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Ex-ministro da Defesa e da Segurança Pública durante o governo Temer, Raul Jungmann conhece como poucos civis os meandros da elite das Forças Armadas brasileiras.
© Agência Brasil Ex-ministro da Defesa e Segurança Pública, Raul Jungmann critica a política de armas do governo Bolsonaro
Observador
privilegiado de alguns dos principais episódios das recentes crises entre
militares, civis e o Judiciário — desde o controverso tuíte do general Villas
Bôas ao 'prende e solta' de Lula, em 2018 —, no final de fevereiro Jungmann
publicou uma carta aberta aos ministros do STF onde enumera o que vê como riscos
da política armamentista do presidente Jair Bolsonaro.
No documento, ele
pede uma "intervenção" dos ministros do Supremo para suspender as
portarias e decretos presidenciais de Bolsonaro que desburocratizam e ampliam o
acesso a armas e de munição por cidadãos comuns e por aqueles que têm registro
de CAC (colecionador, atirador e caçador).
Em entrevista à BBC
News Brasil, Jungmann argumenta que tais políticas estão "erguendo o
espectro horripilante de um choque, um conflito de brasileiros contra
brasileiros e isso tem um nome na história: guerra civil".
"Quando você
teve o armamento de populações, a História nos ensina, sempre vieram a reboque
ou deixaram um rastro de genocídio, de massacre de etnias, de populações, de
golpes, tirania e, inclusive, do ovo da serpente: do fascismo italiano e do
nazismo alemão", disse à BBC News Brasil.
Na entrevista,
Jungmann também afirma que, apesar dos pedidos de "intervenção
militar" por parte de setores radicalizados da sociedade, "as Forças
Armadas não darão suporte ou apoio a qualquer desvio constitucional, qualquer
golpe ou qualquer interrupção da democracia".
Questionado sobre
as eleições de 2022, Jungmann diz não antever qualquer tipo de interferência ou
"maiores problemas" por parte dos militares, "seja com Lula... Mandetta,
Moro, Huck... e, evidentemente a continuidade do Bolsonaro".
Confira os
principais trechos da entrevista.
Continue lendo
BBC News Brasil - Em fevereiro, o
senhor escreveu uma carta aberta aos ministros do Supremo Tribunal Federal em
que diz que a política do governo Bolsonaro de ampliar acesso às armas de fogo
coloca em risco a democracia no Brasil. Como, em sua opinião, tais políticas
podem ser uma ameaça às instituições?
Raul Jungmann - A questão do armamento ou não da população sempre
foi um assunto de debate na área da segurança pública. Alguns achavam que isto
reduziria a violência e outros, como nós, baseado em ampla literatura técnica,
achávamos que não, pelo contrário: mais armas mais mortes, menos vida.
Acontece que o
presidente da República fez um deslocamento do debate da área da segurança
pública para a área político-ideológica quando ele diz que é preciso armar todo
o povo para resistir a tiranias, para resistir a perda de liberdades. Ora, não
pesa sobre o país nenhuma ameaça, seja real ou imaginária, de que você venha a
ter uma tirania, pelo contrário, ainda que sob pressão nossas instituições
estão funcionando até aqui. E, também, não existe nenhuma força política hoje
de relevância ou mesmo de pouquíssima relevância que esteja fora do jogo
democrático.
Então, isso nos leva a três questionamentos, a três graves problemas: em primeiro lugar, ao se propor o armamento da população, está se propondo a quebra do monopólio da violência legal, que é privativa ao Estado Nacional. Na verdade, o certificado do nascimento de um Estado Nacional é quando ele passa a deter o monopólio da violência legal. Em segundo lugar, ao quebrar o monopólio, você está desfazendo do papel constitucional das Forças Armadas, que são, digamos assim, a ultima ratio, o último suporte da integridade desse Estado Nacional e da nossa soberania, então isso também representa um ataque às Forças Armadas e é preciso defender o papel delas.
Terceiro e último, ao propor o armamento da população,
se nós não temos nenhum inimigo, nenhuma ameaça externa, então, ainda que não
esteja visível no horizonte, você está erguendo o espectro horripilante de um
choque, um conflito de brasileiros contra brasileiros e isso tem um nome na
história: guerra civil.
Quando você teve o
armamento de populações, a História nos ensina, sempre vieram a reboque ou
deixaram um rastro de genocídio, de massacre de etnias, de populações, de
golpes, tirania e, inclusive, do ovo da serpente: do fascismo italiano e do
nazismo alemão.
