MEC, Milton Ribeiro. FOTO: Sérgio Lima/Poder360 |
“Não faça faculdade”
Luiz Azar – militante
do PCB
“De que adianta você
ter um diploma na parede? O menino faz inclusive o financiamento do FIES […],
termina o curso, mas ele fica endividado. Não consegue pagar, por quê? Porque
não tem emprego. No entanto, o Brasil precisa de mão-de-obra técnica.
Técnica-profissional”.
A declaração acima
foi dada em agosto pelo ministro da educação, Milton Ribeiro [1], causando
justa indignação entre aqueles de nós que ainda não perderam a capacidade de se
indignar com os posicionamentos públicos do governo Bolsonaro-Mourão. Dias
depois de afirmar que crianças com deficiência “atrapalham” o aprendizado dos
colegas [2], o mandatário do MEC nos “presenteava” com mais uma declaração
bastante reveladora de suas posições sobre o sistema educacional e seu papel.
Na verdade, bem mais que uma bravata tosca e preconceituosa, aquela fala do
ministro sobre o “diploma na parede” foi uma síntese quase perfeita do projeto
da direita para o Brasil, como procurarei argumentar.
Num primeiro momento,
a declaração causa certa repulsa porque parece dirigida àquele jovem
trabalhador ou trabalhadora pobre que, ao contrário de seus pais, hoje consegue
ter a ousadia de sonhar com um diploma de universidade – seja por conta da
ampliação da cobertura da rede pública ou pelo subsídio ao ingresso em
faculdades particulares por meio de programas como o próprio FIES, notadamente
a partir do governo Lula [3]. Hoje, a primeira autoridade da Educação do país
dá um recado claro: não sonhe – você pode até conseguir se formar, mas depois
vai ficar desempregado. Ponha-se no seu lugar, diz o ministro nas entrelinhas.
Essa leitura se torna ainda mais inevitável quando lembramos que, semanas
antes, o coerente Milton Ribeiro havia dito em entrevista, com todas as letras,
que “a universidade deveria ser para poucos” [4].
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Imediato concluir
que, para o governo, lugar de pobre não é na universidade – e nem fazendo
turismo no exterior, como demarcou no ano passado o intocável ministro da
economia, Paulo Guedes. Na ocasião, o banqueiro-maior do Estado defendeu o
valor assustador do dólar a R$4,35 – um pesadelo que quase parece sonho em 2021
– e justificou-se na constatação de que antes era “empregada doméstica indo pra
Disneylândia, uma festa danada” [5]. O próprio Guedes, aliás, também já deu sua
opinião sobre o FIES: um “desastre”, citando o caso do filho de porteiro que
havia ingressado na faculdade graças ao programa [6]. Fica ainda mais difícil
acusar de incoerência o governo Bolsonaro-Mourão se considerarmos que Milton
Ribeiro não é nem mesmo o primeiro ministro da educação a defender publicamente
que as universidades sejam reservadas a uma “elite”: Vélez Rodríguez já havia
lançado o manifesto no primeiríssimo mês do governo [7].
Por mais repulsiva que seja a retórica abertamente elitista e anti-povo do governo federal, é preciso fugir da armadilha de discutir apenas as aparências, as palavras. É preciso entender que esse alto grau de coesão no discurso se desenrola organicamente, quer dizer, sem necessidade de ensaio, porque é o reflexo de um projeto político muito bem definido e muito bem articulado, em que pesem as presepadas de uns e outros. Vélez, Guedes, Ribeiro, Salles, todos foram nomeados para cumprir papéis específicos dentro desse projeto. Ao mesmo tempo que as declarações pró-elitização das universidades vêm se sustentando através dos incontáveis ministérios da Educação desde Vélez Rodríguez até Milton Ribeiro, o mesmo acontece com as ameaças, contingenciamentos e cortes de verbas nas universidades federais [8, 9], as quais, redução após redução, chegaram a 2021 com um volume orçamentário 37% menor que o de 11 anos atrás, em valores corrigidos pela inflação [10].
