4 de fevereiro de 2019
Por Rodrigo Bernardo Ortega, Resumen
Latinoamericano
A recente eleição do ultra-direitista Jair Bolsonaro como presidente do
Brasil confirma o fatídico presente da democracia na América Latina. Com
exceção de alguns casos, a direita conservadora recuperou o poder no
continente. Começam a ficar para trás as grandes conquistas sociais dos governos
progressistas, que reduziram acentuadamente as taxas de pobreza na região. Como
se isso não bastasse, o líder da chamada “democracia mais antiga do mundo” é um
indivíduo com ideias perigosas e incendiárias. De fato, Donald Trump mostrou
que instituições e mídia não são mais obstáculos para realizar seus projetos e
ambições. O magnata-presidente quer promover sua visão de mundo, na qual os
empresários depredam recursos, a humanidade é apenas um elo para elevar alguns
homens, e a democracia, com seus pesos e contrapesos, é um sistema cada vez
mais inconveniente. Esta é a era do darwinismo social.
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Tão maleáveis são os líderes da América Latina que, no processo
eleitoral presidencial, todos em uníssono criticaram o então candidato Trump e
o acusaram de ser “radical e antidemocrático”; hoje eles o elogiam e até o
converteram na estrela polar de alguns governos da região. Basta mencionar os
casos da Colômbia, da Argentina e do Brasil, cujos presidentes pediram o apoio
de Trump para que seus negócios fossem concretizados. Por exemplo, o presidente
Iván Duque não hesitou em receber conselhos militares para “acabar com o
problema do narcotráfico”. A nova perspectiva do governo é impedir a todo custo
o aumento de hectares de folha de coca, mesmo em detrimento do que é estipulado
no Acordo de Paz como substituição voluntária. O imperialismo voltou a abrir
caminho ao sul do continente.
No entanto, um elemento deve ser tomado como certo: a América Latina não
é e não será uma prioridade para Donald Trump (nem para nenhum governo dos EUA
após as duas guerras mundiais). Isso não implica necessariamente que a Casa
Branca não tenha uma estratégia para influenciar constantemente as decisões
adotadas no sul do continente
(https://www.desarrollando-ideas.com/2017/07/la-politica-exterior-de-los
-estado-unido-para-américa-latina-na-era-trunfo /).
A realidade é que a administração Trump percebe como “subordinados
fiéis” os presidentes da direita latino-americana. E na verdade eles são. As
ordens promovidas de Washington, como o abandono da Unasur (uma das poucas
organizações que apoiaram a unidade dos países do Sul), são uma amostra da
política externa invasiva e imperial que é aceita sem grande oposição por
líderes medíocres, sem dignidade ou soberania.
Enquanto a política externa de Trump visa fechar acordos importantes com
a União Europeia e seus parceiros no Oriente Médio, a América Latina nada mais
é do que sua “zona tradicional de influência”, seu quintal. Deve ser mencionado
o caso do jornalista Jamal Kashoggi, brutalmente assassinado no consulado
saudita na Turquia, morte essa que, segundo investigação realizada pela CIA,
foi ordenada pelo príncipe herdeiro da Arábia Saudita, Mohammed bin Salman
(https://www.bbc. com.br / world / news-international-46246458). No entanto, o
presidente Trump procurou minimizar as circunstâncias do assassinato, já que o
Reino da Arábia é um dos seus principais parceiros comerciais. Isso mostra que
os negócios estão acima dos direitos humanos e da democracia. Mutatis mutandi,
para o caso da América Latina, a Casa Branca tem promovido uma política fiscal
com base em um modelo econômico extrativista e predatório, sem nem se preocupar
com as violações que são perpetradas para tal.
Após o fim da Guerra Fria, os Estados Unidos ficaram sem argumento para
combater a “influência do comunismo no mundo”; começaram então uma campanha
para “proteger a democracia”, como se isso fosse a sua missão na história. Além
das intervenções de meados do século XX, momento em que ditaduras sangrentas
receberam apoio dos EUA, o Pentágono está agora em busca de “restaurar a ordem”
após a ascensão de administrações esquerda no continente
(https://elordenmundial.com/estados-unidos-en -latinoamerica /). Mais do que
uma “zona de influência” em termos geopolíticos tradicionais, a América Latina
é, para o magnata-presidente, uma região de exploração, um espaço de “tentativa
e erro”, onde, não encontrando oposição (na verdade, muito pelo contrário),
pode colocar em prática as teses do neoliberalismo radical. Nesse sentido, um
sistema tributário em favor dos mais ricos é um sinal de que a democracia é um
sistema cada vez mais hostil para os negócios. Por essa razão, o subcontinente,
mais que uma região de influência, é uma zona de controle e imposição.
Benvindos ao passado.
