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© Getty Images Nove jovens morreram durante um baile funk na
favela de Paraisópolis, em São Paulo
Nove jovens
morreram pisoteados (familiares das vítimas contestam essa versão da PM - grifo deste blog) durante uma ação da Polícia Militar no Baile da 17, uma
festa de funk que costuma reunir milhares de jovens em Paraisópolis, segunda
maior favela de São Paulo. Entre eles, há um adolescente de 14 anos.
Em entrevista
coletiva, o tenente-coronel Emerson Massera, porta-voz da PM, afirmou que um
grupo de policiais entrou na comunidade durante uma perseguição a um suposto
grupo de criminosos. Os suspeitos teriam
roubado motocicletas fora da favela e foram seguidos por policiais, segundo
Massera. Durante a perseguição, os agentes entraram em Paraisópolis e se
depararam com uma multidão de frequentadores do baile.
"Esses
criminosos entraram no baile e usaram as pessoas como escudo", afirmou o
porta-voz. Segundo ele, os suspeitos atiraram na direção dos policiais e os
frequentadores da festa teriam jogado pedras nos agentes. Os policiais
revidaram com bombas de efeito moral e balas de borracha, diz a corporação.
Parte do público saiu correndo e, nas vielas estreitas da favela, nove pessoas
morreram pisoteadas e ao menos sete ficaram feridas.
Por outro lado,
vídeos publicados na internet mostram alguns policiais agredindo com chutes e
golpes de cassetete alguns jovens que estavam rendidos e desarmados em um beco
— a BBC News Brasil não conseguiu confirmar a autenticidade dos vídeos de forma
independente. Em entrevista a jornalistas, uma das frequentadoras, que não quis
ser identificada, afirmou que um policial quebrou uma garrafa em sua cabeça,
além de machucá-la com um cassetete.
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Emerson Massera,
porta-voz da PM de São Paulo, afirmou que a ação dos policiais será investigada
e que os vídeos sugerem um abuso por parte dos profissionais. "Algumas
imagens sugerem abusos e ações desproporcionais. A gente lamenta as mortes,
essa tragédia. Mas ainda é cedo dizer se houve erro da Polícia Militar (na
ação) ", diz.
O governador de São
Paulo, João Doria (PSDB), afirmou que lamenta as mortes dos jovens.
"Lamento profundamente as mortes ocorridas no baile funk em Paraisópolis
nesta noite. Determinei ao Secretário de Segurança Pública, General Campos,
apuração rigorosa dos fatos para esclarecer quais foram as circunstâncias e
responsabilidades deste triste episódio." Segundo a PM, havia
cerca de 5 mil pessoas no Baile da 17 no momento da operação.
O que é o Baile da 17?
O Baile da 17 foi
criado no início dessa década nas ruas de Paraisópolis. Segundo moradores, o
número 17 é uma referência a um bar de drinks que existia na favela. Inicialmente, a
festa teria surgido como um pagode em frente a esse boteco, mas, nos
intervalos, os frequentadores ouviam funk em carros estacionados na rua.
Com o tempo, a
festa cresceu e invadiu as madrugadas, focando principalmente em funk. Hoje,
ela costuma ocorrer nas noites de sexta e sábado. Mas, de acordo com moradores
ouvidos pela BBC News Brasil, há semanas em que o pancadão começa na noite de
quinta-feira e se estende até domingo.
A festa já chegou a
reunir cerca de 30 mil pessoas nas vielas de Paraisópolis — ela se concentra em
quatro ruas da favela. Semanalmente, o baile recebe excursões de jovens de
cidades do interior de São Paulo e até de outros Estados, como o Rio de
Janeiro.
Ao longo das
vielas, DJ's estacionam carros com aparelhos de som acoplados. Grupos de jovens
se reúnem no entorno desses veículos para dançar e se divertir. O alto barulho, no
entanto, fez com que moradores se mudassem da área, dando espaço para
estabelecimentos comerciais voltados aos frequentadores, como tabacarias e
bares. Parte do baile é bancado por esses comerciantes.
A BBC News Brasil
conversou com um DJ de 20 anos que regularmente leva o carro ao baile. Ele diz
receber R$ 500 de um comerciante para tocar por cinco horas seguidas em frente
a um estabeleci-mento. "Mas tem DJ que chega a receber uns R$ 2 mil,
dependendo do tempo em que ele toca e da potência do som", afirmou ele,
que preferiu não se identificar.
O fenômeno dos
pancadões de rua, como o Baile da 17, tem sido discutido nos últimos anos tanto
pela prefeitura quanto pelo governo do Estado de São Paulo. Existem centenas
deles em bairros pobres e com poucas opções de lazer para os jovens. Também há diversas
denúncias de atuação do crime organizado, que se utiliza das festas para
comercializar drogas ilegais.
Por outro lado, há
quem critique a ação repressiva da polícia, que muitas vezes interrompe os
eventos com bombas e tiros, ferindo inocentes. No caso de Paraisópolis, por
exemplo, houve 45 ações de repressão ao Baile da 17 apenas nesse ano, segundo a
Polícia Militar.
Para Gilson
Rodrigues, líder comunitário e presidente da União de Moradores e Comerciantes
de Paraisópolis, o pancadão é uma "alternativa de lazer" para jovens
que têm poucas opções de divertimento em seus bairros. "Não temos
áreas de lazer em Paraisópolis. Temos um campo de futebol e hoje inauguramos
uma praça. Ao invés do Estado proporcionar estruturas de lazer para o jovem,
ele reprime por meio da polícia", diz.
Apesar da poluição
sonora e o fechamento de vias da favela, o Baile da 17 não está entre as
principais reclamações dos moradores da comunidade. Ele ocupa a 5º colocação
nesse ranking, que é liderado pelos problemas no recolhimento do lixo, segundo
uma pesquisa da União de Moradores e Comer-ciantes.
Paraisópolis
Paraisópolis fica
ao lado do Morumbi, bairro nobre na zona oeste de São Paulo. Estima-se que a
favela tenha cerca de 100 mil habitantes e 8 mil estabelecimentos comerciais —
a maioria pertence a morado-res. Cerca de 21% dos habitantes trabalham dentro da
própria favela, segundo a associação de moradores.
Por outro lado,
apesar do comércio aquecido e da fama adquirida com uma novela da TV Globo que
usava suas vielas como cenário, a comunidade ainda tem uma série de problemas
comuns a toda favela do Brasil, como pobreza extrema, falta de saneamento
básico e violência.
Obras de
urbanização estão paradas há anos, como canalização de um córrego e a
construção de moradias sociais. Cerca de 5 mil famílias da comunidade vivem de
bolsa-aluguel pagos pela prefeitura.
Nos últimos anos, a
União de Moradores e Comerciantes criou uma série de projetos para tentar
melhorar a vida no bairro, como um banco comunitário, restaurantes populares,
escolas de balé e música para crianças.
Recentemente,
Paraisópolis participou da criação do G-10 das favelas do Brasil, grupo que
pretende desenvolver a economia local por meio do empreendedorismo.
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