Se a “boiada” continuar “passando” nessa marcha,
não será surpresa que, em alguns anos, as universidades comecem a reduzir o
número de vagas e cursos ofertados. Cada dia mais, e para cada vez mais
brasileiros e brasileiras, não fazer faculdade deixará de ser uma opção e
voltará a ser a única realidade possível. O discurso do ministro é como uma
luva para a realidade concreta que vem sendo sedimentada pelo governo.
Coincidência?
De fato, estamos
diante de um desmantelamento planejado, assim como o das empresas estatais,
que, se fosse por vontade do extremista neoliberal Paulo Guedes, seriam todas
vendidas, sem exceção, assim como todos os imóveis públicos [11]. Se hoje o
governo federal certamente não tem capacidade política de propor a privatização
pura e simples das universidades federais, a dos Correios mal encontra
resistência na Câmara dos Deputados [12], coisa que talvez fosse impensável há
20 ou 30 anos, antes de um desmonte executado ao longo de décadas [13]. Caso
semelhante é o da Petrobras, também vítima de um desmonte paulatino [14, 15],
cuja privatização estará em breve na ordem do dia, como já sinalizou Arthur
Lira, guardião do governo e presidente da Câmara [16].
Ora, cada um desses
ataques ao Estado brasileiro significa uma nova fonte de lucro para empresas
privadas nacionais e sobretudo estrangeiras, e não é preciso muita imaginação
para antever o cenário de um futuro não tão distante em que as universidades
federais, caindo aos pedaços, sem conseguir pagar conta de luz, sejam
retratadas na mídia como mais uma “empresa pública ineficiente”, a ser
transferida para as mãos piedosas e as mentes iluminadas de empresários como
Elizabeth Guedes, irmã do ministro da economia e presidente da Associação
Nacional de Universidades Privadas (ANUP) [17, 18]. Para que esse projeto
privatista avance, é fundamental, desde já, tentar dar um ar de normalidade à
ideia de que a Universidade seja para “poucos”, para uma “elite”, porque, se
tudo correr conforme pretende a burguesia, que tem no governo Bolsonaro fiéis
representantes, será assim mesmo.
Retornemos, porém, a
Milton Ribeiro e ao jovem trabalhador que sonha em entrar na universidade.
Hoje, a depender de situações particulares, talvez a mãe desse jovem o
aconselhe a abandonar ou pelo menos adiar esse sonho, orientando-o a fazer um
curso técnico, que demanda menos tempo e dinheiro investidos – sem ficar muito
atrás na promessa de melhoria de vida, graças à catástrofe da falta de empregos
formais no Brasil [19]. Se olharmos ingenuamente, esse conselho materno pode
soar bastante parecido com a fala de Ribeiro, mas aqui a realidade é bem
diferente. A mãe do jovem pensa na vida particular da família, nas soluções
para os problemas pessoais, que são urgentes. Ela o aconselha com base na
realidade que está posta e também numa projeção de futuro imediato. Já o ministro
fala em nome do governo e, em última instância, em nome do próprio Estado. Ele
deve satisfações a quem pergunta: por que não tem emprego? O que o governo
federal tem feito para tirar o Brasil da crise?
Desde a campanha presidencial, as promessas do “posto Ipiranga” Paulo Guedes – responsáveis por atrair para a candidatura de Bolsonaro vastos setores da elite econômica do país e tocadas até o momento com prioridade máxima pela direita parlamentar, incluindo o mal-chamado “centrão” – seguem à risca a cartilha neoliberal: privatizações, flexibilização das relações de trabalho, desmonte da seguridade social. O discurso oficial é que os empregadores teriam menos custo, o Estado menos dívida e, assim, a economia voltaria a crescer. A realidade, no entanto, é bem diferente.
