terça-feira, 12 de maio de 2020

Bolsonaro ligou troca na PF à família? Aras terá de denunciá-lo. Ou acaba

Imagem: Isac Nóbrega/PR


Reinaldo Azevedo. Colunista do UOL 12/05/2020.

Augusto Aras cumprimenta Jair Bolsonaro: se aconteceu o que consta que aconteceu, denuncia de Aras é inevitável. Ou vem a completa desmoralização.

Se, na reunião ministerial do dia 22 de abril, o presidente Jair Bolsonaro vinculou a substituição de quadros da Polícia Federal à investigação de sua família, aí, meus caros, é "fogo no parquinho". Augusto Aras não terá saída a não ser apresentar denúncia ao Supremo contra Jair Bolsonaro. Ou se desmoraliza e se expõe ele próprio a um eventual processo de impeachment. Nesse caso, só Deus sabe o que pode acontecer. Ou nem tanto: a bola será passada para a Câmara. E o presidente vira um pato manco.

O vídeo foi exibido nesta terça-feira a integrantes da Procuradoria Geral da República e ao ex-ministro Sergio Moro. Bolsonaro teria recorrido ao escorreito e sofisticado verbo "foder" para se referir àquilo que, na sua visão, a PF estaria disposta a fazer com a família dele. Então, concluiu, seria preciso trocar.

Não custa lembrar que, na troca de mensagens por WhatsApp com Sergio Moro, ele relacionava a possível investigação, pela PF, de aliados seus à necessidade de substituir Maurício Valeixo, então diretor-geral.

Vamos lá: uma coisa é Bolsonaro dizer um "quero trocar e pronto, quem manda sou eu". Já seria um tanto delicado uma vez que há a mensagem enviada a Moro. Outra, muitíssimo mais grave, é deixar claro que tem interesse pessoal na troca de nomes. Aí a vaca já está com as duas patas dianteiras no brejo.

Não nos esqueçamos do requerimento de Aras ao Supremo. Ele pede investigação, no que respeita a Bolsonaro,  para o eventual cometimento dos seguintes crimes:

- Coação no curso do processo (Art. 344 do Código Penal): "Usar de violência ou grave ameaça, com o fim de favorecer interesse próprio ou alheio, contra autoridade, parte, ou qualquer outra pessoa que funciona ou é chamada a intervir em processo judicial, policial ou administrativo, ou em juízo arbitral":

- Advocacia administrativa (Art. 321): "Patrocinar, direta ou indiretamente, interesse privado perante a administração pública, valendo-se da qualidade de funcionário";

- Obstrução da Justiça: o procurador emprega essa expressão, mas inexiste na legislação crime com esse nome. A Lei 12.850 trata da obstrução da investigação em crimes praticados por organização criminosa. Está no Art. 2º, § 1º.

- Há ainda falsidade ideológica (Art. 299 do CP): nesse caso, trata-se do uso da assinatura de Moro em ato que era por ele ignorado: a demissão de Valeixo.

Se aconteceu o que consta que aconteceu, bem, não restará outra saída a Aras: terá de denunciar o presidente ao Supremo por coação, advocacia administrativa e obstrução da Justiça. Se não o fizer, não mais será levado a sério por ninguém na melhor das hipóteses para ele. Na pior, pode ser alvo de uma denúncia no Senado, podendo resultar no seu impeachment.

Nota rápida: a situação é delicada para Aras, não é? O homem quer uma vaga no Supremo. Se denuncia Bolsonaro e se este fica no poder, pode dar adeus à indicação. Se não denuncia e é indicado, o risco de levar pau no Senado é gigantesco — com o peso adicional da desmoralização.

Sendo assim, o que vai acontecer agora?

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Se Aras denunciar o presidente, o relator do caso será, porque já é o do inquérito, Celso de Mello. Este terá de enviar um pedido de licença à Câmara para processar o presidente. Se houver os 342 votos necessários, o caso será submetido ao pleno do Supremo. Com seis votos favoráveis à abertura do processo, o presidente terá de se afastar. O STF terá 180 dias para julgá-lo.

Mas existem hoje esses 342 deputados?

Eis o busílis. Bolsonaro está em franco processo de compra do Centrão. Seu governo, como uma unidade, já acabou faz tempo. Aí será a dinâmica da degeneração sem fim até que... encontre o fim. Terá de se entregar sem limites ao "é dando que se recebe". Nesse caso, o apoio das elites econômicas, ainda hoje forte, também se degenera.

Reitere-se: estando lá o que consta que está, a crise não trota, mas galopa.

E, bem..., consta que, na tal reunião, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, um dos quadros do coração de Bolsonaro, defendeu que os ministros do Supremo fossem todos presos. Eis Bolsonaro e eis a turma com a qual ele decidiu governar.

É claro que não poderia dar certo. E, como se vê, já não deu.

Convenham: apostar que isso teria um desfecho virtuoso era puro delírio. Mas aconteceu

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