Então, por isso que
eu entendo que essa proposta de armar a população, pelo o que aqui narrei,
representa um risco sério e precisa ser afastado, precisa ser devidamente
evitado, de uma quebra de nossa estabilidade e por isso me dirigi ao Supremo
Tribunal Federal, onde tramitam vários pedidos de suspensão dessa política
armamentista do governo federal.
BBC News Brasil - O cenário que o
senhor pinta é bastante preocupante. Na avaliação do senhor, qual o objetivo do
governo Bolsonaro ao facilitar esse acesso a armas? O senhor acha que estas são
consequências que o governo não está antevendo ou existe algo deliberado nesse
sentido?
Jungmann - Em primeiro lugar, é preciso reconhecer que o
presidente Bolsonaro sempre teve essa pauta. Eu fui colega dele durante 12 anos
na Câmara dos Deputados, então ele está sendo absolutamente honesto quando faz
a defesa dessa pauta. Em segundo lugar ele atende à base que o elegeu, que é
uma base pró-armamentista, em larga medida. E, em terceiro lugar, aí eu acho
que fazer uma interpretação literal não é possível, mas é possível dizer que
este tipo de atitude conspira contra a estabilidade democrática. Basta lembrar
o que aconteceu há pouco nos Estados Unidos, com a invasão do Capitólio, e nós
temos eleição em 2022.
Então, independentemente
das intenções, que não me cabe aqui avaliar, do senhor presidente da República,
ele comete um enorme equívoco, que atenta contra o monopólio da violência legal
pelo Estado Brasileiro, contra o papel da Forças Armadas e, evidentemente,
contra a possibilidade de você ter conflitos entre brasileiros.
Imagine você que em
2022 nós temos um resultado eleitoral contestado — e aparentemente nós vamos
ter uma reedição de polarização, igual a de 2018, aparentemente, apenas. Então
tudo isso, evidentemente, agrava nossas preocupações e exige medidas imediatas
para evitar que isso aconteça.
BBC News Brasil - O senhor foi
ministro da Defesa e conhece como poucos civis as Forças Armadas. Na carta
aberta, o senhor fala que essa política de facilitação do armamento atenta
contra o papel das Forças Armadas. Mas, ao mesmo tempo, parte das Forças Armadas
parece não estar tão incomodada com esse fato, pois temos um recorde de
militares em cargos de ministérios e secretarias no governo Bolsonaro. Por que
o senhor acha que isso ocorre, já que há um conflito entre o papel da Forças
Armadas e essa política armamentista?
Jungmann - Em primeiro lugar é preciso dizer que o presidente
Jair Bolsonaro, durante toda a sua carreira parlamentar, foi um parlamentar de
nicho, ou seja, ele tinha duas clientelas específicas as quais ele se dedicava:
primeira delas são os próprios militares e ele provém exatamente das Forças
Armadas, mais especificamente do Exército Brasileiro e, em segundo lugar, os
policiais.
No momento em que
ele assume o governo, não tendo ele uma grande passagem junto às elites
financeiras, empresariais, culturais, de mídia etc., etc. para compor o seu
governo, ele volta-se para quem? Para os militares. Não se volta tanto para as
polícias, porque as polícias são estaduais e não são nacionais, como são as
Forças Armadas. Então onde é que ele vai buscar os quadros para governar com
ele? Ele vai buscar isso exatamente com as Forças Armadas.
Do lado das Forças
Armadas, além daqueles que evidentemente simpatizam com a agenda do presidente,
existem outros que não simpatizam.
Mas aqui nós temos
um problema que não é tanto das Forças Armadas e tampouco do presidente Jair
Bolsonaro, que é o papel do Congresso Nacional.
Hoje se reclama
muito da presença dos militares no governo, mas é preciso dizer que o Congresso
Nacional tem prerrogativas constitucionais para estabelecer restrições sobre
isso. Se o Congresso Nacional, se o poder político, se a elite civil e política
não impõe travas a isso. Não seria necessariamente contra militares, mas
exatamente para manter a separação que é fundamental institucionalmente entre
governo e Forças Armadas, que têm uma missão constitucional voltada para o
Estado e não para o governo. O Congresso falha ao não estabelecer isso.
Então, reclama-se
por exemplo da presença (de militares no governo) — que eu acho, sobretudo em
termos dos militares da ativa, excessiva —, mas não existe nenhuma trava. Em
segundo lugar, sendo o presidente da República o comandante supremo das Forças
Armadas, não havendo nenhuma trava legal, o que elas podem fazer?