Além do exposto, o neo-intervencionismo imperial se manifestou na
intromissão nas eleições na América Latina. Somados ao escândalo da Cambridge
Analítica – a empresa britânica que vendeu informações para lidar com mais de
50 milhões de usuários de campanha no Facebook para promover Donald Trump,
mediante a criação seletiva de publicidade e notícias falsas -, estão os casos
das votações no Brasil, na Argentina e no México. De fato, em 2017 a Cambridge
Analítica abriu uma subsidiária no Brasil e provocou um impacto notável nas
eleições presidenciais que deram a vitória a Jair Bolsonaro. Através de falsas
notícias e publicidade torpe contra o Partido dos Trabalhadores, o ex-militar
conseguiu chegar ao topo do poder no Brasil. Casos semelhantes ocorreram no
México e na Argentina, onde empresas e candidatos estavam envolvidos na compra
de informações dos eleitores
(https://www.celag.org/cambridge-analytica-el-big-data-y-su-influencia-en-las-
eleições /). Por trás dessas “empresas de votos” estão os interesses do governo
dos Estados Unidos, pois os candidatos apoiados são de tendência conservadora.
Em outras palavras, uma das novas frentes de ação da política
intervencionista da Casa Branca é a manipulação das eleições. No caso
colombiano, foi notável a última disputa presidencial em que a campanha do
candidato progressista Gustavo Petro foi sistematicamente atacada com rumores e
fatos falsos. As redes sociais tornaram-se, consequentemente, o novo cenário de
batalha dos grupos econômicos. De fato, a manipulação como estratégia política
foi revelada no plebiscito pela paz que o “Não” ganhou por uma margem estreita.
O gerente dessa campanha, Juan Carlos Velez reconheceu a rede de manipulação
que atacou o processo de paz
(https://www.semana.com/nacion/articulo/plebiscito-por-la-paz-juan-carlos-velez
-revela-Estrategia-y-financeiras-del-no / 497938). Não é de admirar que, por
trás, estivessem os interesses do Pentágono, que finalmente conseguiram a
vitória com o seu candidato fantoche, Ivan Duque.
A influência nas eleições na América Latina não é, no entanto, o maior
problema que o continente enfrenta. A declaração do presidente Trump, de
considerar a intervenção militar, juntamente com as declarações do jornal
brasileiro Folha de São Paulo, segundo as quais seria orquestrada uma coalizão
para intervir no governo venezuelano, acendem os alarmes sobre o alcance que
terá o novo relacionamento de Trump com governos de direita do continente
(https://www.larepublica.co/economia/medio-brasileno-asegura-que-duque-y-bolsonaro-planean-intervenir-en-venezuela-2787961).
Durante sua campanha, Jair Bolsonaro concordou com uma ação militar para
derrubar o presidente Nicolás Maduro e, de maneira dissimulada, os governos
vizinhos apoiaram essa medida. Embora o ministro das Relações Exteriores
colombiano Carlos Holmes Trujillo tenha negado as acusações de estar
organizando uma “coalizão”, a realidade é que está se desenvolvendo um plano
para atacar o governo Bolivariano e, por trás de tudo, estão as garras da águia
imperial.
O triângulo de influência de Washington é completado com a “ideologia do
desequilíbrio”, isto é, com a tendência impositiva de dirigir o mundo livre sob
certos parâmetros que atualmente são baseados apenas na proteção dos grandes
capitais. O desequilíbrio é posto na impossibilidade de contrariar estas
orientações. A Casa Branca não está interessada em ter parceiros, mas
subordinados; não se preocupa com a segurança do continente, muito menos com
sua prosperidade, só se preocupa em aprofundar as relações de desigualdade e
formar elites locais que não se opõem aos seus interesses.
As visitas do ex-secretário de Estado Rex Tillerson a certos países da
América Latina no início de 2018 e do novo secretário de Estado Mike Pompeo em
fins do mesmo ano confirmaram, de um lado, o desejo de se intrometer nos
assuntos internos conforme o caso venezuelano e, por outro, a falta de
interesse e desprezo que Donald Trump sente pelos países do sul.
A partir dessa perspectiva, estamos presenciando uma nova era de
relações entre a América Latina e os Estados Unidos, baseadas tão somente na
visão anacrônica do “quintal”. Para o governo Trump, os países do sul só trazem
problemas de imigração, são os culpados do aumento do tráfico de drogas e do
aumento das taxas de criminalidade. Além disso, contam com classes dominantes
locais que traem a dignidade de seu próprio povo e seguem cegamente as
diretrizes do Pentágono. O sucesso da administração Trump foi minar a unidade e
a confiança das nações latino-americanas. Para isso, utilizou influências
ideológicas, militares e eleitorais para ganhar o controle dos negócios no
continente, sempre olhando com desprezo para os países de nossa região. Por
essa razão, não deve ser descartado que por trás da onda de “endireitamento” na
América Latina está o governo dos Estados Unidos, promovendo a segurança em
detrimento dos direitos humanos e a barbárie em nome da liberdade.
Tradução: Partido Comunista Brasileiro (PCB)
Fonte:
http://www.resumenlatinoamericano.org/2019/02/03/analisis-america-latina-la-zona-de-influencia-del-gobierno-trump/
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