Com efeito, essa mesma agenda econômica já vinha sendo
executada com máxima prioridade desde o governo Temer, a exemplo da “reforma”
trabalhista, aprovada em 2017. 4 anos depois, em vez de gerar mais empregos, a
“reforma” (ou “deforma”, como alguns preferem) aumentou apenas a insegurança do
trabalhador, contribuindo para ampliar o desemprego e a informalidade [20, 21,
22]. Enquanto o governo comemora um tímido e transitório aumento da população
ocupada, a realidade é que, de longe, a maior parte desse resultado se deve ao
trabalho informal [19, 23, 24]: cansados de procurar um emprego com carteira
assinada, cada vez mais trabalhadores e trabalhadoras fazendo entregas por
aplicativo ou vendendo café com bolo no ponto de ônibus.
Desempregado ou na informalidade, o trabalhador perde renda [25] enquanto sente no bolso e na barriga uma inflação tenebrosa, ultrapassando os 10% em um ano, apesar do cinismo desumano de Paulo Guedes [26]. No médio prazo, a reforma da Previdência, também prometida e entregue pelo governo Bolsonaro-Mourão, só tende a aprofundar o empobrecimento do povo. Se hoje mais da metade dos brasileiros mal consegue se alimentar [27, 28], é evidente que há uma queda generalizada no consumo, que tende a fazer a atividade econômica regredir mais e mais.
Até poucos meses atrás, a resposta do governo era, por exemplo, a MP
1045, um aprofundamento da reforma trabalhista, que iria “presentear” os jovens
trabalhadores com um regime de contratação de meio-expediente e meio-salário
mínimo – sem 13º, férias remuneradas, FGTS ou contribuição para a
aposentadoria. Após essa verdadeira legalização do emprego informal ser
derrotada no Senado, os liberais querem “salvar” a economia através da PEC 32,
a “reforma” administrativa, que essencialmente acaba com a estabilidade do
servidor público, entre outros direitos; os militares, é claro, serão poupados
[29].
Além do desemprego,
fome e precarização da vida dos trabalhadores de forma geral, a política
econômica do governo contribui para tornar o Brasil um país cada vez mais
dependente das grandes potências do capitalismo mundial. Um dos sintomas dessa
dependência é a desindustrialização da nossa economia, um processo já de longa
data, com a participação da indústria de transformação no PIB despencando de 36%
em 1985 para 11% em 2020 [30]. Essa desindustrialização está estritamente
associada à receita neoliberal, com as privatizações e consequente
desnacionalização de cada vez mais setores da economia [31] – exatamente o que
o atual governo procura aprofundar.
Um exemplo disso é a já citada privatização progressiva da Petrobras [14], que já não tem nenhuma participação na BR Distribuidora [15] e vem vendendo as suas refinarias uma por uma, inclusive para empresas estrangeiras. Em bom português, é petróleo extraído e refinado dentro do Brasil e gerando remessa de lucro para o exterior [32], ao mesmo tempo que parte do nosso óleo bruto ainda precisa ser exportado para ser comprado novamente após o refino [33, 34]. Aliás, com base na política adotada pela Petrobras em 2016, no governo Temer, o combustível é vendido nas refinarias do Brasil pelo preço do mercado internacional, mesmo que a maior parte (cerca de 80%) seja extraída e refinada dentro do país [32]. É por isso, e fundamentalmente por isso, que no atual cenário do mercado global, o litro da gasolina já ultrapassa R$7 em alguns estados [35].
Com ênfase: os trabalhadores
do Brasil, um país autônomo na extração de petróleo, sentem no bolso as
flutuações de um mercado global do qual nós mal participamos. A grande mídia
segue cumprindo seu papel ao diminuir ou simplesmente esconder o fato de que as
altas internacionais só repercutem aqui dentro por conta de uma opção da
Petrobras – opção cuja única e real justificativa é, indiscutivelmente,
aumentar o lucro dos acionistas privados. Ao mesmo tempo, em vez de ampliar o
parque de refino, o que nos tornaria definitivamente autônomos e reduziria
ainda mais o preço para os trabalhadores, a Petrobras segue vendendo as
refinarias que ainda tem, para que também empresas estrangeiras lucrem enquanto
você paga o preço que o “mercado” impõe.