Certa feita eu
estava em um debate com o ex-ministro da Justiça Tarso Genro, e ele disse:
"As Forças armadas precisam se pronunciar." E eu disse: "Não,
elas não devem se pronunciar. Elas devem permanecer exatamente onde
estão", que é exatamente voltadas para as suas atividades profissionais,
elas não têm que entrar na política. Elas não têm que falar, diferentemente de
outras corporações, elas não devem falar. Porque se começam a falar, vão falar
hoje, vão falar amanhã e vão falar depois.
A verdade é que
aqui há uma grande confusão, que é preciso esclarecer... Quem tem falado são
militares da reserva que estão em funções políticas, mas eles não falam pelas
Forças Armadas.
Não se deve cobrar
que os militares se pronunciem sobre política. Evidente que militar é cidadão e
tem gente lá que apoia o governo e tem gente que é contrária ao governo, como
aliás acontece mundo a fora — mas elas (as Forças Armadas) devem e estão
permanecendo voltadas a suas atividades profissionais.
Eu não represento e
não falo pelas Forças Armadas, apenas fui quase dois anos ministro da Defesa,
mas posso lhe assegurar pelo que conheço e pelo que conheci, que as Forças
Armadas não darão suporte ou apoio a qualquer desvio constitucional, qualquer
golpe, qualquer interrupção da democracia do nosso país.
BBC News Brasil - No mês passado
também voltou à tona aquele famoso tuite do general Villas Bôas, então
comandante do Exército, que ele publicou as vésperas do julgamento do HC do
ex-presidente Lula, em 2018. O senhor tinha acabado de assumir como Ministro da
Segurança Pública, saindo da pasta da Defesa. O senhor ficou sabendo desse
tuíte antes? Como foi essa história? O senhor ficou
sabendo de que haveria algum posicionamento por parte do general Villas Boas?
Jungmann - Não soube e nem caberia. Eu deixei o
Ministério da Defesa no dia 27 de fevereiro de 2018 e o tuíte, se eu não me
engano, foi no dia 8 de abril ou alguma coisa assim (o tuite de Villas Bôas foi
publicado em 3 de abril). Então a cadeia de comando já não passava por mim de
forma alguma.
Eu sou um admirador
e tenho uma grande amizade com o ex-comandante Villas-Bôas, um amigo que
considero pessoal. Mas acho que o tuíte, embora eu entenda as razões que ele
apresenta a esse respeito e acho que são ponderáveis, mas acho que não é a
forma adequada.
Eu defendi aqui
exatamente que as Forças Armadas permanecessem focadas em seus aspectos
profissionais e em linha com a Constituição. Eu acho que, em que pese as
preocupações, em que pese o clima que estava vivendo, em que pese eu reconhecer
que o general Villas Bôas é um democrata, mas aquilo não é a forma mais
adequada de se, digamos assim, de exercer o exercício de pressão sobre uma
Suprema Corte, o que é, repito, é inadequado.
Se ele me
consultasse, o que não ocorreu nem ocorreria, porque, dada nossa amizade, ele
iria me preservar, eu teria procurado dissuadi-lo. Mas veja, tenho convicção
que outro fosse o resultado do julgamento, ele seria integralmente respeitado.
BBC News Brasil - No livro onde o
general conta sobre o tuíte, ele fala que houve participação do Alto Comando do
Exército, não foi o general sozinho que tuitou. Na época, o senhor declarou que
"a fala do general foi no sentido da serenidade e do respeito à
Constituição e às regras, o que é correto". O senhor continua mantendo essa
avaliação, sabendo que foi o Alto Comando que planejou esse tuíte?
Jungmann - Em primeiro lugar, é preciso entender o
seguinte: a decisão é do comandante e ela é intransferível, porque foi ele que
o publicou. Se ele chegou a ouvir, como está dentro do livro e não nos cabe
duvidar, pode ter sido uma atitude, digamos, mais formal.
De todo o jeito, é
uma atitude que considero que não é adequada para a necessária separação que
tem que existir entre instituições. Nós estamos aqui falando de um outro poder,
que é o Poder Judiciário, e ao mesmo tempo do não envolvimento do Exército e
das Forças Armadas em questões tópicas, em questões de governos, na medida que
são instituições do Estado.
BBC News Brasil - O senhor foi o
último civil a ocupar o cargo de ministro da Defesa e, para muitos analistas, o
controle civil das Forças Armadas é fundamental para a democracia. O senhor
concorda com isso, acha que é melhor um civil controlar as Forças Armadas?
