Por Leonardo Godim
Euforia na esquerda,
ambiguidade no “Centrão”, pragmatismo entre os capitalistas e silêncio nos
quartéis.
No auge de mortes na
pandemia do coronavírus, que chega hoje à média móvel de 1840 pessoas, a
anulação das condenações contra o ex-presidente Lula e a reconstituição de seus
direitos políticos reordenaram a correlação das forças. O auge da crise da
dominação política bolsonarista se precipita sobre o país, que caminha a passos
largos para o colapso sanitário total.
Em seu discurso na
manhã da quarta-feira (11) na sede do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, Lula
demarcou suas posições como líder do maior partido de oposição a Jair
Bolsonaro. Em clima de euforia, o PT retoma um lugar de destaque tanto na atual
oposição como em uma futura disputa eleitoral. Basta agora saber o que farão
com isso. A direção nacional da sigla se reunirá essa semana, e deve discutir a
agenda para 2021 que, na opinião de Breno Altman, jornalista filiado ao PT,
apostará na mobilização.
A reação foi quase
instantânea. Seja pelo insustentável agravamento da pandemia ou pela pressão do
pronunciamento de quarta-feira, Bolsonaro já no dia seguinte recuou em sua
postura negacionista e prometeu vacinas. Uma semana depois, demitiu o ministro
militar da saúde Eduardo Pazuello, duramente criticado pela condução do combate
à COVID-19. A pressão internacional também aumentou pelo medo de que o Brasil
seja “celeiro” de novas variantes, ainda mais fatais, do coronavírus. Ainda
negacionista da boca para fora, Jair Bolsonaro se movimenta para que seu
governo não vá, como milhares de brasileiros, para a UTI.
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Ao “Centrão” coube
garantir que tudo pode acontecer, inclusive nada. O aceno de Rodrigo Maia a uma
possível aliança com o Partido dos Trabalhadores soa como uma confissão de que
seus planos foram varridos pela reaparição de Lula. Até então, Maia era a maior
expectativa para projetar uma candidatura de direita, vinculada ao projeto
neoliberal da burguesia brasileira, em oposição a Bolsonaro. Com Lula, uma terceira
via terá dificuldades para ir mais longe do que foi Geraldo Alckmin em 2018.
Esse “Centrão”, que representa o fisiologismo e a balcanização da política de
várias frações da classe dominante, se vê novamente obrigado a tomar posição em
uma polarização já colocada. A última eleição na Câmara dos Deputados nos
indica que, por enquanto, romper com Bolsonaro está – para esse fluido e
pantanoso campo político – apenas no campo das intenções.
É importante contrastar a posição de Maia com a de um dos porta-vozes dos industriais paulistas, que representam, depois dos grandes bancos, da agropecuária e do extrativismo, um dos principais setores monopolistas da economia brasileira. Paulo Skaf, presidente da Federação dos Industriais de São Paulo, comemorou a aliança entre Lira e Bolsonaro. Além de defender um auxílio emergencial mantendo “responsabilidade fiscal” – isto é, orçamentos congelados, “enxugando o Estado” – defende “1) simplificar o sistema de impostos; 2) desonerar completamente os investimentos e também as operações de exportação; 3) acabar com a guerra fiscal entre estados; 4) diminuir burocracia e o custo do pagamento de impostos e 5) nunca, em hipótese alguma, permitir qualquer aumento da carga tributária, pelo contrário: devemos ter como meta uma redução gradativa de impostos.”
Apesar dos performáticos atritos, frações importantes
do capital seguem na base de Bolsonaro e ainda veem seu fim de governo como a
janela para implementar suas (contra)reformas administrativa e tributária.
Entre os generais, silêncio.
Desde que Lula fez seu discurso, a ordem de silêncio impera na caserna e apenas
os senhores do Clube Militar puderam destilar seu velho reacionarismo,
declarando que “aproxima-se o ponto de ruptura”. As recentes declarações sobre
a articulação de Estados-Maiores e famílias de generais no golpe que levou ao
impeachment de Dilma Rousseff e à prisão de Lula levantaram hipóteses sobre até
que ponto foi ocasional a entrada massiva de militares no governo e sua
permanência como pilar de sustentação após sucessivas crises.
A crise do
bolsonarismo recoloca a crise política brasileira no crepúsculo das incertezas.
Por mais forte que seja a tendência de isolamento da extrema direita
internacionalmente, a ausência de alternativas à direita do petismo pressiona por
uma recomposição do pacto social com o PT no governo, ou a radicalização pela
direita – que passa necessariamente por Bolsonaro ou pelas Forças Armadas.
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