A situação da
Petrobras é apenas um exemplo de como o Brasil depende profundamente, e passa a
depender cada vez mais, de países estrangeiros em setores centrais da sua
economia. Certamente, esse quadro de subordinação interessa, e muito, às nações
centrais do capitalismo mundial, sobretudo os Estados Unidos, que seguem
comprando as nossas “commodities” enquanto nós compramos deles produtos
industrializados e de alta tecnologia [36], condenando-nos à condição de país
eternamente “em desenvolvimento” – terminologia, aliás, que oculta uma dinâmica
que na realidade se articula para preservar as coisas exatamente como estão.
Inegavelmente, um dos elementos fundamentais para a superação dessa condição é o desenvolvimento científico e tecnológico. Mas sob o governo Bolsonaro-Mourão, o investimento no setor é cada vez menor, chegando em 2020 ao patamar mais baixo em 12 anos [37] – enquanto os bolsistas de pós-graduação, atuantes na vasta maioria da pesquisa científica produzida no país, tiveram seus salários reajustados nominalmente pela última vez em 2013 [38]. Para piorar, em outubro, o governo operou um golpe profundo contra o CNPq, cortando R$600 milhões de um orçamento que já era ridiculamente pequeno, o que vai inviabilizar projetos de pesquisa inclusive no curtíssimo prazo [39].
Com a situação cada vez mais desoladora para os jovens
pesquisadores, a fuga de cérebros só aumenta, e o Brasil, além de exportador de
matéria-prima, vai se tornando um exportador de pesquisadores doutores formados
com recursos nacionais [40]. Esse é o “patriotismo” da direita: uma bandeira
verde-amarela hasteada a meia-altura com uma outra, dos Estados Unidos,
tremulando por cima; ao lado, uma réplica de Estátua da Liberdade, ao melhor
estilo Luciano Hang; ao fundo, o povo passando fome e cientistas fugindo do
país.
Vimos, então, que se
perguntássemos a Milton Ribeiro o que tem feito o governo para superar a crise
e voltar a gerar empregos de verdade, não haveria resposta possível. Na
verdade, ampliando um pouco o nosso ponto de vista, não é tão difícil entender
o ponto central da mensagem que motiva este texto. “De que adianta você ter um
diploma na parede? […] não tem emprego […] o Brasil precisa de mão-de-obra
técnica.” Ao palestrante, que fala em nome do Estado brasileiro, poderíamos
fazer uma pergunta ainda mais óbvia: então o Brasil não precisa de graduados
porque não há trabalho a fazer? Não há trabalho para profissionais com nível
superior porque todo o trabalho já está feito, exceto o dos técnicos, é isso?
Esse questionamento é
poderosíssimo porque, de um lado, é extremamente simples e, de outro, é forte,
escancara a realidade. Sim, há trabalho a ser feito no Brasil, e há demanda
para profissionais de todos os níveis. Estamos falando de um país onde metade
da população não tem acesso a rede de esgoto e 1/6 não tem água tratada [41];
um país onde boa parte da população vive em moradias precárias, irregulares,
com um déficit habitacional de quase 6 milhões [42]; um país onde qualquer
grande cidade tem problemas sérios de mobilidade urbana, com um sistema de
transporte público ineficaz – e onde, nas localidades mais afastadas, faltam
médicos [43]; um país onde, a cada ano, milhares de pessoas morrem de doenças
negligenciadas [44]; um país que, após quase dois anos de pandemia, ainda não
foi capaz de finalizar o desenvolvimento de uma única vacina 100% nacional
contra a covid, apesar de ser historicamente referência na vacinação; um país
que, como vimos, importa derivados de petróleo, embora seja autossuficiente na
extração [33, 34]; um país com uma matriz energética pouco diversificada,
sujeitando o povo ao risco de apagões e racionamento de energia num cenário de
crise hídrica como o atual [45].