Jungmann - Olha, o grande controle a ser exercido pelas
Forças Armadas se dá através dos órgãos de controle e, particularmente, através
do Congresso Nacional e, no caso de conflito, pelo Judiciário.
Eu já fui adepto da
tese de que o Ministério da Defesa deveria permanecer apenas nas mãos dos
civis. Mas o controle deve sobretudo não prescindir de duas coisas: que o poder
político civil tenha liderança e projeto para as Forças Armadas, e não existe
isso, sobretudo na área da Defesa. Nosso poder político não exerce a sua
liderança e tampouco tem demonstrado apetite por projetos para a defesa
nacional.
No meu
entendimento, é muito frágil você dizer "o controle depende de um
civil". Você pode botar um civil lá, vamos supor uma situação absurda, que
seja simplesmente uma marionete, que não tenha nenhum poder, não, não é isso.
O controle efetivo
dos órgãos do Executivo está na mão do Congresso, só que o Congresso não exerce
isso. No início, confesso a ti, eu entendia que deveria continuar a linhagem
civil, mas depois melhor refletindo, eu vejo que nações democráticas colocam
(militares no comando).
Eu estive, por
exemplo, com o secretário de Defesa durante o governo Trump, o Jim Mattis, e
ele é um ex-fuzileiro. Você teve mais até que Secretário de Defesa, você teve o
secretário de Estado, o Colin Powell (ex-general que comandou o Departamento de
Estado dos EUA entre 2001 e 2005). E alguém coloca em dúvida o controle civil
sobre as Forças Armadas dos Estados Unidos? Ninguém coloca.
Então a questão não
é tanto por aí. A questão, para mim, tem dois níveis: primeiro, o poder
político civil não exerce suas prerrogativas na área de Defesa e também nas
Forças Armadas. Em segundo lugar, um problema mais abaixo, que é o seguinte: o
Brasil talvez tenha o único Ministério da Defesa do mundo em que você não tem
um especialista civil, um gestor civil, de carreira, atuando.
Você não tem
parlamentares que hoje dialogam e entendam sobre as Forças Armadas. Pode ter um
ou outro perdido entre 513. Me lembro de ir, enquanto Ministro da Defesa, em
audiências públicas e confesso, eu percebia no debate o desconhecimento ou
distanciamento que existia. Como é que você quer liderar?
Então, essa é a
minha visão: pode ter ministro civil, pode ter ministro militar, mas tem que
ter uma grande base civil, com capacidade técnicas e científica lá dentro,
participando desse processo e você precisa sobretudo que o Congresso Nacional
assuma o seu papel, e ele não vem exercendo isso.
© Getty Images Piero Leirner afirma que desde 2014 percebe
uma 'série de intervenções feitas por militares e a construção de uma rede de
outros agentes públicos que agiu em cooperação com eles'.
BBC News Brasil - Semana passada
tivemos uma reviravolta política, o ministro do STF Edson Fachin acabou por
anular as condenações do ex-presidente Lula. Na Folha de São Paulo uma
reportagem afirmava que os militares viram com reserva o discurso do ex-presidente
Lula depois da anulação. Eles teriam dito que podem ter dificuldade de relação
com o presidente caso Lula venha a ser eleito em 2022. O senhor acha que pode
ocorrer um problema nesse sentido?
Jungmann - Olha, se em 2022, o Mandetta, o Huck, o
Doria, o Moro ou o próprio Lula, chegarem ao poder, eu posso lhe assegurar que
da parte das Forças Armadas não terão qualquer impedimento ou dificuldade para
governar.
Dentro das Forças
Armadas existem, sim, aqueles que são antipetistas, como há aqueles que também
tem a outra opção e são petistas, socialistas ou liberais, ou conservadores.
Enfim, isso está tudo representado lá dentro.
Mas, eu posso dizer
que hoje é consolidado o sentimento, até porque já viveram o governo Lula
anteriormente.
O governo do PT
durou 14 anos, infelizmente terminou como terminou, mas a verdade é que é no
governo Lula que acontecem duas coisas importantes para as Forças Armadas. Em
primeiro lugar, foi a edição de uma política e de uma estratégica nacional de
Defesa.
E, além disso, é
reconhecido que é desse período, que foi um período economicamente muito mais
folgado, que houve um grande investimento na modernização e atualização das
nossas Forças.
Então, eu digo isso
como alguém que fez oposição ao governo do PT durante 14 anos, mas tem que
reconhecer as coisas que de fato aconteceram e é isso que a gente tem a narrar.
