E não tardou para que víssemos na concretude para que mesmo serviram os exercícios na selva ao lado dos bem treinados soldados brasileiros.

Enquanto os fatos se desenrolam na vizinhança, no Brasil o governo acompanha com cautela e preocupação cada mexida nas pedras do tabuleiro. Providências foram tomadas pelo ministério da Defesa. Diante da crescente tensão na fronteira entre Venezuela e Guiana, o ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, sob as ordens do presidente Luiz Inácio Lula da Silva determinou a ‘blindagem’ das fronteiras. A disputa pelo território de Esequibo, (rico em petróleo e minério), na visão brasileira, é uma questão entre aqueles dois governos. "O Brasil não participará de um problema que é da Venezuela com a Guiana”, adiantou Múcio, ao G1. Por vias transversas... no mínimo cochilou.

Mas, por precaução, foram reforçadas as guarnições das Forças Armadas em Roraima, elevando o status para batalhão e dobrando o efetivo no estado fronteiriço. O Exército brasileiro aumentou o efetivo do Pelotão Especial de Fronteira de Pacaraima (RR) de 70 para 130 homens, fortalecendo o patrulhamento na divisa do Brasil com a Venezuela. Também foram enviados 20 blindados para a unidade militar.

Na ocasião dos exercícios e, solo brasileiro, com o deslumbramento de sempre, um comunicado oficial do Exército dizia o seguinte sobre o exercício militar em conjunto com os EUA: "As tropas dos dois países irão compartilhar experiências e trocar conhecimentos sobre doutrina e técnicas, táticas e procedimentos de defesa, visando manter os laços históricos entre os países e incrementar a integração e a cooperação entre os dois exércitos”.

Mas, destaque-se que a troca de conhecimento incluiu a entrada de “armas e equipamentos” em território nacional. Em se tratando de um exercício para mero conhecimento de área, é de se perguntar: para que mesmo os armamentos?

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