"Bolsonaro e seus aliados estão comprando a eleição
e ninguém faz nada", escreve o jornalista Mario Vitor Santos (*)
13 de julho de 2022
Plenário da Câmara dos Deputados e Jair Bolsonaro
no detalhe (Foto: Michel Jesus/Câmara dos Deputados | REUTERS/Adriano Machado)
Bolsonaro e seus aliados estão comprando a eleição e ninguém faz nada. O Congresso, dominado pelo Centrão do presidente da Câmara, Arthur Lira, e do Senado, Rodrigo Pacheco, comanda uma derrama de recursos do escandaloso Orçamento secreto, subornando parlamentares e espargindo recursos para impulsionar campanhas de centenas de picaretas.
Para a aprovação de uma imensa – essa sim - pedalada fiscal surge a PEC dos benefícios, engendrada em afronta à lei eleitoral e a cláusulas pétreas da Constituição. Insere-se nela um monstrengo chamado "estado de calamidade" que, para permitir a compra eleitoral, subverte a própria ordem democrática, criando uma legislação de exceção para furar os bloqueios legais até agora existentes para a concessão de benesses ao eleitor na véspera de eleições. Poderia ser mais propriamente chamada de “PEC-para-levantar-pesquisas”.
Não existem limites para a voracidade pecuniária e
a sede de poder de Bolsonaro e seus sequazes no Congresso, obtida pela omissão
de Rodrigo Pacheco, presidente do Senado, e pela participação de Arthur Lira,
seu colega da Câmara, ocupante da cadeira que já foi de Eduardo Cunha. Juntos
perpetraram golpe inédito contra as proteções à fidelidade do voto ao eleitor e
à paridade de condições dos candidatos na disputa.
Não há por que ocultar a realidade. Aprovar esse
esdrúxulo estado de calamidade foi na verdade precipitar o país em um
despenhadeiro eleitoral, pois todos sabem que não está ocorrendo propriamente
calamidade alguma.
Trata-se na verdade de escancarar de vez as portas de
um estado de exceção, ou seja, de um arremedo legal desviante voltado para
aditivar as chances eleitorais do presidente, num artifício especial, um
vale-tudo com os recursos e as “instituições”, a começar por subverter a
“pureza” do voto.
O pior, o mais ao mesmo tempo secreto e
escandalosamente corrupto Congresso da história brasileira, o Congresso de
2018, agiliza pacotes de benefícios, em diversos prazos e níveis, intervindo
nos recursos e negócios de milhares de entes administrativos em todas as
esferas de governo, tudo sugado para aplacar a aflição do suserano do Planalto
e sua horda.
Serão bilhões de reais para enfartar a já moribunda
democracia e comprar uma eleição. A ordem constitucional de 88 vai virando pó a
cada instante enquanto os que mais precisam dela contemplam inertes sem
entender por quê. Nem sequer parecem ter consciência da suposta importância da
Carta que todos homenageiam e poucos seguem.
Difícil uma Constituição resistir a tantos ataques,
iniciados por uma guerra sem tréguas, agudizada contra os governos petistas,
protagonizada em todos os momentos pela própria corte constitucional.
Perfuradas as fundações da cidadela, agora, como se diz em espanhol, “todo se
vá por abajo”.
Com tudo isso, a oposição pode vencer as eleições
presidenciais. Pode vir a tomar posse e governar, quem sabe, mas num cenário de
tamanha devastação que talvez tenha em si até um lado positivo: não haverá
razões para manter mais uma vez vãs esperanças sobre a neutralidade, isenção ou
funcionalidade de instituições inexistentes ou que só existem sob certas
condições.
Nesta hipótese, se não houver golpe e se Bolsonaro
não vencer o pleito, com Lula no governo, impõe-se uma pergunta: haverá
liderança política, orgânica e ideológica na esquerda capaz de conduzir as
ações necessárias, num campo de batalha política como o que vem se delineando,
sem eira nem beira, sem convenções, sem ilusões nem nostalgia de ordem, sem
separação entre rua e plenário, entre selva e cidade, mais próximo do “mato ou
morro”, invado ou sou invadido?
Pode ser que TSE ou STF despertem em e anulem o
golpe da calamidade. É provável, porém, que institucionalizem de um ou outro
modo, por medo, essa autêntica, descarada e definitiva fraude eleitoral. Nessa
hipótese, será necessário estar preparados para, mesmo banhados na mais
desenvolvida tecnologia de comunicação, agir nesse “estado de natureza” e
regressão política cujos sinais todos sentem.
EM TEMPO: Convém lembrar que a "PEC Eleitoral" só vale até dezembro de 2022.
(*) Mario Vitor Santos é jornalista.
É colunista do 247 e apresentador da TV 247. Foi ombudsman da Folha e do portal
iG, secretário de Redação e diretor da Sucursal de Brasilia da Folha.
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