Eu não vejo maiores
problemas, seja com Lula, seja com quem for que chegue lá, o Mandetta, o Moro,
o Huck e, evidentemente a continuidade do Bolsonaro. Serão recebidos da mesma
forma, em linha com a Constituição.
BBC News Brasil - O general da
reserva Luiz Eduardo Rocha Paiva escreveu que "aproxima-se o ponto de
ruptura" após a anulação das condenações de Lula. O senhor não vê isso
como refletindo o que se pensa dentro das Forças Armadas ativas hoje?
Jungmann - Militares que estão na reserva usualmente têm uma
visão em boa medida da Guerra Fria, do combate ao comunismo, da subversão e
tudo mais, da política de segurança nacional e tal. São homens que deram e
contribuíram pra nação e para pátria, mas permanecem ainda imersos em um clima
que já não existe mais, que já não faz mais sentido.
De um modo geral, a
reserva é assim. Ela fica numa posição, digamos assim, pré-queda do Muro de
Berlim e às mudanças todas que o mundo teve, inclusive o próprio processo de
redemocratização. Na reserva é comum, por exemplo, que não se aceite que as
Forças Armadas não tenham um papel moderador, não tenham mais o papel de tutela
e tudo mais que tinham no passado. Então eu acho que isso é a expressão de um
pensamento que já não é o pensamento das Forças Armadas.
Não quero dizer que
não existam lá dentro militares que pensem assim, mas a cúpula, as escolas de
formação, esses oficiais superiores, já não são inclinados ou se deixam levar por esse tipo de percepção.
Eles pensam muito mais na profissão e no respeito à democracia.
BBC News Brasil - Sobre seu período
como ministro extraordinário da Segurança Pública (2018-2019), surgiu no
contexto das mensagens vazadas entre o ex-juiz Sergio Moro e a Força Tarefa da
Lava-Jato um diálogo do procurador Deltan Dallagnol em que ele diz que a
ministra do STF Carmen Lúcia teria ligado para o senhor no episódio da guerra
de liminares que quase libertou o presidente Lula, em 2018. Ele teria dito para
o senhor que o Lula não deveria ser libertado. O senhor se envolveu de alguma
forma nessa ação?
Jungmann - No dia que eu chamo de "prende-solta" do
Lula, que teve duas ordens para soltar e duas ordem para prender,
alternadamente, eu recebi ligações de todo mundo, de formadores de opinião, de
pessoal de comunicação, de editor, de autoridade, ministro, o próprio
presidente da República ligou e pediu que o mantivesse informado do que estava
se passando.
Um dos telefonemas
que eu recebi, foi exatamente da ministra Cármen Lúcia para pedir informações:
"Jungmann, como é que tá isso? Como é que tá acontecendo?". Eu narrei
tudo o que estava acontecendo, o conflito que estava se dando e, evidentemente,
a dificuldade que tem a Polícia Federal, executora da ação judicial, de lidar
com essa situação. E em seguida, ela me disse: "Eu vou soltar uma nota
sobre isso. Eu estou preocupada", e eu disse: "Faça isso, senhora
presidente". E nada mais trocamos.
Então, eu vou
repetir o que eu disse quando me fizeram pela primeira vez essa pergunta: isso
é uma mentira. Repito: é uma mentira. Não houve esse diálogo. A ministra é uma
juíza e sabe que se ela assim procedesse, estaria incorrendo no crime de
obstrução da Justiça. Se eu, porventura, recebesse - que não recebi - esse
pedido, eu estaria incorrendo em obstrução de Justiça, o que obviamente não
fiz.
Por isso mesmo, eu
resolvi interpelar o senhor Deltan Dallagnol para que ele confirme e desminta
isso, porque não faz nenhum sentido. Não houve nada disso de parte da ministra
Cármen Lúcia, que então presidia o Supremo, e da minha parte.
Pelo amor de Deus,
quando a Polícia Federal está trabalhando junto ao Judiciário, o ministro da
Segurança Pública e da Justiça não tem poder nenhum, está se passando em outro
poder. A Polícia Federal trabalha de mãos dadas com o Judiciário e quem poderia
autorizar ou solicitar isso é exatamente o juiz da questão, o juiz do caso.
A mim não caberia e
tampouco à senhora presidente do Supremo nenhuma ação, senão estaríamos
cometendo um crime de obstrução de Justiça, o que nem ela e nem eu cometemos.
EM TEMPO: O objetivo de Bolsonaro é armar a Milícia e os simpatizantes do governo que possam algum dia matar os adversários do governo.
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