(Foto: Zanone Fraissat/Folhapress) |
WÁLTER NUNES
***FOTO DE
ARQUIVO***SÃO PAULO, SP, 17.01.2020 - O ex-presidente Lula durante reunião do
diretório nacional do PT (Partido dos Trabalhadores), em São Paulo.
SÃO PAULO, SP
(FOLHAPRESS) - Quatro dias antes de Sergio Moro anunciar sua saída do
Ministério da Justiça, uma secretaria vinculada à pasta que ele comandava negou
à defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva acesso a documentos de uma
colaboração internacional informal. Esses papéis teriam sido usados em processo
da Lava Jato em que o petista foi condenado pelo crime de corrupção.
A decisão
negativa foi assinada no dia 20 de abril por Vladmir Pereira Passos, secretário
Nacional de Justiça. Passos era desembargador do Tribunal Regional Federal da
4ª Região e foi indicado ao cargo por Moro. Após a saída do ex-ministro, Passos
publicou nas redes sociais a saída da secretaria.
A justificativa
alegada pelo chefe da Secretaria Nacional de Justiça para negar o pedido dos
defensores de Lula é que poderia haver necessidade de sigilo nos documentos
solicitados.
A solicitação de
acesso a uma colaboração informal entre autoridades dos Estados Unidos e
investigadores da Lava Jato do Paraná tramita no Ministério da Justiça há quase
dois meses.
Os advogados do
ex-presidente fizeram a primeira solicitação de acesso no dia 16 março junto ao
DRCI (Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica
Internacional), órgão do Ministério da Justiça.
Usaram como base
a Lei de Acesso à Informação e o Provimento 188 do Conselho Nacional da OAB
(Ordem dos Advogados do Brasil), que permite que a defesa de um réu possa
requerer documentos de um processo diretamente dentro de um órgão público, sem
passar pelo Judiciário.
No pedido, os
defensores de Lula citam uma manifestação pública do vice-procurador-geral
adjunto do Departamento de Justiça dos Estados Unidos Kenneth Blanco em que ele
menciona a colaboração informal dos americanos com a Lava Jato de Curitiba.
Os advogados do
petista destacam trechos da fala de Blanco, que afirma que houve colaboração
"na coleta de provas e na construção do caso", se referindo ao
processo contra Lula em que ele foi condenado por receber a promessa de um
tríplex em Guarujá, como propina da empreiteira da OAS, em troca de contratos
com a Petrobras.
"Dado o
relacionamento íntimo entre o Departamento de Justiça e os promotores
brasileiros, não dependemos apenas de procedimentos oficiais como tratado de
assistência jurídica mútua, que geralmente levam tempo e recursos consideráveis
para serem escritos, traduzidos, transmitidos oficialmente e respondidos",
diz Blanco, em trecho destacado pela defesa.
O pedido de Lula
para ter acesso ao material compartilhado dos Estados Unidos com a Lava Jato
foi negado pelo DRCI em 27 de março em decisão assinada por Fabrizio Garbi,
diretor-adjunto do órgão.
Ele é o segundo
na hierarquia do departamento e responde à chefe da instituição, Erika Mialik
Marena, delegada da Polícia Federal de Curitiba que batizou a operação Lava
Jato e investigou Lula. Ela foi nomeada para o cargo por escolha de Sergio
Moro.
A justificativa
apresentada pelo DRCI para não fornecer acesso aos documentos à defesa de Lula
foi a de que não era possível avaliar a necessidade de sigilo do material vindo
do exterior e compartilhar tais informações poderia atrapalhar investigações em
andamento.
Os advogados,
então, recorreram daquela decisão e o caso foi parar na mesa de Vladmir Passos,
secretário nacional de Justiça. Passos também negou o acesso dos advogados ao
documento, concordando com os arrgumentos do DRCI sobre o sigilo.
No dia 29 de
março, a defesa de Lula recorreu da decisão ao ministro da Justiça, André Luiz
Mendonça, que ainda não decidiu sobre o caso.
Procurado pela
Folha, o Ministério da Justiça e Segurança Pública disse que não fornece
informações sobre processos específicos de cooperação jurídica internacional
"haja vista a presença de informações pessoais (Lei nº 12.528/2011) e
outras eventualmente submetidas a hipóteses de sigilo previstas na legislação,
inclusive segredo de justiça (Decreto nº 7724/12)".
Cristiano Zanin,
advogado do ex-presidente Lula, disse que a colaboração informal de autoridades
dos EUA com a Lava Jato é ilegal. "Já conseguimos provar que houve uma
cooperação de autoridades norte-americanas com a Lava Jato no caso do
ex-presidente Lula que não está documentada nos processos e que, portanto, é
ilegal", disse.
"O que
buscamos agora é descobrir exatamente qual foi essa cooperação e todos que
participaram dessa ilegalidade, razão pela qual o Estado brasileiro não pode
nos negar essas informações. Na época das audiências em Curitiba, o então
Sergio Moro impediu que eu fizesse qualquer pergunta sobre o assunto para as
testemunhas e delatores, possivelmente porque ele estava participando dessa
cooperação ilegal com os Estados Unidos, que à época era tratada por alguns,
indevidamente, como teoria da conspiração."
O ministro
Sergio Moro não se manifestou até a conclusão da reportagem.
Lula foi solto
no início de novembro, após 580 dias preso na Polícia Federal em Curitiba,
beneficiado por um novo entendimento do STF (Supremo Tribunal Federal) segundo
o qual a prisão de condenados somente deve ocorrer após o fim de todos os
recursos. O petista, porém, segue enquadrado na Lei da Ficha Limpa, impedido de
disputar eleições.
Lula permaneceu
preso de 7 abril de 2018 a 08 de novembro de 2019 em uma cela especial da
Superintendência da Polícia Federal, em Curitiba. O local tinha 15 metros
quadrados, com banheiro, e ficava isolado no último andar do prédio. Ele não
teve contato com outros presos, que ficavam na carceragem, no primeiro andar.
Lula foi
condenado em primeira, segunda e terceira instâncias sob a acusação de aceitar
reformas e a propriedade de um tríplex, em Guarujá, como propina paga pela
empreiteira OAS em troca de contrato com a Petrobras, o que ele sempre negou.
A pena do
ex-presidente foi definida pelo Superior Tribunal de Justiça em 8 anos, 10
meses e 20 dias, mas o caso ainda tem recursos pendentes nessa instância e,
depois, pode ser remetido para o STF.
Nessa
condenação, Lula já havia atingido em setembro a marca de um sexto de
cumprimento da pena imposta pelo STJ. Por isso, mesmo antes da recente decisão
do Supremo, ele já reunia condições para deixar o regime fechado de prisão.
Ainda neste ano,
porém, o Supremo pode anular todo esse processo do tríplex, sob o argumento de
que o juiz responsável pela condenação, o ex-ministro Sergio Moro, não tinha a
imparcialidade necessária para julgar o petista. Não há data marcada para que
esse pedido da defesa do ex-presidente seja analisado.
Além do caso
tríplex, Lula foi condenado em segunda instância a 17 anos e 1 mês de prisão
por corrupção e lavagem no caso do sítio de Atibaia (SP).
O ex-presidente ainda é réu em
outros processos na Justiça Federal em São Paulo, Curitiba e Brasília. Com
exceção de um dos casos, relativo à Odebrecht no Paraná, as demais ações não
têm perspectiva de serem sentenciadas em breve.
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