Dizer que o Brasil é
um país com graves problemas sociais, econômicos e sanitários, problemas de
natureza estrutural, é dizer algo tão óbvio que chega quase a ser ridícula a
tentativa de listar os principais desses problemas. O objetivo aqui é apenas
deixar algo claro com mais uma pergunta. Considere somente as questões
mencionadas acima; quantos engenheiros e engenheiras serão necessários para
resolvê-las? Quantos médicos, enfermeiras, arquitetas e urbanistas,
farmacêuticas, fisioterapeutas, oceanógrafos, geólogas, físicos, biólogas,
químicos? E para pensar, planejar e executar a resolução desses problemas,
quantos gestores e gestoras públicas, sociólogas, geógrafos e estatísticos,
matemáticos, assistentes sociais, enfim, quantos são necessários? E para formar
todas essas pessoas, quantos professores doutores, especialistas em cada uma
dessas áreas e, necessariamente, também em todas as áreas correlatas – quantos
serão necessários? E por sinal, também, quantos operários e técnicos são
necessários?
É claro que essas são
perguntas retóricas, mas o objetivo é deixar claro: sim, o Brasil precisa de
mão de obra técnica, e sim, o Brasil precisa de profissionais graduados – e não
poucos. Não falta trabalho a fazer. Ao mesmo tempo, com o devido apoio e
condições, não faltam jovens dispostos a se formar e contribuir com esse
desenvolvimento. Por sinal, pelo menos para começar, o país, apesar do esforço
destrutivo dos últimos governos, já conta com uma boa infraestrutura de
educação superior instalada, inclusive recursos humanos. Então, Milton Ribeiro
deveria responder: o que falta para juntar esses elementos, acabar de vez com o
desemprego e começar a resolver os problemas do nosso povo trabalhador?
Como já deve ter
ficado claro, falta, num primeiro nível, vontade política do governo em
resolver os problemas reais da população. Em linhas gerais, a política
econômica que vem sendo executada não é um grande erro de cálculo; pelo
contrário, é um grande acerto para as elites e para os países “desenvolvidos”.
A título de ilustração, é bom lembrar que, no último ano, enquanto a fome
cresceu e a renda média diminuiu, a quantidade de bilionários no país aumentou
incrivelmente, saltando de 45 para 65 [46]. Não pode haver dúvida de que a
grande burguesia do país, ligada por vínculos financeiros ao empresariado
internacional, está muito bem representada no Congresso e, mais que nunca,
dentro do próprio governo federal, fazendo valer os seus interesses – que,
quase sempre, são bem diferentes daqueles do nosso povo.
É claro que esse alinhamento entre governo e elite econômica, como em toda relação real, é atravessado por falhas, conflitos e contradições. A escalada golpista que parece ter chegado ao limite no 7 de setembro foi um exemplo disso. Setores da burguesia, a exemplo da rede Globo, posaram de democratas numa oposição rasa ao governo, como se eles mesmos não tivessem aberto caminho para a ascenção do bolsonarismo ao patrocinar o lavajatismo, a prisão ilegal de Lula e uma difamação criminosa contra a esquerda – e como se essa mesma burguesia não fosse golpista (vide 2016). À época, o “mercado” conseguiu pressionar Bolsonaro a diminuir o tom para voltar a “administrar pacificamente” a crise, a austeridade e, por quê não, o genocídio. Hoje, o mesmo “mercado” está em polvorosa ao ver o governo avançar com o Auxílio Brasil, tentativa desesperada de salvar alguma popularidade e responder à pressão popular por comida no prato.
É interessante que a burguesia financeira, indignada e insegura com a
atitude de Paulo Guedes, anunciou o apocalipse como nunca tinha feito em dois
anos de condução assassina da pandemia: nem o descaso anunciado com a vacina,
nem as declarações anti-isolamento social, nem o colapso do oxigênio em Manaus,
nem a aceleração assustadora da segunda e terceira ondas, nada disso fez a
bolsa de valores despencar tanto em uma semana como a primeiríssima ameaça ao
sacrossanto teto de gastos [47]! Ao buscar entender o quadro dessas relações de
poder, indo além das aparências, vemos que os atritos entre governo e burguesia
são, não por acaso, superficiais e transitórios: do contrário, seria difícil
explicar por quê Bolsonaro ainda não teve o destino que Dilma teve na mão
dessas mesmas elites, “com o Supremo, com tudo”.
