Brazil's President Jair
Bolsonaro, right, has a laugh with Vice President Hamilton Mourao, during a
military ceremony in honor of Sailor Day, in Brasilia, Brazil, Friday, Dec. 13,
2019. (AP Photo/Eraldo
Peres).
Jair Bolsonaro não pode ser acusado de estelionato
eleitoral. Enquanto chefe de Estado, fez aquilo que prometeu durante a campanha
e ao longo da carreira: ameaçou jornalistas, apresentou projetos políticos
punitivistas, formulou propostas econômicas que reforçam o lugar de
subserviência do Brasil na dinâmica internacional do capitalismo e se ofereceu
como algoz do meio ambiente.
A reforma da
previdência e a proposta de acordo entre o Mercosul e a União Europeia são os
pontos mais danosos no plano econômico. No primeiro caso, trata-se de uma grave
retirada de direitos da população, que perderá o direito de se aposentar, em
especial a negra. Com a aposentadoria prevista para 65 anos para homens e 62
para mulheres e a expectativa de vida em bairros com a maior presença de
negros, como o Grajaú, em São Paulo, é de 58,6 anos. Temos uma matemática
simples que anuncia a restrição desse grupo para se aposentar.
O acordo entre
Mercosul e União Europeia reforça o lugar do Brasil como vendedor de
commodities e importador de produtos com valor agregado. Sem barreiras
protecionistas, o Brasil intensificará a produção de materiais agrícolas para a
Europa e importará em maior quantidade produtos industriais e tecnológicos. Sem
investimento na indústria nacional, seguiremos vendendo laranja e cana de
açúcar e comprando tecnologia.
Os impactos desse
acordo para o meio ambiente também são gravíssimos. Com maior demanda para a
exportação de soja, o Brasil verá uma dinâmica mais forte para o desmatamento e
a ampliação da monocultura no país.
O meio ambiente,
aliás, foi um dos principais alvos de Jair Bolsonaro. Com a liberação de maior
uso de agrotóxicos, o crescimento do desmatamento, Bolsonaro não apenas atinge
o planeta, como principalmente os grupos sociais que habitam esses ambientes.
Entre os mais atingidos estão as comunidades quilombolas e indígenas.
Somente em 2019,
houve o assassinato de diversas lideranças indígenas e quilombolas, como Seu
Vermelho, morto a machadadas no Quilombo Rio dos
Macacos. O aumento da tensão no campo repercute de maneira direta sobre o
número de pessoas vítimas de homicídio, na medida em que há um avanço sobre as
disputas de terra.
A principal
bandeira do atual presidente, o aumento da repressão e o combate ao crime foram
seguidas a risca, mas tiveram de se deparar com uma forte resistência da luta
antirracista. O pacote de segurança pública de Sérgio Moro foi a principal
bandeira do então governo.
No projeto, Moro
apresentou a ampliação do excludente de licitude. Previsto no Código Penal, o
excludente de ilicitude define a possibilidade de redução da pena quando atos
ilegais, como tirar a vida de alguém, são cometidos. O dispositivo se aplica,
por exemplo, se o autor do crime alegar legítima defesa. O texto proposto por
Sérgio Moro estipulava que a pena poderia ser reduzida pela metade ou até não
aplicada se o crime praticado por agente público, como policial, ocorresse por
“escusável medo, surpresa ou violenta emoção”.
Nessa área, porém,
Bolsonaro sofreu derrotas. Os principais pontos do pacote de Sérgio Moro, como
a ampliação do excludente de licitude, foram derrubados. A vitória é a soma de
uma série de fatores, como a denúncia da Vaza Jato feita pelo The Intercept,
mas também da ação política do movimento negro, que foi à ONU, OEA, União
Europeia e todos os mecanismos possíveis de direitos humanos para denunciar o
projeto de Sérgio Moro.
Todo o cenário do
primeiro ano indica de que o mandato de Jair Bolsonaro será como foi anunciado
ao longo da campanha: retirada de direitos e fortalecimento dos setores
privilegiados da sociedade. Ou seja, nada mais, nada menos do que uma tragédia,
mas dessa vez, completamente anunciada.
A experiência de
resistência dos movimentos sociais, sobretudo o negro, indígena e outros
segmentos marginalizados, mostra de que a luta não está perdida. A resistência
é sim fator fundamental para que se garanta ao menos parte dos direitos
conquistados em outros períodos históricos.
É
necessário que se mobilize cada vez mais o povo, com a formação de trabalho de
base, para enfrentar esse cenário de retrocesso. O que foi retirado em apenas
um ano talvez precise de décadas de governos progressistas para que haja uma
total recuperação. Isso porque ainda há mais 3 anos de gestão. A luta continua.
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