4 de março de 2021
No balcão de negócios da Petrobrás de Bolsonaro, o povo não tem vez
Show de ilusionismo
na Petrobrás: sai o 6 e entra o meia-dúzia, mas o povo continua com o 0…
Unidade Classista dos
Petroleiros
No dia 19 de
fevereiro de 2021 o presidente Jair Bolsonaro anunciou a demissão de Castello
Branco do comando da Petrobras por meio de ofício do Ministério de Minas e
Energia (MME), solicitando providências a fim de convocar Assembleia Geral
Extraordinária, com o objetivo de promover a sua substituição por Joaquim Silva
e Luna, um general da reserva de peculiar talento político, que já ocupou
cargos chave nos governos de composição com o centrão, tendo sido Ministro da
Defesa durante o Governo Temer e presidido Itaipu desde o início de 2019.
Um dos motivos da
demissão de Castello Branco, segundo noticiaram diversos meios de comunicação,
foi, primariamente, a política de preços da companhia sob Castello Branco, que
tem tido impacto significativo sobre o capital político do governo Bolsonaro. Os
preços da gasolina e principalmente do Diesel têm provocado descontentamento
popular ao repassar as variações da cotação do dólar, e do preço do barril,
diretamente ao consumidor final. Caminhoneiros ameaçam greve, donos de postos
de combustíveis se preocupam com a queda do consumo, enquanto os trabalhadores,
vitimados pelo genocídio do COVID-19 (mais de 250 mil mortes contabilizadas no
Brasil), veem seu poder de consumo ser corroído pela aceleração da inflação,
que tem como um dos componentes mais importantes o custo dos transportes e do
frete.
O mercado, a mídia
especializada, e atores políticos ligados à pauta da liberalização econômica
correram para expressar seu descontentamento com palavras como
“intervencionismo”, “populismo” e, pasmem, até “comunismo”. Mas o
descontentamento destes não é com o atual preço do combustível: Para
especialistas publicados nas mais diversas mídias especializadas, da Agência
Reuters a CNN, o preço ainda está R$ 0,21 (Gasolina) e R$ 0,23 (Diesel)
defasado em relação ao preço de equilíbrio internacional. O descontentamento
foi em relação a substituição de Castello Branco por Luna, após reclamações de
Jair Bolsonaro sobre a alta de preços, fator que ele sabe que diminui sua
aprovação e compromete sua permanência no poder até 2022 e além.
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Entretanto, após
repercussão no mercado e considerável perda do valor de ações da Petrobras, o
presidente afinou seu discurso com os acionistas nacionais e internacionais e
mirou sua verborragia nos impostos, que segundo ele seriam grandes responsáveis
pela alta de preços, ainda que todos saibam que os problemas principais são o
efeito da volatilidade cambial e das oscilações do preço internacional do
barril, sobre a política de preço de paridade de importação (PPI). Segundo a
revista Veja, Paulo Guedes chegou a dizer a Bolsonaro, antes do anúncio da
demissão de Castello Branco, que “Era mais barato dar 100 bilhões de reais aos
Caminhoneiros”, e esta é, possivelmente, a parte mais importante de toda a
narrativa escancarada na mídia.
Alguns setores da
esquerda, ou da perspectiva de desenvolvimento nacional, praticamente saudaram
Luna e Bolsonaro por enfim intervir nos preços. Mas notemos que não foi
anunciada nenhuma alteração no PPI. O foco nos impostos, e não no PPI, acalma
os mercados e dilui o dano político de Bolsonaro, terceirizando-o para estados
e municípios, que ficam com o ônus de serem contra alterações nos impostos, os
quais deteriorariam as contas municipais e estaduais, em um já esgarçado pacto
federativo. Ao que tudo indica, a rusga no seio da aliança do Bolsoliberalismo
não irá descambar para uma ruptura. Há, no curto prazo, várias possibilidades
de acomodação entre os interesses da ala liberal austericida e daqueles
preocupados com o desgaste do capital político do governo.
Um exemplo de acordo
possível é o Mecanismo Automático de Amortecimento de Preços (MAAP), proposta
de Henrique Meirelles, ex-ministro da economia de Lula e ex-candidato à
presidência da república. Curiosamente, poucas informações constam sobre quais
seriam as origens dos fundos que permitiriam o MAAP, mas está claro para nós
que estas receitas não virão às custas dos dividendos dos acionistas da
Petrobras. As fontes mais prováveis que restam são isenções fiscais, fundos
desviados de outros setores devido à desvinculação (por imposição do teto de
gastos), ou o que quer que seja “economizado”, com a reforma administrativa
(que não atingirá a nata do serviço Público – militares, políticos eleitos,
judiciário e seus agregados –, é sempre bom lembrar). Em todas essas opções, há
aumento sistêmico da desigualdade e concentração de renda. Como de costume no
Brasil, a conta será paga, esmagadoramente, pelos mais fracos: os muito pobres.
