DW - Astrid Prange (lpf)
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Anholete
Forma como Bolsonaro enfrenta a crise
do coronavírus impulsiona vertiginosamente processo de deterioração da
reputação brasileira. Imprensa europeia pinta cenário catastrófico, e parcerias
importantes estão sob risco.
É gritante o contraste entre a imagem atual do Brasil e a que tinha há uma década, quando era aclamado mundo afora por sua economia promissora, com a revista britânica The Economist estampando em sua capa uma imagem do Cristo Redentor decolando como um foguete. O país estava prestes a superar a França e assumir o posto de quinta maior economia do mundo. Nesse meio tempo, caiu para a 12ª posição.
"O Brasil
estragou tudo?", questionava a Economist já em 2013,
trazendo a crise no maior país latino-americano como manchete. Naquele momento,
no entanto, ainda era difícil prever a dimensão do declínio brasileiro que
estava por vir.
Apesar da crise
econômica, o Brasil se apresentou para o mundo como país-sede da Copa do Mundo
de 2014 e dos Jogos Olímpicos de 2016, mostrando-se cada vez mais
autoconfiante. Durante os governos Fernando Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula
da Silva e Dilma Rousseff, o país conquistou prestígio no cenário internacional.
O país chamou
atenção sobretudo por seu bem-sucedido combate à pobreza por meio de programas
sociais como o Bolsa Família, que ajudaram cerca de 30 milhões de brasileiros a
ascender à classe média. Há dez anos, o jornalista alemão Alexander Busch, que atua
como correspondente no Brasil, resumiu o clima de euforia em seu livro
intitulado Brasil, país do presente - O poder econômico do gigante
verde.
Agora, a euforia
definitivamente chegou ao fim. E não apenas devido à crise econômica e aos
escândalos de corrupção que vieram à tona nos últimos anos. Se desde que tomou
posse o presidente Jair Bolsonaro já vinha contribuindo para um derretimento da
imagem do Brasil na Europa, sendo criticado por ameaçar a democracia e o meio
ambiente, a maneira como vem lidando com a pandemia de covid-19 vem acelerando
vertiginosamente esse processo de deterioração da reputação brasileira.
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"A imagem
positiva acabou", afirma Friedrisch Prot von Kunow, presidente da
Sociedade Brasil-Alemanha (DBG, na sigla em alemão) e que foi embaixador no
Brasil entre 2004 e 2009. Atualmente, o diplomata não vê progressos sociais no
Brasil, mas sim um cenário catastrófico. "Do ponto de vista alemão, uma
personalidade como Bolsonaro é inconcebível. Pessoalmente, tenho dificuldade em
lidar com isso."
Acordo Mercosul-UE
e meio ambiente
Assim como o
presidente americano, Donald Trump, Bolsonaro ameaça abandonar o Acordo de
Paris para o clima e a Organização Mundial da Saúde (OMS), e a gestão da atual
pandemia vem contribuindo para isolar ainda mais o Brasil no cenário
internacional.
"Na crise do
coronavírus, Bolsonaro vem se mostrando ainda mais radical que Trump",
afirma Oliver Stuenkel, professor de Relações Internacionais na Fundação
Getúlio Vargas (FGV). "Com isso, a ratificação do acordo de livre-comércio entre o
Mercosul e a União Europeia (UE) fica cada vez mais
improvável", escreveu no Twitter recentemente.
A destruição da
Amazônia também vem rendendo duras críticas ao governo brasileiro. Na última
quinta-feira, Georg Witschel, embaixador da Alemanha no Brasil, disse ao portal
G1 que o desmatamento na região – que, segundo o Inpe, cresceu 34,4% entre agosto de 2018
e julho de 2019 em relação ao período anterior – torna a
ratificação do tratado "cada vez mais difícil".
Para ter validade,
o acordo Mercosul-UE, que foi assinado na cúpula do G20 em junho de 2019, tem
que ser aprovado pelos parlamentos de todos os países de ambos os blocos.
"Precisamos do apoio do Brasil, e o apoio é a redução do
desmatamento", afirmou o embaixador alemão.
No início de junho,
o jornal britânico The Guardian publicou um editorial
manifestando preocupação com o avanço da destruição da Amazônia durante a
pandemia. "O mundo não pode permitir que a pandemia de coronavírus
distraia da destruição da floresta tropical", diz o texto.
"Enquanto
Bolsonaro continua a atacar medidas de saúde pública, a população indígena da
região amazônica parece estar cada vez mais ameaçada pela violência e pela
doença", diz o jornal.
