Só há um jeito de diminuir os impactos do Coronavírus no Brasil:
Acabar com a
austeridade fiscal, fortalecer o SUS e derrotar Bolsonaro!
Por Lucas G. Lima
Professor da UFAL
PCB de Alagoas
O Coronavírus (COVID
19) já está presente em todos os continentes, uma epidemia de alcance global
que tem provocado a morte de milhares de pessoas e que ganhou status de
pandemia pela OMS, em razão de sua rápida disseminação.
Alguns países, a
exemplo de China e Cuba, têm conseguido administrar melhor os impactos do
Coronavírus por meio de um arranjo institucional centralizado e pautado no
interesse público, como a produção de antivirais, a construção e/ou reserva de
estabelecimentos específicos de tratamento da doença e quarentena social.
Portanto, são ações que priorizam a saúde coletiva em detrimento das atividades
econômicas.
As estimativas dos
efeitos da propagação do vírus no Brasil ainda não são precisas, mas alguns
ensaios apontam desdobramentos nada animadores. É o caso do estudo preliminar
de autoria de pesquisadores da Universidade de Oxford, que prevê uma
contaminação de 40% a 70% da população brasileira e uma quantidade de mortos
que pode se aproximar de 500 mil pessoas. Um cenário tenebroso e que pode ser
pior, caso a política neoliberal de austeridade fiscal continue a se sobrepor
aos interesses da saúde pública e do bem-estar da população.
Seguramente, a única
maneira de diminuir os impactos do Coronavírus no Brasil é através do
fortalecimento do SUS, que é o único meio de acesso à saúde pública de 80% da
população brasileira, ou seja, de quase 170 milhões de pessoas. Mas é aí que
reside o principal problema. O SUS, apesar de ser um dos melhores sistemas de
saúde do mundo, é uma vítima histórica do subfinanciamento, em decorrência da
hegemônica política de austeridade fiscal.
Os gastos da União
sempre priorizaram a continuidade do pagamento da dívida pública em detrimento
da saúde, ainda que, em alguns momentos, o volume despendido de recursos tenha
se elevado. Os dados do gráfico 1 ilustram de forma clara nossa afirmação.
Observa-se que, nos dez últimos anos, as despesas relacionadas à dívida pública
sempre figuraram bem acima das despesas com saúde.
Gráfico 1: Evolução
das despesas da União com Saúde e com a Dívida Pública (2010-2019)Fonte:
Secretaria do Tesouro Nacional, 2020. Org: Lucas Lima, 2020.
Apesar de o gráfico 1
apontar um crescimento dos valores despendidos pela União com a saúde, a
relação entre despesas públicas em saúde dos três entes federativos (união,
estados e municípios) e o Produto Interno Bruto (PIB) coloca o Brasil em
posições baixas nos ranking internacionais. De acordo com o estudo de técnicos
do Instituto de Pesquisas Econômicas e Aplicadas (IPEA), a partir de dados divulgados
pela Organização Mundial da Saúde (OMS), o Brasil está na 34ª posição, entre 37
países da OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico),
quando medida a relação entre percentual de gasto público com saúde em relação
ao PIB de cada nação. Entre 12 países da América do Sul, o Brasil ocupa apenas
a 8ª posição.
É importante
mencionar que a Desvinculação de Receitas da União (DRU) é uma das principais
responsáveis por sangrar recursos da saúde. Criada em 1994, a DRU vem,
sistematicamente, subtraindo dinheiro da Seguridade Social (Saúde, Previdência
e Assistência Social) para a continuidade do pagamento da dívida pública.
Segundo a Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (ANFIP),
a partir de levantamento feito por consultores de Orçamento e Fiscalização
Financeira do Congresso Nacional, a DRU retirou mais de 500 bilhões de reais da
Seguridade Social entre 2008 e 2016. Apesar do impacto dessas perdas de
recursos, o golpista Michel Temer, no exercício da presidência, conseguiu o
apoio da maioria dos parlamentares no Congresso Nacional para a ampliação do
percentual da DRU, que saiu de 20% para 30%.
Essa política de
austeridade fiscal, responsável pela fragilização da sustentação financeira do
SUS, acarretou sérias consequências. O gráfico 2 foi elaborado a partir do
Boletim Informativo do PROADESS/FIOCRUZ e revela a evolução dos hospitais
públicos e privados disponíveis para o SUS. Os dados disponíveis vão até o ano
de 2017, mas são suficientes para evidenciar a diminuição do alcance da rede de
atendimento SUS no país. Nota-se uma queda não linear no número de
estabelecimentos de saúde num intervalo de nove anos.
Gráfico 2: Evolução
do número de hospitais públicos e privados disponíveis ao SUS
Fonte:
PROADESS/FIOCRUZ, 2019. Org: Lucas Lima, 2020.
A mesma publicação
compara a evolução do número de leitos curativos no país, evidenciando números
de 2009 e 2017. Conforme quadro 1, todas as regiões do país, com exceção do
Norte, que se manteve estável, apresentaram diminuição no número de leitos
curativos (clínicos, cirúrgicos, obstétricos e pediátricos) nos
estabelecimentos que atendem pelo SUS.
