sábado, 14 de agosto de 2021

Conselho da PGR recebe pedido para investigar Aras por prevaricação em inquéritos contra bolsonaristas

 

O GLOBO - Aguirre Talento

sáb., 14 de agosto de 2021

BRASÍLIA - Um grupo de subprocuradores-gerais da República aposentados, dentre eles o ex-procurador-geral da República Cláudio Fonteles, enviou ao Conselho Superior do Ministério Público Federal um pedido de investigação criminal contra o atual procurador-geral Augusto Aras por suspeitas de prevaricação em sua conduta à frente da Procuradoria-Geral da República (PGR), com o objetivo de blindar o presidente Jair Bolsonaro. Procurado, Aras afirmou por meio de nota que possui independência em sua atuação funcional e que essa é uma das garantias da instituição (leia ao final).

A discussão chega ao órgão em um momento de desgastes e cobranças a omissões de Aras em sua atuação. Ontem, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes apontou que a PGR não respondeu no prazo estipulado a um pedido de prisão contra o ex-deputado Roberto Jefferson, aliado de Bolsonaro, gerando mais um foco de atrito com a PGR.

Aras foi escolhido por Bolsonaro para o comando da PGR por fora da lista tríplice, formada por votação interna da categoria, e foi indicado no mês passado para um novo período de dois anos à frente do órgão. Sua recondução ainda precisa ser aprovada no Senado.

Essa representação foi apresentada no último dia 9 de agosto e recebida pelo vice-presidente do Conselho Superior, o subprocurador-geral da República José Bonifácio Borges de Andrada. Na sexta-feira, Bonifácio proferiu um despacho determinando o prosseguimento do caso, com o sorteio de um relator para a análise do pedido.

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O documento se baseia nas cobranças feitas a Aras pelos próprios ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) em pedidos de investigações contra bolsonaristas. Citam, por exemplo, o despacho da ministra Rosa Weber com duras críticas à PGR por ter pedido para aguardar a conclusão da CPI da Covid antes de decidir sobre um pedido de investigação contra Bolsonaro. Nesse despacho, a ministra chegou a dizer que o Ministério Público não poderia assumir papel de "espectador" e deveria cumprir seu papel constitucional.

A representação ainda cita uma suposta demora de Aras em adotar providências em uma investigação sobre o uso da estrutura do governo federal para favorecer a defesa do senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) e uma cobrança feita pela ministra Cármen Lúcia à PGR por não ter incluído o nome do então presidente do Ibama Eduardo Bim como investigado em uma abertura de inquérito que mirava o então ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles.

"Eis os fatos claríssimos e bastantes. Indicam que o procurador-geral da República Antônio Augusto Brandão de Aras, por si próprio ou por intermédio de pessoa da sua mais estreita confiança, o vice-procurador-geral da República, Humberto Jacques de Medeiros, vem, sistematicamente, deixando de praticar ou retardando a prática de atos funcionais para favorecer a pessoa do presidente da República ou de pessoas que lhe estão no entorno", escrevem na representação.

Assinam o documento, além de Cláudio Fonteles, os subprocuradores-gerais da República aposentados Wagner Gonçalves, Álvaro Augusto Ribeiro da Costa, Paulo de Tarso Braz Lucas e o desembargador federal aposentado Manoel Lauro Volkemer de Castilho.

A lei complementar que estabelece a organização do Ministério Público prevê que o Conselho Superior do MPF tem competência para analisar pedidos de investigação criminal contra o procurador-geral da República. Com o despacho proferido por Bonifácio, um dos integrantes do conselho tem que ser sorteado relator. Depois, o relator precisa opinar se há elementos para abertura da investigação e levar o assunto para julgamento pelos demais colegas.

Aras tem minoria no Conselho Superior, o que indica que o julgamento desse pedido de investigação pode ter resultado desfavorável ao procurador-geral. O caso vai representar mais um foco de desgaste contra o procurador-geral, em um momento no qual ele se movimenta no Senado para a aprovação de sua recondução ao cargo.

É o primeiro pedido de investigação criminal feito contra Aras ao conselho. No início do ano, um grupo de senadores enviou ao órgão um pedido de apuração da conduta funcional de Aras. O vice-presidente do conselho, José Bonifácio, também havia determinado o sorteio de um relator para a análise do caso, mas um aliado de Aras, o vice-procurador-geral da República Humberto Jacques, barrou a tramitação, como revelou O GLOBO em 4 de julho.

'Independência funcional'

Em nota, o procurador-geral da República negou irregularidades em sua atuação e afirmou que tem a garantia de independência funcional. Afirmou ainda que o tema já foi analisado duas vezes pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) e arquivado -o CNMP, porém, não tem competência para analisar eventuais crimes do procurador-geral, o que é atribuição do Conselho Superior.

"A todos os membros do Ministério Público -- sem exceção -- o Direito reserva a independência na sua atuação funcional, em quaisquer dos casos em que atua como procurador/promotor natural, com mecanismos específicos para eventual controle", diz na nota.

Aras classifica de "expedientes políticos, midiáticos e jurídicos extremos" a acusação feita contra ele. "O exercício independente e fundamentado das atribuições ministeriais -- como de todas magistraturas -- sempre e naturalmente atende e desatende pretensões externas nos casos que lhe são trazidos. Apesar da divergência jurídica ser ínsita à atuação de qualquer profissional do Direito, os membros do Ministério Público por vezes são alvos de toda sorte de reação a sua atuação livre e independente, chegando alguns detratores do MP a usar expedientes políticos, midiáticos e jurídicos extremos para expressar sua discordância ou insatisfação", disse.

Para o procurador-geral, a independência dos membros do MP "é uma pedra de toque do sistema acusatório". "A ninguém deveria interessar sua fragmentação. Qualquer esforço para desqualificação do exercício independente de seus integrantes é uma violência contra o Estado Democrático de Direito e um risco às liberdades fundamentais de toda a cidadania. A independência do Ministério Público se articula com a responsabilidade de seus membros nas instâncias competentes para esse equilíbrio harmônico e essencial à Democracia", afirmou.

 

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