Em 5 de fevereiro de 2019
FOTO: MARCELO CAMARGO/AGÊNCIA
JORNALISTAS LIVRES – por Eduardo
Maretti Advogados.
Preveem aumento da violência policial e
mais encarceramento, se projeto virar lei
São Paulo – O projeto
de lei anticrime, anunciado pelo ministro da Justiça e Segurança Pública,
Sergio Moro, na manhã do dia 04/02, introduz no ordenamento jurídico do país
uma “licença para matar” para os policiais, viola vários princípios da
Constituição, aumentará o encarceramento e atingirá principalmente jovens
pobres e negros das periferias. “É um projeto de lei anticrime, mas na verdade
é um projeto que assassina a Constituição, matando direitos e garantias
fundamentais”, diz o advogado criminalista Leonardo Yarochewsky.
Outra questão
mencionada pelo advogado como grave é a previsão de “legítima defesa” para os
policiais. “Criou-se, como era proposta de campanha do próprio Bolsonaro, uma
legítima defesa especial para policiais, dando quase uma licença para eles
matarem quando há conflito ou risco iminente de conflito, como prevenção de uma
agressão.”
Advogado e membro do
Conselho Estadual de Direito da Pessoa Humana (Condepe), Ariel de Castro Alves
afirma que, “na prática, qualquer suspeito pode ser abatido, independentemente
de estar cometendo crime, meramente porque o policial julgou que a pessoa é
suspeita”.
“Os adolescentes e
jovens, geralmente negros, já são as principais vítimas da polícia e, com o
projeto, as proporções de jovens mortos pode aumentar muito”, diz Castro.
“Sabemos que a
polícia brasileira é uma das que mais mata no mundo, e isso vai atingir os mais
vulneráveis. A população carcerária é composta na imensa maioria por negros,
pobres e jovens. Isso só vai contribuir para o aumento do encarceramento, que
já é imenso”, afirma Yarochewsky.
Segundo levantamento
da Pastoral Carcerária, o Brasil tem 725 mil pessoas presas, atrás somente da
China, com 1,6 milhão, e dos Estados Unidos, como 2,1 milhões.
A proposta prevê que
“o juiz poderá reduzir a pena (do policial) até a metade ou deixar de aplicá-la
se o excesso decorrer de escusável medo, surpresa ou violenta emoção”.
Castro, do Condepe,
lembra que o PL propõe expressamente uma mudança no Código de Processo Penal
(CPP) pela qual o agente poderá responder a inquéritos e processos em
liberdade. “Isso aumentará a violência policial, porque quem investiga os
policiais são os próprios colegas e não existe isenção. Então, os policiais
poderão estar soltos ameaçando as testemunhas.”
Para Yarochewsky, não
existe política criminal no projeto apresentado pelo ministro da Justiça. “O
que existe é uma política autoritária, de endurecimento, uma política para a
qual bandido, entre aspas, tem que morrer na cadeia.”
Para ambos os
advogados, o já tão desprezado princípio constitucional da presunção de
inocência é novamente atacado, agora pelo projeto de lei. Logo no início do
texto, há uma mudança no Código de Processo Penal para assegurar a execução
provisória de pena após condenação em segunda instância, que hoje prevalece em
função de decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), destaca Yarochewsky.
Ele lembra que essa
decisão está sujeita a ser modificada, em razão da previsão do julgamento das
Ações Declaratórias de Constitucionalidade (ADCs) 43 e 44. “O mínimo, pelo
menos em relação a esse ponto, seria esperar a decisão do Supremo”, diz o
advogado.
As ADCs, liberadas
para julgamento pelo relator Marco Aurélio Mello, do STF, em dezembro de 2017,
até hoje não entraram na pauta, o que deve acontecer em abril, por decisão do
novo presidente da Corte, Dias Toffoli, empossado em setembro.
Apenas por conta da
execução antecipada da pena definida pelo STF, lembra Yarochewsky, mais de 20
mil pessoas já foram presas no país. Na opinião do criminalista, a situação vai
piorar se o PL de Moro virar lei. “A essência do projeto é trancafiar e
aumentar o encarceramento.”
Para Ariel, o projeto
é também inconstitucional por violar o princípio da igualdade. “Segundo o
artigo 5° da Constituição, todos são iguais perante a lei. Os policiais não
podem estar acima ou fora das leis, mas subordinados às mesmas legislações. Mas
estão recebendo licença para matar, contra o princípio da dignidade da pessoa
humana segundo o qual o bem maior a ser assegurando pelo Estado é a vida.”
Ex-candidato à
Presidência da República pelo Psol, Guilherme Boulos afirmou, em sua conta no
Twitter, que o PL de Moro “é a legalização da pena de morte, sem julgamento,
praticada por agentes públicos”.
A afirmação de Boulos
é pertinente, segundo Ariel, mas o advogado pondera: “Só que a pena de morte,
onde vigora, é decorrente de um procedimento legal pelo qual a pessoa pode se
defender, durante um processo. No caso do projeto de lei brasileiro, o policial
mata e depois justifica. É uma espécie de lei do abate de jovens pobres”.
https://jornalistaslivres.org/para-advogados-projeto-de-lei-anticrime-de-moro-cria-licenca-para-matar/
Nenhum comentário:
Postar um comentário