Quadro 1: Leitos
curativos no Brasil em estabelecimentos que atendem pelo SUS (2009 e 2017)
Grande Região
|
2009
|
2017
|
Var %
|
Norte
|
1,16
|
1,16
|
0,0%
|
Nordeste
|
1,43
|
1,31
|
-8,4%
|
Sudeste
|
1,18
|
1,00
|
-15,2%
|
Sul
|
1,62
|
1,46
|
-9,9%
|
Centro-Oeste
|
1,61
|
1,33
|
-17,4%
|
Brasil
|
1,34
|
1,19
|
-11,2%
|
Fonte:
PROADESS/FIOCRUZ, 2019. Org: Lucas Lima, 2020.
Essa crônica situação
de subfinanciamento da saúde se agravou com a aprovação da PEC do Teto dos
Gastos, apelidada pelos sindicatos, à época, como a PEC do Fim do Mundo.
Diga-se de passagem, um nome bem sugestivo, em face da perversidade da
proposta. A PEC, apresentada pelo golpista Michel Temer, foi aprovada pela
maioria dos parlamentares no Congresso Nacional, inclusive, por Bolsonaro, no
exercício de seu mandato como deputado federal. Em resumo, a PEC, chamada desde
sua aprovação de Emenda Constitucional nº 95 (EC-95), limitou os gastos em
saúde às despesas do ano de 2017, atualizadas pelo índice da inflação dos anos
seguintes. Um verdadeiro crime!
Desde sua aprovação,
a EC-95 já causou um prejuízo de 22,48 bilhões ao SUS, entre 2018 e 2020, e a
estimativa é que a perda de recursos alcance 400 bilhões até 2036, de acordo
com o Conselho Nacional de Saúde.
Os efeitos da EC-95
podem ser verificados em Alagoas, uma vez que o repasse do Fundo Nacional de
Saúde diminuiu em 2019, primeiro ano do governo Bolsonaro. Em relação ao ano de
2018 foi identificada uma perda de 21 milhões de reais para a saúde estadual.
Dos 102 municípios alagoanos, 46 registraram perdas no repasse do Fundo
Nacional da Saúde, o equivalente a 45% do total de municípios do estado.
Maceió, capital que concentra em torno de 30% da população de Alagoas e que deu
dupla vitória (1º e 2º turno) à Bolsonaro nas eleições, teve uma perda de mais
de 77 milhões de reais. No mapa seguinte constam os municípios, em vermelho,
que tiveram perdas de recursos do Fundo Nacional de Saúde em 2019.
Alagoas: municípios
que tiveram perdas nos recursos repassados pelo Fundo Nacional de Saúde em 2019
Fonte: Fundo Nacional
de Saúde, 2020. Elaboração: Lucas G. Lima, 2020.
É oportuno recordar
que, em dezembro de 2019, Bolsonaro extinguiu arbitrariamente o seguro
obrigatório, conhecido como DPVAT (Danos Pessoais Causados por Veículos
Automotores), que costuma ser cobrado junto ao IPVA (Imposto sobre Veículos
Automotores). A medida acabou sendo derrubada, posteriormente, pelo Supremo
Tribunal Federal (STF), mas foi um importante indicador do desprezo de
Bolsonaro com a saúde pública, uma vez que 45% dos recursos arrecadados com o
DPVAT se destinam ao Fundo Nacional de Saúde.
Ainda em 2019,
Bolsonaro apresentou um pacote de propostas de emendas à Constituição Federal,
conhecido como Plano Mais Brasil. Um dos conteúdos dessas emendas é a
unificação dos orçamentos da saúde e da educação. Ou seja, uma tentativa de
golpe de misericórdia no SUS, uma vez que, se aprovada (a unificação), não
haverá mais orçamentos e despesas mínimas específicas por área, abrindo caminho
para as barganhas e as negociatas políticas a cada ano.
No presente momento,
com o crescimento geométrico dos contágios pelo Coronavírus no Brasil,
evidenciam-se os limites da austeridade fiscal e da vigência da EC-95. Em todos
os cantos do país, trabalhadores da saúde têm manifestado sua preocupação com a
falta de insumos (máscaras, óculos, capote, etc.), força de trabalho e leitos
curativos e de UTI para o enfrentamento da pandemia. O próprio Ministro da
Saúde do governo Bolsonaro solicitou a liberação de 5 bilhões de reais ao
Congresso Nacional, a fim de custear ações específicas contra o vírus.
Assim, os dados e as
informações recentes revelam que a política de austeridade fiscal tem prosseguimento
com o governo Bolsonaro, uma vez que esta prioriza os lucros dos especuladores,
bancos, fundos de investimento, dentre outros, causando um estrangulamento dos
recursos disponibilizados ao SUS.
Por conseguinte, a
única possibilidade de diminuição dos impactos do Coronavírus no Brasil passa,
invariavelmente, pelo fortalecimento do SUS, encerrando a perversa política de
austeridade fiscal da qual faz parte a EC-95. Para tanto, precisamos impor uma
derrota ao governo Bolsonaro e sua agenda de destruição.
FORA BOLSONARO E
MOURÃO!!!
TODO APOIO AO SUS!!!
PELA REVOGAÇÂO DA
EC-95!!!
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