Procurei mostrar que,
quando o ministro diz que as universidades devem ser para poucos, que o jovem
trabalhador deve procurar um curso técnico e daí não passa, ele não está apenas
expondo uma visão de mundo elitista, de quem acha que lugar de pobre não é na
universidade. Enquanto membro do governo, alinhado a uma política econômica
defendida e executada por esse mesmo governo, o ministro nos apresenta um
projeto de Brasil. Trata-se de um Brasil com poucos graduados universitários,
apenas o suficiente para manter as coisas do jeito que elas estão: miséria,
fome, falta de perspectiva para o povo; cada vez mais dinheiro e poder para os
banqueiros e demais setores do grande empresariado; profunda dependência
econômica em relação aos países centrais, com a soberania nacional em
frangalhos e um eterno deslocamento de riqueza de dentro para fora, como tem
acontecido desde a invasão europeia em 1500. Milton Ribeiro é apenas mais um
signatário desse projeto.
Por outro lado, o Brasil que interessa ao nosso povo trabalhador, inclusive os jovens, é radicalmente diferente. Um país grandioso, rico em recursos naturais mas também em ciência e tecnologia, onde a riqueza material se transforme, verdadeiramente, em vida digna para a população – com pleno emprego, moradia digna para todas as pessoas, um SUS público e funcionando plenamente, educação pública e de qualidade, respeito aos povos originários e terra nas mãos de quem trabalha e põe comida na mesa dos brasileiros, não do agronegócio [48].
Um
Brasil soberano, capaz de ditar os próprios rumos longe da ingerência de países
imperialistas, e que só poderá vir a existir com o povo no poder, acima dos
interesses particulares das elites que já nos governam e nos exploram há mais
de 500 anos. Esse Brasil é basicamente o oposto, a antítese daquele pretendido
por Bolsonaro, Mourão e Guedes; por isso, o primeiro passo é derrubá-los
através da organização coletiva, nas ruas, nos bairros, nas associações e nos
sindicatos, com um projeto verdadeiramente popular. E depois, para ajudar a
conduzir o país na longa jornada que se apresenta, serão necessários, com
certeza, muitos jovens trabalhadores e trabalhadoras com diplomas na parede.
REFERÊNCIAS EXTERNAS:
[1]
https://g1.globo.com/sp/piracicaba-regiao/noticia/2021/08/21/ministro-da-educacao-diz-que-diploma-de-universidade-nao-adianta-porque-nao-tem-emprego.ghtml
[2]
https://www.opovo.com.br/noticias/politica/2021/08/17/ministro-da-educacao-criancas-com-deficiencia-atrapalham-outros-estudantes.html
[3]
https://periodicos.uff.br/revistamovimento/article/view/32675
[4] https://g1.globo.com/educacao/noticia/2021/08/10/ministro-da-educacao-defende-que-universidade-seja-para-poucos.ghtml
[5]
https://oglobo.globo.com/economia/guedes-diz-que-dolar-alto-bom-empregada-domestica-estava-indo-para-disney-uma-festa-danada-24245365
[6] https://g1.globo.com/educacao/noticia/2021/04/30/paulo-guedes-critica-o-fies-e-diz-que-filho-de-porteiro-tirou-zero-na-prova-e-conseguiu-financiamento.ghtml
[7]
https://gauchazh.clicrbs.com.br/educacao-e-emprego/noticia/2019/01/ministro-da-educacao-diz-que-universidades-devem-ser-reservadas-para-elite-intelectual-cjrgf7q9u00tv01nyfdfjwyoc.html
[8]
https://educacao.uol.com.br/noticias/2019/04/30/mec-anuncia-corte-de-30-da-verba-para-todas-as-federais.htm