Devido às políticas
do governo Bolsonaro para o meio ambiente e ao aumento do desmatamento na
região amazônica, Alemanha e Noruega se distanciaram do Brasil, congelando no
ano passado seus repasses para o Fundo Amazônia. O Ministério alemão do
Desenvolvimento vem encerrando projetos no país.
Indústria alemã
avalia permanência
A indústria alemã no Brasil também vem sofrendo com o derretimento da imagem brasileira. "Não há dúvida de que o Brasil e a América Latina ficaram menos atrativos", disse Philipp Schiemer, presidente da Mercedes-Benz do Brasil, em entrevista ao jornal econômico alemão Handelsblatt na semana passada.
Ao ser questionado
sobre a atuação do governo Bolsonaro diante da pandemia do novo coronavírus,
Schiemer afirmou que a gestão da crise "deixa a desejar" e que
"as constantes disputas políticas são uma fonte adicional de
incerteza". "Com isso, a credibilidade do Brasil é prejudicada",
disse.
Apesar de elogiar o
fato de o governo ter agilizado o auxílio financeiro para os mais pobres e
flexibilizado as leis trabalhistas de modo a evitar demissões em massa,
Schiemer critica que disputas políticas tenham voltado a ocupar as autoridades
e diz que gostaria que o governo dedicasse mais energia a implementação de sua
agenda de reformas econômicas.
Em análise para
o Handelsblatt, o correspondente Alexander Busch afirma que a crise
do coronavírus e Bolsonaro são "uma combinação que acaba com o espírito empreendedor
até mesmo dos maiores otimistas" e que médias empresas alemãs, duramente
atingidas pelos efeitos da pandemia, se perguntam se vale a pena continuar no
Brasil.
Ameaças à democracia e à saúde
Desde o início do
governo Bolsonaro, editoriais dos principais jornais europeus vêm denunciando
ameaças à democracia no Brasil. No último dia 7 de junho, o britânico Financial
Times afirmou que, em meio à crise provocada pelo coronavírus e à
queda na popularidade de Bolsonaro, "os brasileiros estão preocupados com
a possibilidade de o presidente estar tentando provocar uma crise entre o
Executivo, o Legislativo e o Judiciário para justificar uma intervenção
militar".
Apesar de afirmar
ser improvável que as Forças Armadas apoiem um golpe militar, o jornal aponta:
"Outros países devem tomar nota: os riscos para a maior democracia da
América Latina são reais, e estão aumentando."
Em meados de maio,
foi a vez do jornal francês Le Monde, que escreveu que o governo
brasileiro adotara uma via "extremamente perigosa" e que a postura do
presidente causa "caos na saúde e semeia a morte". Para o diário,
"há algo de podre" no país. "O Brasil de Bolsonaro habita um
mundo paralelo", dizia o texto.
No fim de maio,
após a divulgação do vídeo com trechos de uma infame reunião ministerial em 22
de abril, o espanhol El País também havia destacado em
editorial que "as ameaças à separação de poderes ali lançadas por alguns
ministros são inadmissíveis" e que "o rosário de insultos emitidos
pelo presidente é uma afronta intolerável às instituições".
A "gestão
errática da pandemia e uma grave crise político-institucional com flertes com
golpes de Estado", diz o jornal, "além de ser muito grave, desvia a
atenção numa altura em que a luta contra o coronavírus deveria ser a prioridade
de toda a classe política brasileira".
Num veemente editorial intitulado
Covid-19 no Brasil: "E daí?", a revista
científica britânica The Lancet escreveu no dia 8 de maio que
"talvez a maior ameaça à resposta do país à covid-19 seja seu presidente,
Jair Bolsonaro" e que a liderança do Brasil perdeu seu compasso moral – se
é que jamais teve algum".
Desde então, o
Brasil perdeu seu segundo ministro da Saúde em menos de um mês e viu o número
de mortos por covid-19 saltar de 5 mil para mais de 43 mil, sendo atualmente o
segundo país com mais óbitos em decorrência da doença.
A Deutsche Welle (DW) é a emissora
internacional da Alemanha e produz jornalismo independente em 30 idiomas.
EM TEMPO: Enquanto a maioria da população brasileira for despolitizada e conservadora, sempre correremos o risco de elegermos políticos despreparados, arrogantes, fascistas e genocidas para participarem dos poderes legislativos e executivos do país. A saída mais simples consiste na renúncia de Bolsonaro e no desembarque dos militares, especialmente os do Ministério da Saúde. Agora durmam com essa bronca.
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