Luiz Inácio Lula da Silva (Foto: Ricardo Stuckert/PR) |
Juros, reforma
tributária e “arcabouço fiscal” são pedras no caminho do crescimento
9 de abril de 2023
RBA - “A cultura toma posse”
era o tema quando a cantora Margareth Menezes assumiu o Ministério da Cultura,
no segundo dia de janeiro. A cerimônia marcava a volta do Minc, reduzido a
secretaria no governo anterior, marcado mais por arroubos conservadores do que
por políticas efetivas.
“O desmonte não
trouxe só consequências econômicas, mas também muita dor”, disse Margareth. A
questão cultural, que busca descentralizar o acesso, soma-se a iniciativas
ligadas à área social, na saúde e nos direitos humanos, que tiveram
protagonismo nos 100 primeiros dias de governo. Já a área fiscal segue como
desafio a atravessar, até para garantir sequência nas ações.
Também nos
primeiros 100 dias de governo Lula, um assunto se impunha: a política de
valorização do salário mínimo, efetivada justamente em seu primeiro mandato, a
partir de uma demanda das centrais sindicais. Virou lei, foi interrompida nas
gestão anterior e agora está sendo reimplementada. Na última terça-feira (4), o
ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, recebeu – novamente das centrais
– documento com elaboração do Dieese propondo reajustes contínuos do piso
nacional, acima da inflação, pelas próximas décadas.
“É um dia muito especial, que marca a retomada do que nunca deveria ter sido interrompido, o diálogo com a classe trabalhadora de uma pauta tão crucial como o reajuste do salário mínimo”, destacou o presidente da CUT, Sérgio Nobre. O diretor técnico do Dieese, Fausto Augusto Jr., observa que a proposta prevê meta de crescimento do salário mínimo a longo prazo, “que pode e deve ser revista a cada 10 anos”. Em torno de 60 milhões de pessoas têm o salário mínimo como referência. Assim, trata-se principalmente de uma política de redistribuição de renda.
Áreas de
pobreza
A retomada,
com incrementos, do Mais Médicos, dá um passo também na direção da população
mais pobre. O governo espera ter até o final do ano 28 mil profissionais pelo
país, em especial nas áreas de pobreza extrema. “Com isso, mais de 96 milhões
de brasileiros terão a garantia de atendimento médico na atenção primária,
porta de entrada do SUS”, afirma o Ministério da Saúde. Para a ministra Nísia
Trindade, o programa “voltou para responder ao desafio da presença de médicos
nos municípios mais distantes dos grandes centros e nas periferias das
cidades”.
Depois de um
governo que deixou como marcas declarações contrárias à ciência e até de
desprezo às vítimas, a atual gestão reforçou a campanha de vacinação contra a
covid. Apesar de menos intensa e letal, a pandemia continua fazendo vítimas.
Com isso, em 28 de março o país atingiu o triste número de 700 mil mortes desde
seu início, em 2020. Segundo a pasta da Saúde, em torno de 7 milhões de doses
bivalentes já foram aplicadas.
Na linha do
fortalecimento do SUS, o governo estuda medidas para estimular a produção
industrial interna e, assim, reduzir a dependência do Brasil. “A expectativa é
que, em até dez anos, 70% das necessidades do SUS em medicamentos,
equipamentos, vacinas e outros materiais médicos passem a ser produzidos no
país”, informa o Ministério da Saúde. “A maior autonomia do Brasil é
fundamental para reduzir a vulnerabilidade do SUS e assegurar o acesso
universal à saúde.”
Memória e
violações
No campo dos
direitos humanos, talvez a mais esvaziada na gestão anterior, o ministro Silvio
Almeida tomou posse com discurso de impacto, a respeito das históricas
violações cometidas no Brasil. Esse tom se manteve no último dia 2, quando o
recriado Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC) encerrou a
chamada Semana do Nunca Mais, com atividades relacionadas à memória do golpe de
1964, como a terceira edição da Caminhada do Silêncio, no parque do Ibirapuera,
em São Paulo.
Para ele,
essas violações, comuns em 1964, estão ligadas a outros eventos históricos
mundiais – fascismo e nazismo, por exemplo –, além das ditaduras na América
Latina. “São resultado de um processo histórico que faz parte da mesma linha de
continuidade. As técnicas de tortura e violência têm relação direta que faz com
que a escravidão, o nazifascismo e as ditaduras estejam interligadas”, afirmou
o ministro. “Quando falamos dos jovens que morrem nas periferias do Brasil
inteiro pela violência policial, estamos no presente. Estamos falando,
portanto, de um passado que não passou”, acrescentou.
Entre outras
ações pró-memória, o MDHC recuperou a Comissão de Anistia, desfigurada pelo
governo anterior, defensor da ditadura. A Comissão Especial sobre Mortos e
Desaparecidos também deverá retornar. No primeiro trimestre, o Disque 100
recebeu 121 mil denúncias de violações de direitos humanos. Crianças e
adolescentes, mulheres, pessoas idosas e com deficiência, população LGBTQIA+,
pessoas em restrição de liberdade e em situação de rua estão entre as vítimas.
Uma novidade é a participação de caminhoneiros em parceria no combate à
violência sexual sofrida por crianças e adolescentes.
Políticas
para mulheres
Já o
Ministério das Mulheres anunciou, no 8 de março, uma série de medidas –
enfrentamento à violência, equiparação econômica e saúde, entre outras.
Posteriormente, o governo sancionou três leis para ampliar a proteção e o
combate a violência. A Lei 14.541, por exemplo, trata de criação e
funcionamento ininterrupto de delegacias especializadas.
Outras ações
ainda a caminho, como a correção da tabela do Imposto de Renda. A meta
anunciada em campanha é garantir isenção para aqueles que ganham até R$ 5 mil,
mas esse valor deverá ser atingido gradualmente. De acordo com cálculos da
Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil
(Unafisco), quase 29 milhões de pessoas ficariam isentas com a correção
integral pela inflação. A tabela não é corrigida desde 2015.
Prata e
bronze
Por ora, os
entraves se concentram nas áreas tributária e fiscal. Em audiência recente na
Câmara, a ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, declarou que a
reforma tributária é a verdadeira “bala de prata” do governo na área econômica.
Para ela,
seria ainda mais importante que o chamado arcabouço fiscal (a “bala de
bronze”), que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já apresentou ao
Congresso. O que se choca com outra áreas sensível: a política monetária, que
já levou a um princípio de “guerra” com o Banco Central. Segundo Haddad, as
novas regras fiscais, mais que permitir, vão “exigir” queda dos juros. “Se as
contas estão em ordem, não tem por que pagar um juro tão alto”, afirma o
ministro. O Senado marcou para o próximo dia 27 um debate entre ele e o
presidente do BC, Roberto Campos Neto.
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