Ainda Estou Aqui resgata a memória de Eunice Paiva e nos mostra que anistia é a pior solução para os que assassinam e subvertem a democracia, diz Aquiles Lins
Fernanda Torres vence prêmio de melhor atriz no
Globo de Ouro 2025 (Foto: Reprodução)
A vitória de Fernanda Torres no Globo
de Ouro de melhor atriz pelo filme Ainda Estou Aqui transcende
a celebração de um feito histórico para o cinema brasileiro. O prêmio é, acima
de tudo, um convite à reflexão sobre a importância de preservar a memória e
buscar justiça pelos crimes cometidos durante a Ditadura Militar brasileira.
Na obra dirigida por Walter Salles,
Fernanda interpreta Eunice Paiva, advogada e viúva do deputado federal Rubens
Paiva, morto sob tortura em 1971 após ser sequestrado por agentes do regime. A
premiação não apenas reconhece o talento de Fernanda Torres, mas também dá visibilidade
a uma história que o Brasil ainda luta para enfrentar. Eunice Paiva simboliza a
resiliência em meio à dor e a busca incansável por justiça, mesmo diante de um
Estado que se recusou a reconhecer seus crimes por décadas. O discurso de
Fernanda Torres ao receber o prêmio reflete a força da arte como resistência. A
atriz dedicou a premiação à mãe, Fernanda Montenegro, que há 25 anos venceu o
Globo de Ouro de melhor filme estrangeiro com Central do Brasil, também
dirigido por Walter Sales.
A celebração de Ainda Estou
Aqui em uma premiação internacional como o Globo de Ouro é um lembrete
de que a cultura pode ser uma ponte para revisitar o passado e iluminar os
erros que não podem ser repetidos. Enquanto o país não se comprometer
plenamente com a justiça e a reparação, as feridas da Ditadura continuarão
abertas.
O reconhecimento internacional do filme, impulsionado pelo talento de Fernanda Torres e pela coragem das histórias que ele conta, é um passo importante para que o Brasil não se esqueça de seu passado e para que a sociedade reforce seu compromisso com os direitos humanos e a democracia.
Importância da memória
A Ditadura Militar brasileira
(1964-1985) deixou um rastro de violência que ainda ecoa na sociedade. Apesar
das inúmeras evidências de tortura e assassinatos políticos, a Lei da Anistia
de 1979 blindou os responsáveis de qualquer julgamento, legando-nos uma ferida
aberta que impede o país de avançar plenamente na consolidação de sua
democracia.
Nesse contexto, trabalhos como o de
Marcelo Rubens Paiva e produções cinematográficas como Ainda Estou Aqui desempenham
um papel crucial. Eles dão voz às vítimas e às famílias, preservando memórias
que o tempo e a negligência institucional tentam apagar. Mais do que relatos
históricos, são lembretes da urgência de um debate nacional sobre a
responsabilização de quem violou direitos humanos.
Instituída em 2011 pela presidente
Dilma Rousseff, a Comissão Nacional da Verdade (CNV) documentou graves
violações contra os direitos humanos cometidas pelo regime militar,
identificando responsáveis e resgatando histórias de centenas de vítimas.
Embora seu relatório final tenha sido um marco, os avanços na reparação às
famílias e na responsabilização dos agentes da repressão permanecem tímidos. O
caso de Rubens Paiva, cujo corpo jamais foi encontrado, expõe as lacunas de um
país que ainda convive com os fantasmas do autoritarismo. Sua história só veio
à tona oficialmente mais de 40 anos após sua morte, revelando o impacto do
silêncio e da impunidade na consolidação da verdade histórica.
A luta de Eunice Paiva não foi em vão. Hoje,
familiares de vítimas de crimes cometidos pela Ditadura Militar já podem ir ao
cartório e solicitar a retificação da certidão de óbito para constar que seus
entes foram vítimas de “morte não natural, violenta, causada pelo Estado a
desaparecido no contexto da perseguição sistemática à população identificada
como dissidente política no regime ditatorial instaurado em 1964”. Ainda Estou
Aqui nos mostra que anistia é a pior solução para os agentes do estado que
assassinam e subvertem a democracia.
Assista o comentário sobre o filme:
https://www.youtube.com/watch?v=E7J7uCedKys&list=UU_M1ek8fhnDkz5C2zfkTxpg
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