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Presidente
Jair Bolsonaro concedeu perdão a agentes de segurança pública | Foto: Marcos
Corrêa/PR
Por Maria Teresa
Cruz
O presidente Jair
Bolsonaro assinou nesta segunda-feira (23/12) o indulto de Natal concedendo
perdão aos agentes de segurança pública que tenham cometido crimes culposos
(sem intenção) no exercício da função ou em decorrência dela (leia decreto nº 10.189 na íntegra). O decreto
livra da condenação policiais militares, civis, bombeiros, agentes
penitenciários e militares do Exército. Ele foi publicado no Diário Oficial da
União nesta terça-feira (24/12).
Para o policial
civil do Rio Grande do Sul Leonel Radde, membro do Movimento Nacional dos
Policiais Antifascismo, o indulto favorece a milícia e é um recado de que
excessos podem ser cometidos. “É um incentivo ao mau policial de que vai
permanecer impune sob o discurso de que se ele agir contra a criminalidade,
está tudo certo. Ele não está favorecendo a polícia, ele está favorecendo a
milícia. O discurso é: eu quero proteger os policiais para que eles possam
fazer o trabalho sem se preocupar. Mas na verdade a mensagem é: mesmo que você
cometa excessos, se você estiver do meu lado e fizer a política de extermínio,
de perseguição a oposição, você vai ter o meu apoio”, explica Leonel.
O policial
manifesta preocupação com o histórico recente envolvendo a família Bolsonaro e
as investigações que apontam envolvimento com
milícias no Rio de Janeiro, e que na última semana atingiram com mais força um
de seus filhos, o senador Flávio Bolsonaro. “Sabendo das ligações do Bolsonaro
com as milícias e entendendo que a milícia age dentro da polícia, que em
algumas regiões é aparelhada por essas categorias que ele indultou, sabendo
disso tudo, é um recado direto, mais uma vez, para esses grupos milicianos que
ele está vinculado de alguma maneira”, pontua Leonel Radde.
O tenente-coronel
da reserva da PM Adilson Paes de Souza, mestre em Direitos Humanos e autor do
livro “O Guardião da Cidade – Reflexões sobre Casos de Violência Praticados por
Policiais Militares (Escrituras, 2013)”, questiona a constitucionalidade do
indulto.
“Mais uma vez, o
presidente viola a constituição federal porque fere o princípio da
impessoalidade. O indulto não pode ser algo específico para determinada
categoria. Fazendo uma comparação, a grosso modo, seria a mesma coisa de o
Temer [ex-presidente Michel Temer] perdoar casos de corrupção
exclusivamente para membros do Congresso Nacional”, critica Adilson.
E destaca o teor
eleitoreiro do decreto. “A partir do momento que ele faz uma opção para
uma categoria, devo dizer que mais uma vez fica provado que o presidente está
governando para o seu eleitorado. O presidente não esta agindo como chefe de
Estado, preocupado com os destinos e assuntos da nação. Ele está preocupado em
cumprir promessa de campanha política que atinja o seu eleitorado em detrimento
da sociedade, o que é extremamente preocupante”, avalia.
O tenente-coronel
destaca que o indulto abarca militares do Exército que agiram em GLO (Garantia
da Lei e da Ordem) – quando o Exército atua com poder de polícia – e policiais
que se envolvem em crimes no horário de folga. Reportagem publicada no início
do ano passado, quando a segurança pública do Rio de Janeiro ficou sob
intervenção federal, indicava que em 7 anos, as GLOs foram usadas quase 30 vezes.
“[O indulto]
coloca policiais que no momento de folga atuaram, entre aspas, em razão da
função. Lamentavelmente, estudos expõem que 75% dos policiais vítimas de
homicídio estavam em horário de folga e em situações que evidenciam segurança
privada, o famoso bico. Ou seja, o policial não agiu no exercício da função,
ele agiu como guarda de determinado patrimônio. Me parece um estímulo dessa
conduta. Ele [Bolsonaro] não respeita a regra do jogo e emitir esse tipo de
sinal pode representar, na cabeça de muitos policiais, a garantia para eles
continuarem praticando os atos que praticam e nós poderemos ter mais desgraça”,
conclui o PM aposentado.
O advogado
criminalista Augusto de Arruda Botelho, um dos fundadores do IDDD (Instituto de
Defesa do Direito à Defesa), conselheiro da ONG Human Rights Watch e do
Innocence Project Brasil, tem visão semelhante à de Adilson Paes de Souza com
relação à constitucionalidade do decreto.
“O indulto é uma
prerrogativa constitucional do presidente e ela deve se basear na lei e na
Constituição. No indulto natalino, o presidente pode muito, mas não pode tudo”,
explica.
Para ele, o decreto
tem falhas legislativas e textuais. “Ele fez uma opção de indultar uma
categoria de profissionais, que são os agentes de segurança. Eu nunca vi isso
na minha experiência. Existem parâmetros para o indulto. Além das questões
humanitárias, de saúde, aquela história de que pessoas acometidas por doenças
geralmente são indultadas, você precisa estabelecer parâmetros macros. Por
exemplo, vou indultar ‘pessoas condenadas por crimes sem violência que já
tenham cumprido um determinado tempo de pena’. Você fixa parâmetros que se
encaixam a uma série de pessoas condenadas, homem, mulher negro, branco, etc”,
analisa.
Arruda Botelho
conta que participou por alguns anos das discussões do indulto e lembra que ele
é redigido em uma primeira versão no âmbito do Conselho Nacional de Políticas
Criminais e Penitenciárias, o CNPCP. “Geralmente o texto do indulto é bom
justamente porque passou por vários especialistas. Mas temos que lembrar que o
Bolsonaro esvaziou o CNPCP, teve toda aquela história do desligamento da Ilona
Szabó [a especialista foi convidada em fevereiro pelo ministro Sérgio
Moro para ser membro suplente do conselho mas presidente vetou
nomeação após pressão de apoiadores nas redes sociais],
então não sei quem redigiu esse indulto, mas ele é dúbio e fere o princípio de
isonomia”, critica o advogado criminalista.
Ele também
acredita que, do ponto de vista político, Bolsonaro tenta sinalizar que não
desistiu de muitas das ideias que sempre defendeu para a segurança pública,
entre elas a excludente de ilicitude, prevista no pacote anticrime do ministro
da Justiça, Sérgio Moro, e derrotada no Congresso. “Eu entendo que esse indulto
do presidente é um ensaio de fazer uma alteração na lei com exclusão de
culpabilidade e punibilidade, alterando esses critérios. É uma resposta à
derrota que ele sofreu”, conclui Augusto de Arruda Botelho.
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