Bolsonaro e os militares. Foto: Fernando Souza/AFP |
A
participação do ministro da Defesa em ato político rompe o apartidarismo dos
militares.
Veja.com - Por Thomas
Traumann
A presença do ministro da Defesa, general Fernando
Azevedo e Silva, ao lado do presidente Jair Bolsonaro no helicóptero que
sobrevoou a manifestação pró-ditadura na Praça dos Três Poderes, em Brasília,
neste domingo, 31, é um ponto de inflexão nas relações das Forças Armadas com a
política partidária.
Chefe direto dos comandantes do Exército, da Marinha e da
Aeronáutica, o general deveria simbolizar a fronteira entre as diretrizes de
curto e médio prazo legitimadas pelas urnas e a política de Estado, que
ultrapassam os tempos dos mandatos. Ao servir de acólito do presidente em uma manifestação
abertamente partidária e intrinsecamente a favor da intervenção militar no
Judiciário e no Legislativo, Azevedo e Silva rompeu este limite.
O capitão Jair Bolsonaro tem mais
ministros militares que qualquer governo anterior, incluindo os dos generais do
regime ditatorial. Hoje, além do presidente e do vice, nove dos 22 ministros do
governo são egressos das Forças, incluindo o general da ativa Eduardo Pazuello,
que ocupa interinamente o Ministério da Saúde. São mais de 2.500 militares com
gratificações e cargos de confiança – um recorde para qualquer tempo. Não é uma
ocupação com respaldo na sociedade. Segundo a última pesquisa do Datafolha, 52%
dos brasileiros são contra a presença fardada no poder político.
O presidente se apropria da imagem das
Forças Armadas para poder governar e intimidar. Quando tem um problema, nomeia
um general. Assim, ao mesmo tempo reparte a sua responsabilidade de escolha com
as Forças, tomando para si a credibilidade da instituição. Se der errado, ele
acredita que não apanha sozinho.
Esta tática está sendo usada com
péssimos resultados no Ministério da Saúde. Os mais de vinte militares que
ocupam os principais cargos da pasta têm experiência em logística e
conhecimentos nulos em epidemiologia. Pessoas erradas no lugar errado no pior
momento. Quando a pandemia se for e as famílias das dezenas de milhares de
brasileiros mortos por Covid-19 forem procurar os culpados, os seus dedos vão
apontar Bolsonaro, alguns governadores e, agora, também os militares que
aceitaram uma missão para a qual não tinham capacidade.
Tão grave para a reputação da Força é a
licença que Bolsonaro se permite para ameaçar outras instituições, mídia e
adversários como espantalho do golpe militar. É fato que Bolsonaro convenceu a
metade do Alto Comando do Exército de que existe um complô de ministros do STF,
líderes do Congresso e empresários para impedi-lo de governar. A solidariedade
desses militares com o que consideram uma perseguição ao presidente, no
entanto, está se transformando em uma relação abusiva. Bolsonaro usa os
militares como se fossem sua milícia, sua tropa particular para impedir vozes
contrárias.
É preciso aprender com a história.
Quando deixaram o governo com João Figueiredo em março de 1985, a imagem das
Forças Armadas estava no chão. Eram os culpados diretos pela falência do
Brasil, então o país com a maior dívida externa do mundo, inflação chegando a
200% ao ano e desigualdade social recorde. Foram necessárias décadas de
trabalho sereno para as Forças recuperarem sua imagem junto à população. Essa
reputação já se deteriorou nesses 500 dias de administração Bolsonaro. Quando
Bolsonaro se for, a conta de ter apoiado de corpo e alma um governo tão
incompetente cobrará o seu preço.
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