Campanha Nacional pelo Direito à Educação
Yahoo Notícias, 20 de julho de 2020
Marcelo Camargo/Agência Brasil
Usar recursos do Fundeb para
mecanismos de transferência de renda é inadmissível pela maioria dos Tribunais
de Contas; 70% de recursos do Fundeb para pagamento de profissionais da
educação não é muito; e, sim, é necessário ampliar o complemento federal no
Fundeb para 20%, pois aumenta-se a equidade de redistribuição do fundo.
Essas são algumas das evidências destacadas pela Fineduca (Associação Nacional
de Pesquisa em Financiamento da Educação) na Nota Técnica “Não é hora de retroceder no Fundeb!”, que responde a falácias
divulgadas recentemente, no contexto de pressão do governo Bolsonaro e de
grupos empresariais para alterar o texto do Novo Fundeb (PEC 15/2015) e
torná-lo menos eficiente para minorar desigualdades educacionais.
O texto de relatório de substitutivo
da Deputada Professora Dorinha Seabra Rezende (DEM-TO), aprovado por Comissão
Especial e prestes a ser votado hoje (20) no plenário da Câmara dos Deputados,
tem o apoio da Fineduca e da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, assim como
de diversas outras movimentos e entidades como Undime
(União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação), Uncme (União Nacional
dos Conselhos Municipais de Educação), CNTE (Confederação Nacional dos
Trabalhadores em Educação), Consed (Conselho Nacional de Secretários de
Educação), Mieib (Movimento Interfóruns de Educação Infantil do Brasil), entre
outras, para renovar o principal fundo da educação e torná-lo mais robusto (com
mais recursos de complementação da União, constitucionalização do CAQ e
redistribuição mais equitativa).
Em entrevista, a presidente da Fineduca, Nalú Farenzena, comenta as falácias desmentidas na Nota Técnica. Também
destacamos o que diz o sumário executivo da NT sobre cada uma das falácias.
Primeira falácia:
70% para profissionais da educação é muito
Nalú Farenzena: “Defendemos que, sim, é necessário que sejam
alocados no mínimo 70% para os profissionais da educação. Mostramos que isso
não é muito porque é mais do que isso que tem sido aplicado para pagamento de
profissionais da educação no âmbito já existente”.
Nota Técnica: O Fundeb não financia o total de gastos com educação.
Então, não se trata de 70% do total de gastos, mas sobre uma parte dele. Na
metade dos municípios brasileiros, em 2017, dados do SIOPE/FINBRA mostram que o
Fundeb representa 71% da receita destinada à educação. Com isso, 70% do Fundeb,
representa, na verdade, menos de 50% do gasto total, um índice claramente
baixo, tendo em vista que a área é intensiva em pessoal e exige elevados
índices de gasto com professores e funcionários.
Segunda falácia: Não é necessário
ampliar o complemento federal no Fundeb para 20%
Nalú Farenzena: “O aumento da complementação da União para 20% é
necessário, pois isso amplia a equidade dentro do fundo.”
Nota Técnica: O aumento da complementação “ampliará a complementação
para 26 estados da federação e 2.970 municípios (+73%)”; “beneficiará
majoritariamente as crianças, jovens e adultos mais pobres” e “beneficiará
majoritariamente as escolas das redes públicas com menor desempenho no Ideb.”
Terceira falácia: os estados “perdem”
com o Fundeb
Nalú Farenzena reitera o que está posto na Nota Técnica: “O Fundeb
e seu antecessor, o Fundef, são instrumentos redistributivos de recursos que
beneficiam os entes com mais matrículas e com menos recursos, portanto, os
governos estaduais não perdem com o Fundeb, mas sim redistribuem recursos a
municípios, os quais estão prestando diretamente serviços que são também da
responsabilidade dos estados.”
Quarta falácia: tendência de redução do
número de alunos da educação básica
Nalú Farenzena: “Ainda há necessidade de expansão da educação
escolar. A tendência da redução do número de alunos não se confirma se
confrontada com as metas ainda pendentes de implementação do Plano Nacional de
Educação.”
