No último dia de
governo, Mourão reduziu em 50% alíquotas do PIS/Pasep e da Cofins sobre
receitas financeiras, gerando impacto sobre contas de 2023
(Foto: © Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil |
Ricardo Stuckert)
Infomoney - O governo
do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ingressou no Supremo Tribunal
Federal (STF) com uma ação declaratória de constitucionalidade (ADC) para
garantir a legitimidade e a eficácia imediata de decreto que restabeleceu
alíquotas de contribuição para os Programas de Integração Social e de Formação
do Patrimônio do Servidor Público (PIS/Pasep), a Contribuição para o
Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e outros tributos desonerados no
“apagar das luzes” por Hamilton Mourão (Republicanos-RS), vice-presidente da
gestão anterior.
O decreto nº 11.374/2023, assinado no primeiro dia da atual administração, revoga três peças assinadas em 30 de dezembro por Mourão – que exercia a Presidência da República, uma vez que Jair Bolsonaro (PL) já estava fora do país, em viagem aos Estados Unidos. As medidas estabeleciam vigor a partir da publicação no Diário Oficial da União, produzindo efeitos a partir de 1º de janeiro de 2023.
Entre os itens
revogados pela nova norma estão:
1) Redução das
alíquotas do PIS/Pasep (de 0,65% para 0,33%) e da Cofins (de 4% para 2%)
incidentes sobre receitas financeiras, inclusive decorrentes de operações
realizadas para fins de hedge, auferidas pelas pessoas jurídicas sujeitas ao
regime de apuração não-cumulativa das contribuições;
2) Desconto de 50%
para as alíquotas do Adicional ao Frete para a Renovação da Marinha Mercante; e
3) Ampliação de
benefícios fiscais no âmbito do Programa de Apoio ao Desenvolvimento
Tecnológico da Indústria de Semicondutores (Padis), retomando o teto de 13,10%
para o valor do crédito financeiro calculado sobre o dispêndio efetivamente
aplicado em atividades de pesquisa, desenvolvimento e inovação.
Logo que assumiu o
comando da Fazenda, o ministro Fernando Haddad (PT) disse que as medidas
adotadas por Mourão causaram um prejuízo “irrecuperável” de até R$ 15 bilhões –
“a não ser que haja uma suspensão das medidas pelo Judiciário”.
Já na Ação
Declaratória de Constitucionalidade, o governo federal alega que a redução de
50% nas alíquotas de PIS/Pasep e Cofins teria impacto orçamentário-financeiro
negativo estimado em R$ 5,823 bilhões para o ano de 2023.
Em tese, qualquer
decisão que represente aumento de carga tributária precisa cumprir noventena
(isto é, 90 dias de carência para passar a valer). Caso o raciocínio seja
aplicado no caso concreto, as desonerações concedidas por Mourão poderiam
vigorar por três meses antes de serem desfeitas – daí o impacto estimado pelo
governo e o imbróglio gerado.
Na ação apresentada
ao Supremo Tribunal Federal, a Advocacia-Geral da União (AGU) salienta o
caráter “completamente atípico” da situação em análise. “Não há nenhuma
hipótese fática ou jurídica anterior que se assemelhe à discussão contida
nestes autos, o que demanda uma total particularidade para a compreensão da
questão e sua consequente resposta”, diz a peça.
“O cenário, em
síntese, é o seguinte: o Decreto n° 11.322/2022 entrou em vigor no dia
30/12/2022 com previsão expressa de produção de efeitos somente a partir de
171/2023, mas foi revogado pelo Decreto n° 11.374/2023, justamente nesta mesma
data, com a manutenção do percentual das alíquotas anteriormente vigentes desde
2015”, explica.
“Não é difícil
perceber que a redução de alíquota implementada pelo Decreto n° 11.322/2022
jamais chegou a se aplicar, porquanto revogada no mesmo dia em que se iniciaria
a sua eficácia. Trata-se de uma disposição natimorta, que não veio a produzir
efeitos na esfera jurídica dos contribuintes”, argumentam os requerentes.
A União destaca que
ao menos 279 ações impetradas por contribuintes, em um mês, para garantir o
recolhimento dos tributos com as alíquotas reduzidas, sob alegação de que o
decreto assinado no primeiro dia de governo representa aumento de carga e
precisa respeitar o princípio da anterioridade nonagesimal.
“A prática de
negar-se aplicação ao Decreto n° 11.374/2023 – que excluiu do mundo jurídico o
natimorto Decreto n° 11.322/2022 implica afronta direta à Constituição da
República e tem gerado quadro de incerteza e insegurança jurídica, além de
comprometer severamente o equilíbrio das contas públicas, em razão da
desarrazoada renuncia de receita”, prosseguem os requerentes.
“O Decreto n°
11.322/2022 pretendeu reduzir significativamente as alíquotas do PIS/COFINS na
véspera da posse de um novo governo, interferindo direta e negativamente na
arrecadação da União, de modo que pode vir a comprometer a realização de
investimentos estatais e a prestação de serviços públicos essenciais”,
salientam.
A AGU pede a
suspensão da eficácia de decisões judiciais que tenham afastado a aplicação do
decreto editado por Lula restabelecendo as alíquotas, o reconhecimento de não
cabimento do princípio da anterioridade nonagesimal no caso analisado e a
declaração de inconstitucionalidade do decreto assinado por Mourão, sob
alegação de “afronta aos princípios republicano, da moralidade e da
proporcionalidade”. O caso está sob a relatoria do ministro Ricardo
Lewandowski.
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