"A adoção da medida, que teria um forte efeito simbólico, é examinada pelo presidente, pelo chanceler Mauro Vieira e por mim", disse o assessor especial.
Por Tereza Cruvinel (Jornalista)
12 de junho de 2025
Assessor especial da Presidência, Celso Amorim -
15/08/2024 (Foto: REUTERS/Andressa Anholete)
O embaixador Celso Amorim, assessor internacional
do presidente Lula, confirmou ao Brasil247 que o Brasil está considerando a
possibilidade de romper acordos militares com Israel, em sinal de da forte
reprovação do governo brasileiro ao genocídio na Faixa de Gaza e a todas as
práticas do governo israelense contra a população palestina, incluindo o
impedimento da chegada de ajuda humanitária, como ocorreu esta semana com o
aprisionamento da chamada "Flotilha da Liberdade".
A tensão no relacionamento bilateral escalou esta
semana com o arresto dos ativistas que conduziam o navio da Flotilha, o
Madleen, entre os quais o brasileiro Thiago Ávila. Preso e colocado em
solitária, ele está em greve de fome desde ontem e pode ser deportado a
qualquer hora. O Itamaraty condenou a interceptação ilegal do barco e o
sequestro dos tripulantes e trabalha pela libertação de Thiago.
Na quarta-feira (11) Amorim recebeu um grupo de
parlamentares e da Fepal (Federação Árabe-Palestina), aos quais admitiu que o
assunto estava em análise, como forma mais concreta de resposta à conduta de
Israel, que qualificou de “desumana e totalmente contrária à moral e à ética”.
A informação acabou sendo divulgada por alguns dos participantes e foi
publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo como se fosse uma decisão já tomada,
o que foi corrigido pelo embaixador em nota oficial.
Na manhã desta quinta-feira procurei o embaixador
para saber se haveria alguma decisão nas próximas horas sobre a hipótese de
rompimento dos acordos militares e ele me respondeu:
--Repito o que eu disse a eles. A adoção desta
medida, que teria um forte efeito simbólico, expressando nosso absoluto rechaço
ao que Israel vem fazendo, é uma hipótese que está sendo examinada pelo
presidente, pelo chanceler Mauro Vieira e por mim, naturalmente. Muitos
aspectos precisam ser considerados e isso é que está sendo feito.
Um dos aspectos, certamente, envolve a reação dos
militares brasileiros, que prezam muito a cooperação com Israel e reagiram
fortemente, há poucos meses, quando houve a decisão de suspender as negociações
de um acordo de fornecimento de alto valor.
Rompimento de relações é decisão
complexa
No encontro de quarta-feira, Amorim foi questionado
sobre a razão pela qual o Brasil, apesar da reiterada condenação do genocídio,
ainda não rompeu relações diplomáticas com Israel. Fiz a mesma pergunta, que
sempre nos chega pelos internautas da Comunidade 247.
O rompimento, disse-me o embaixador, é algo mais
complexo do que se pensa no senso comum. O Brasil mantém sua embaixada em Tel
Aviv, embora sem um embaixador desde a crise diplomática ocorrida quando o
presidente Lula associou as ações israelenses ao Holocausto. Fechá-la, segundo
Amorim, prejudicaria muito o atendimento aos brasileiros que vivem em Israel e
na Jordânia, e mesmo em Gaza. A embaixada em Tel Aviv, muitas vezes, possui
melhores condições para ajudar estas pessoas, como se viveu naquela remoção dos
brasileiros no início da guerra.
Assim, o rompimento de relações diplomáticas não
parece estar no horizonte do governo.
Relações pragmáticas
As relações militares entre Brasil e Israel sempre
tiveram foco na cooperação técnica, com momentos de aproximação e
distanciamento, dependendo dos governos e contextos internacionais.
Israel é um dos principais fornecedores de
tecnologia militar ao Brasil, especialmente em áreas como Sistemas de
vigilância e drones, equipamentos de comunicação militar, modernização de
veículos blindados e aviões. Empresas israelenses como a Elbit Systems têm
forte presença no Brasil, incluindo fábricas e joint ventures, como a AEL
Sistemas em Porto Alegre, que fornece peças para caças da Força Aérea
Brasileira.
Durante os governos Lula e Dilma a relação militar
se manteve técnica, mas havia um certo distanciamento político em razão da
posição crítica do Brasil à ocupação israelense na Palestina. Já no
governo Bolsonaro houve um estreitamento ideológico e militar com Israel, que
Bolsonaro visitou em 2019.
A Elbit e a Ares Aeroespacial (outra subsidiária
israelense) participaram de projetos de modernização dos blindados EE-9
Cascavel do Exército Brasileiro. A Ares fornece ao Exército e à Marinha as
torres Remax, de armas remotamente controlada, sistemas de armas para
navios-patrulha, com o sistema Typhoon, também de uso remoto. Estes e outros
equipamentos são produzidos no Brasil, com transferência de tecnologia prevista
em contratos.
Por tudo isso, o rompimento militar não é simples e enfrentaria
resistências militares. Por outro lado, as compras brasileiras, pelo volume,
contribuem para a sustentação econômica do governo de Netanyahu. As Estimativas
de especialistas indicam que os contratos militares entre Brasil e Israel,
incluindo parcerias industriais, superam US$ 1 bilhão desde o início dos anos
2000. O Brasil é, em alguns anos, um dos cinco principais destinos de
exportação de armamentos israelenses.

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