[9]
https://www.cnnbrasil.com.br/nacional/podcast-e-tem-mais-o-impacto-do-corte-de-recursos-para-universidades-federais/
[10]
https://g1.globo.com/educacao/noticia/2021/05/12/ciencia-e-tecnologia-acabaram-em-11-anos-orcamento-do-mec-para-as-universidades-federais-cai-37percent.ghtml
[11]
https://www.poder360.com.br/economia/guedes-diz-querer-vender-todas-as-estatais-mas-que-nao-vai-conseguir/
[12]
https://www.camara.leg.br/noticias/790314-camara-aprova-projeto-que-permite-a-privatizacao-dos-correios
[13]
https://www.cut.org.br/noticias/greve-nos-correios-denuncia-desmonte-dos-servicos-publicos-881f
[14]
https://www.fup.org.br/ultimas-noticias/item/25952-sob-o-governo-bolsonaro-petrobras-sofre-o-maior-desmonte-da-historia
[15]
https://www.poder360.com.br/economia/petrobras-nao-e-mais-socia-da-br-distribuidora-e-recebe-r-114-bilhoes/
[16]
https://valor.globo.com/brasil/noticia/2021/03/22/privatizacao-de-petrobras-volta-a-tona-apos-acao-de-bolsonaro.ghtml
[17]
https://www.brasildefato.com.br/2019/05/09/como-a-associacao-liderada-pela-irma-de-paulo-guedes-se-beneficia-de-cortes-no-ensino
[18]
https://anup.org.br/sobre/organograma/
[19]
https://www.folhape.com.br/economia/trabalho-informal-cresce-mas-taxa-de-desemprego-segue-em-141/170557/;
para dados mais atualizados, ver
https://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2021-10/ibge-aumenta-emprego-formal-e-informal-mas-cai-rendimento-medio
[20]
https://www.brasildefato.com.br/2019/09/09/reforma-na-clt-nao-freou-desemprego-e-ainda-piorou-a-vida-do-trabalhador
[21]
https://www.redebrasilatual.com.br/trabalho/2021/08/reforma-trabalhista-travou-retomada-livro/
[22]
https://outraspalavras.net/videos/dari-krein-e-as-consequencias-da-reforma-trabalhista/
[23]
https://www.bbc.com/portuguese/brasil-57265829
[24]
https://valor.globo.com/brasil/noticia/2021/03/31/ibge-informalidade-responde-por-maior-parte-do-aumento-da-populacao-ocupada.ghtml
[25]
https://oglobo.globo.com/economia/em-2020-renda-per-capita-brasileira-teve-maior-queda-da-serie-historica-1-24906950
[26]
https://exame.com/economia/recessao-em-2022-e-inflacao-em-10-como-as-projecoes-do-brasil-pioraram/;
ver também
https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2021/08/guedes-diz-que-nao-ha-descontrole-da-inflacao-e-que-com-indice-de-8-brasil-esta-no-jogo.shtml
[27]
https://www.istoedinheiro.com.br/6-em-cada-10-casas-brasileiras-vivem-inseguranca-alimentar-falta-comida-em-15-1/
[28]
https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-de-noticias/noticias/28903-10-3-milhoes-de-pessoas-moram-em-domicilios-com-inseguranca-alimentar-grave
[29] Sobre a PEC 32,
ver
https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2021/08/19/reforma-administrativa-pec-32.htm
e também
https://outraspalavras.net/outrasmidias/os-pes-de-barro-da-reforma-administrativa/;
sobre a MP 1045, ver
https://www.cut.org.br/noticias/veja-como-cada-senador-votou-na-derrubada-da-reforma-trabalhista-mp-1045-051b
e
https://www.cut.org.br/noticias/entenda-a-mp-1045-que-diminui-salarios-acaba-com-13-ferias-e-outros-direitos-8411.
[30] https://industriabrasileira.portaldaindustria.com.br/grafico/total/producao/#/industria-transformacao,
acessado em agosto de 2021.