Nota Técnica: “Embora tenha havido redução no quantitativo nos
últimos anos – 8,6% a menos de 2007 para 2018 – o déficit de cobertura revela a
desproteção do direito à educação de 3,3 milhões de crianças e jovens de zero a
17 anos, considerando as metas do PNE. Esse déficit pode chegar a 8,9 milhões,
se considerarmos os 5,6 milhões de jovens e adultos de 18 a 24 anos que não
concluíram a educação básica e não frequentam escola. Tal déficit pode ser
exemplificado pelo não atingimento de metas do Plano Nacional de Educação (PNE)
2014-2024.”
Quinta falácia: – Percentual de
complementação da União para os recursos do Fundeb para transferência direta de
renda para as famílias
Nalú Farenzena: “Contestamos também a destinação de um percentual
de complementação da União para transferência de renda das famílias. Essa não é
uma despesa de manutenção e desenvolvimento do ensino. Defendemos que o Fundeb
permaneça como um fundo que financia a educação básica pública, no sentido do
seu fortalecimento e do atendimento igualitário e equitativo para educação brasileira.
É inadmissível a proposta do Governo Federal, de que se utilize recursos do
Fundeb para pagamento de inativos e pensionistas. Isso é despesa de assistência
social. Há vários anos, a maioria dos Tribunais de Contas do país não admite
essas despesas como manutenção e desenvolvimento do ensino. Portanto, o que
está previsto no substitutivo da Deputada Professora Dorinha, de vedar a
utilização de recursos da MDE e do Salário-Educação para pagamentos, é
totalmente pertinente à legislação brasileira.”
Nota Técnica: “A ‘transferência direta de renda para as famílias’
não poderia ser configurada como manutenção e desenvolvimento do ensino. Além
disso, não está previsto tal procedimento no Artigo 70 da LDB, que define o que
deve ser considerado como aplicação de recursos em manutenção e desenvolvimento
do ensino.”
Sexta falácia: O governo diminui os
recursos para pagamento de profissionais, pois prevê a utilização do Fundeb
para pagamento de inativos e alteração dos limites de subvinculação
Nalú Farenzena reitera a Nota Técnica: “Ao possibilitar tal
pagamento (embora sejam despesas de previdência social), poderá reduzir ainda
mais os recursos destinados aos profissionais que estão na ativa.”
Sétima falácia: O governo exclui o CAQ
(Custo Aluno-Qualidade) da PEC
Nalú Farenzena: “A proposta de exclusão do CAQ é inadmissível. O
CAQ é um mecanismo bastante desenvolvido, indispensável para que se garanta a
redução das desigualdades das condições de oferta da educação. A Campanha
Nacional pelo Direito à Educação tem trabalhado há anos, cientificamente, na
elaboração da proposta do CAQ, que está previsto no PNE. É um mecanismo que
garante, de fato, qualidade e controle, e precisa ser constitucionalizado.”
Nota Técnica: “A definição de Custo Aluno-Qualidade (CAQ) é urgente
em nosso país para a redução das desigualdades das condições da oferta
educação. A garantia das condições de qualidade é parte fundante do direito à
educação, expresso na Constituição Federal, LDB e em outras importante leis,
como o PNE de 2014 e Lei do Piso Salarial Profissional Nacional para os
Profissionais do Magistério Público da Educação Básica de 2008. O CAQ é a única
forma de garantir o controle do recurso destinado à educação, pois ele vincula
o financiamento à presença de recursos nas escolas e à valorização dos
profissionais.”
Oitava falácia: O governo adia a
efetividade do novo Fundeb
Nalú Farenzena: “Há urgência de promoção de mais equidade na
educação. É inaceitável o atraso que existe no atendimento das metas do PNE.
Portanto, adiar a implantação do novo Fundeb para 2022 é
totalmente injustificável.”
Nota Técnica: “Entre outros motivos, os inaceitáveis atrasos no
atingimento das metas do PNE e a urgência de promoção de mais equidade na
educação atestam que o adiamento é totalmente injustificado”.
EM TEMPO: Na realidade o governo federal contribui com 10% e os 90% restante dos recursos ficam a cargo dos estados e municípios. A proposta do governo consiste em não aumentar a contribuição federal dos 10% e ainda abocanhar uma fatia de cerca de 6 bilhões de reais para serem aplicados no Programa Renda Brasil, substituto do Bolsa Família. Cabe aos parlamentares não aprovarem a receita governamental. Agora durmam com essa bronca.
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