Mas mais importante
do que o PPI e a troca da presidência da Estatal é abordar um problema que não
é exclusivo de Bolsonaro, mas que vem sendo gestado pelo menos desde o Governo
FHC, Dilma II e Temer: o desmonte da Petrobras. A desintegração do setor do
petróleo põe em risco a rentabilidade da própria Petrobras. Ao abrir mão do
refino, por meio da privatização de refinarias (na opinião de Castello Branco
para a Reuters, a empresa deveria se desfazer de 8 das 13 refinarias que
controla), a empresa fica vulnerável a momentos de preços baixos (sim, vivemos
momentos de preços baixos internacionais), se confiar somente nas receitas
provenientes da Exploração & Produção (E&P).
Nestes momentos,
segundo a Associação de Engenheiros da Petrobras (AEPET), o refino apresenta
maior rentabilidade e serve para dar resiliência às contas da estatal, que em
um momento de alta, inverte a situação e tem sua maior lucratividade na
Exploração e Produção de óleo Cru. É bom ressaltar que, mesmo que a Petrobras
tenha anunciado um lucro espantoso recentemente, cerca de R$ 60 bilhões, o
ex-economista da Petrobras e atual diretor da AEPET, Cláudio Oliveira, alerta
que o resultado é fruto de ajustes contábeis e das recentes privatizações, e
não está embasado em resultados operacionais da empresa.
Outro problema sério
que aflige a companhia é maximizar o pagamento de dividendos a seus acionistas
a qualquer custo, mesmo que seja com a liquidação de ativos, resolvendo
problemas de fluxo de caixa atacando o estoque de capital da empresa. Entregar
refinarias ao setor privado irá enfraquecer a estatal, uma estratégia na
contramão da indústria, em um contexto onde as empresas internacionais de
petróleo retomaram os investimentos no refino, principalmente as empresas
nacionais de petróleo, que estão se fortalecendo em todo o mundo, inclusive
através da expansão e integração da capacidade de refino com a petroquímica,
como por exemplo, as empresas dos países da Ásia (China-CNPC, Índia-IOC,
Indonésia-Pertamina, Malásia-Petronas), da Rússia (Rosneft e Gazprom) e do
Oriente Médio (SaudiAramco).
É urgente que sejam
feitas propostas na direção de uma Petrobras inteiramente estatal, integrada e
verticalizada, em linha com a estratégia do próprio setor privado
internacional, que ao comprar aos lotes refinarias por todo mundo, como aqui,
na prática, verticalizam o setor, desta vez não sob o controle do estado e da
sociedade civil, mas sob os interesses dos acionistas internacionais, que se
preocupam somente com a maximização dos seus resultados trimestrais e com a
redução do risco de seus portfólios. Em um momento tão desolador, diante de uma
calamidade sanitária e de um aumento galopante da pobreza extrema, parece
utópico atentar também para a possibilidade de um controle, ao menos
consultivo, das políticas das empresas estatais pelo seu corpo de trabalhadores
altamente qualificados e pela sociedade civil. Entretanto, nos parece que essa
é a única maneira de blindar a empresa do balcão de negócios escusos e
corruptos que é a política brasileira, desde sempre, e das atitudes predatórias
de investidores que tem como objetivo primário a valorização de seu capital.
Em face deste
cenário, soa extremamente cínico e irônico, que todos que reivindicam controle
direto dos trabalhadores e sociedade sobre a produção, sejam rapidamente
taxados de “radicais”. Ainda mais quando, diante de uma população desalentada que
precisa recorrer a lenha para cozinhar e sentados em cima de uma massiva
reserva de petróleo, se naturaliza que a única função da maior empresa da
América Latina, antes de tudo uma estatal, seja enviar cada vez mais vultosas
remessas de lucros para acionistas do mundo tudo, custe o que custar, até mesmo
a vida dos brasileiros. Afinal, por que naturalizar o “todo valor aos
acionistas” e tomar como “radical” o “todo poder aos trabalhadores”, que são
justamente os responsáveis por gerar todo esse valor?
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