[31]
https://www3.eco.unicamp.br/cede/centro/146-destaque/508-desindustrializacao-no-brasil-e-real-e-estrutural
[32]
https://www.seesp.org.br/site/index.php/comunicacao/noticias/item/19959-artigo-o-desmonte-da-petrobras-e-da-soberania-nacional
[33]
https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2021/04/17/por-que-o-brasil-importa-combustiveis-se-e-autossuficiente-em-petroleo.htm
[34] https://sindipetronf.org.br/por-que-o-brasil-ainda-importa-derivados-de-petroleo/
[35]
https://g1.globo.com/economia/noticia/2021/10/25/petrobras-reajusta-mais-uma-vez-precos-da-gasolina-e-do-diesel.ghtml;
ver também https://www.nsctotal.com.br/noticias/alta-do-preco-da-gasolina-e-projecao-de-litro-a-r-7-preocupam-motoristas-e-postos-em-sc
[36]
http://san.uri.br/revistas/index.php/direitoejustica/article/view/166
[37]
https://ciencia.estadao.com.br/noticias/geral,investimento-federal-em-ciencia-e-tecnologia-recua-e-setor-tem-menos-verba-que-em-2009-diz-estudo,70003819777
[38]
http://www.anpg.org.br/04/02/2019/o-reajuste-das-bolsas-de-pos-graduacao-e-urgente-e-necessario/
[39]
https://valor.globo.com/politica/noticia/2021/10/15/bolsonaro-sanciona-corte-de-r-600-milhoes-no-ministerio-da-ciencia.ghtml
[40]
https://www.redebrasilatual.com.br/saude-e-ciencia/2021/07/renato-janine-prioridade-orcamento-pesquisa/
[41]
https://g1.globo.com/economia/noticia/2020/06/24/raio-x-do-saneamento-no-brasil-16percent-nao-tem-agua-tratada-e-47percent-nao-tem-acesso-a-rede-de-esgoto.ghtml
[42]
https://g1.globo.com/economia/noticia/2021/03/04/deficit-habitacional-do-brasil-cresceu-e-chegou-a-5876-milhoes-de-moradias-em-2019-diz-estudo.ghtml
[43]
https://www.soulmedicina.com.br/noticia/111/a-falta-de-medicos-nos-hospitais-publicos-do-interior-do-brasil/;
ver também
https://noticias.uol.com.br/saude/listas/falta-medico-e-dinheiro-10-grandes-problemas-da-saude-no-brasil.htm
[44]
https://www.brazilianjournals.com/index.php/BRJD/article/view/23501
[45]
https://piaui.folha.uol.com.br/lupa/2021/07/19/crise-energetica-no-brasil/
[46]
https://www.brasildefato.com.br/2021/04/06/enquanto-fome-avanca-numero-de-bilionarios-cresce-no-brasil-e-seu-patrimonio-dobra
[47]
https://g1.globo.com/economia/noticia/2021/10/22/bovespa.ghtml
[48]
https://www.brasildefato.com.br/2021/10/20/o-agro-nao-e-pop-estudo-aponta-que-a-fome-e-resultado-do-agronegocio
LEITURAS ADICIONAIS:
(1) Valor da cesta
básica passa da metade do salário mínimo:
[cesta-salario]
https://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2021/08/27/cesta-basica-ja-consome-mais-da-metade-do-salario-minimo-do-trabalhador-brasileiro.ghtml
(2) Ao mesmo tempo,
aumentam os lucros do agronegócio e dos bancos:
https://g1.globo.com/economia/agronegocios/noticia/2021/08/11/recordes-no-agronegocio-e-aumento-da-fome-no-brasil-como-isso-pode-acontecer-ao-mesmo-tempo.ghtml
https://valorinveste.globo.com/mercados/renda-variavel/empresas/noticia/2021/05/19/lucro-dos-dez-maiores-bancos-aumenta-528percent.ghtml
(3) Interferência dos
EUA na nossa política através da Lava Jato:
https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2020/03/12/lava-jato-intercept-estados-unidos.htm
https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2021/06/4929569-exclusivo-congressistas-dos-eua-pedem-que-governo-biden-explique-como-foi-cooperacao-entre-americanos-e-lava-jato.html
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