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Correio Braziliense - Jorge Vasconcellos
O ministro Rogério
Schietti Cruz, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), criticou duramente a
atuação do presidente Jair Bolsonaro frente à crise do novo coronarívus, ao
rejeitar, nesta quarta-feira (20/05), um habeas corpus apresentado contra o
isolamento social em Pernambuco.
O ministro afirmou que, tirando o Brasil
e os Estados Unidos, talvez em nenhum outro país "o líder nacional se
coloque, ostensiva e irresponsavelmente, em linha de oposição às orientações
científicas de seus próprios órgãos sanitários e da Organização Mundial de
Saúde". "Em nenhum
país, pelo que se sabe, ministros responsáveis pela pasta da Saúde são
demitidos por não se ajustarem à opinião pessoal do governante máximo da nação
e por não aceitarem, portanto, ser dirigidos por crenças e palpites que
confrontam o que a generalidade dos demais países vem fazendo na tentativa de
conter o avanço dessa avassaladora pandemia", acrescentou Schietti.
Com o habeas corpus
coletivo submetido ao STJ, a deputada estadual Erica Clarissa Borba Cordeiro de
Moura (PSC-PE) pretendia a concessão de salvo-conduto para que os cidadãos de
Pernambuco pudessem circular livremente, a despeito do Decreto Estadual 49.017,
do último dia 11, que intensificou as medidas de restrição à movimentação de
pessoas para combater a pandemia do novo coronavírus.
Segundo a deputada,
"quarentena ou lockdown é medida somente aceitável em estado de sítio ou
em tempo de guerra". A parlamentar sustentou que o decreto do governador,
ao criar a possibilidade de apreensão de veículos e até mesmo de privação de
liberdade das pessoas, teria violado competência da União, tornando-se
inconstitucional.
Inviabilidade jurídica
Em sua decisão, o
ministro Schietti, relator do processo, citou jurisprudência do STJ e do
Supremo Tribunal Federal (STF) para concluir que o habeas corpus "não é
cabível contra ato de caráter normativo, para discussão de lei em tese e
situações gerais e abstratas, nem é sucedâneo de ação direta de
inconstitucionalidade, sob pena de grave deformação do instituto e inaceitável
desvio de sua função".
Também com respaldo
em entendimento do STF, o ministro considerou que parlamentar estadual não tem
legitimidade processual para representar os interesses coletivos dos supostos
beneficiários do habeas corpus.Segundo o ministro, além de não ter viabilidade
jurídica, o pedido da deputada "parece ignorar o que acontece, atualmente,
em nosso país". Mencionando os números de vítimas da pandemia – 17.971
mortes até terça-feira (19) –, ele ressaltou que Pernambuco é o segundo estado
mais afetado do Nordeste, com 1.741 óbitos.
Medidas mais
drásticas de prevenção, de acordo com Schietti, foram adotadas em diversos países,
diante do agravamento da crise sanitária, que já produziu mais de 4,7 milhões
de casos de Covid-19 no mundo todo. "A grande e
principal diferença em relação a esses países e o nosso é que em nenhum deles –
à exceção, talvez, dos Estados Unidos, cujo presidente é tão reverenciado por
seu homólogo brasileiro – existe uma clara dissensão entre as políticas
nacional e regionais", comentou o relator.
Ao falar sobre a
expectativa de agravamento da situação no Brasil, Schietti voltou a criticar a
postura do presidente Bolsonaro durante a grave crise sanitária. Segundo ele,
"boa parte dessa realidade se pode creditar ao comportamento de quem, em
um momento como este, deveria deixar de lado suas opiniões pessoais, seus
antagonismos políticos, suas questões familiares e suas desavenças ideológicas,
em prol da construção de uma unidade nacional".
"O recado
transmitido é, todavia, de confronto, de desprezo à ciência e às instituições e
pessoas que se dedicam à pesquisa, de silêncio ou até de pilhéria diante de tragédias
diárias. É a reprodução de uma espécie de necropolítica, de uma violência
sistêmica, que se associa à já vergonhosa violência física, direta (que nos
situa em patamares ignominiosos no cenário mundial), e à violência ideológica,
mais silenciosa, porém igualmente perversa, e que se expressa nas manifestações
de racismo, de misoginia, de discriminação sexual e intolerância a grupos
minoritários", afirmou o ministro.
A soma de tudo
isso, segundo ele, "gera um sentimento de insegurança, de desesperança, de
medo – ingredientes suficientes para criar uma ambiência caótica, propícia a
propostas não apenas populistas mas de retrocesso institucional, como tem sido
a tônica nos últimos tempos".
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