O GLOBO - Ivan Martínez-Vargas
seg., 25 de julho de 2022
A Faculdade de Direito da
Universidade de São Paulo (USP) divulga nesta terça-feira um manifesto de
juristas, empresários, artistas, advogados e entidades da sociedade civil em
defesa da democracia. O texto tem mais de 3 mil assinaturas e é uma resposta
aos reiterados ataques de Jair Bolsonaro (PL) ao sistema eleitoral e às
instituições, embora não mencione diretamente o nome do presidente. Após o
manifesto, haverá um evento no Largo de São Francisco, no dia 11 de agosto, em
defesa da democracia brasileira.
Banqueiros como Roberto Setubal, João
Moreira Salles e Candido Bracher (acionistas e ex-presidente do Itaú Unibanco,
respectivamente), além do presidente do Credit Suisse no Brasil, José Olympio
Pereira, estão entre os que assinaram o texto que critica a retórica de
Bolsonaro. A informação é do diretor da faculdade, Celso Campilongo.
Também subscrevem o texto empresários
como Guilherme Leal, Pedro Passos e Fabio Barbosa (da Natura), Horácio Lafer
Piva (ex-presidente da Fiesp) e Walter Schalka (presidente da Suzano).
“Ataques infundados e desacompanhados
de provas questionam a lisura do processo eleitoral e o Estado Democrático de
Direito tão duramente conquistado pela sociedade brasileira. São intoleráveis
as ameaças aos demais poderes e setores da sociedade civil e a incitação à
violência e à ruptura da ordem constitucional”, diz o texto, em alusão à
retórica golpista de Bolsonaro.
Ao abordar o período eleitoral, o
texto afirma: “ao invés de uma festa cívica, estamos passando por momento de
imenso perigo para a normalidade democrática, risco às instituições da
República e insinuações de desacato ao resultado das eleições”. A carta também
defende as urnas eletrônicas, que classifica como "seguras e
confiáveis", em contraposição aos ataques de Bolsonaro, sem provas, ao
sistema eleitoral.
O documento ainda diz que os
signatários vão “deixar ao lado divergências menores em prol de algo muito
maior, a defesa da ordem democrática”.
Continue lendo
Intitulada de Carta aos Brasileiros,
o texto é uma reedição do documento homônimo lido, em agosto de 1977, em pleno
regime militar, pelo professor de direito Goffredo da Silva Telles Junior no
mesmo Largo de São Francisco. À época, a carta denunciava o autoritarismo e a
ilegitimidade da ditadura militar e o estado de exceção no qual o país se
encontrava.
Entre os signatários da carta de
2022, estão ainda dez ex-ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), entre os
quais Celso de Mello, Sepúlveda Pertence, Carlos Velloso, Carlos Ayres Britto e
Eros Grau.
Assinam, também, os ex-ministros
Pedro Malan (Fazenda), Celso Lafer (Fazenda e também Relações Exteriores), o
ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga e o ex-governador do Espírito
Santo, Paulo Hartung. Entre os artistas, está Chico Buarque de Holanda..
O manifesto foi organizado em várias
frentes, de acordo com Campilongo, e teve a colaboração do advogado Floriano
Peixoto Marques Neto, professor da USP, de membros da Comissão Arns e de outros
juristas. Entre os advogados, assinam Miguel Reale Júnior, Alberto Toron, Lenio
Streck, Tércio Sampaio Ferraz Júnior, Belisario dos Santos Junior e Rubens
Naves.
— Faremos no dia 11 de agosto uma
homenagem aos tribunais superiores, com participação de entidades da sociedade
civil e da iniciativa privada. Convidamos a Fiesp, por exemplo, e diversos
empresários, além de ministros do STF e do Tribunal Superior Eleitoral. A carta
também será lida ao público — informa Campilongo.
Manifesto dos empresários
Empresários ouvidos pelo GLOBO em
condição de anonimato afirmam que o comando da Fiesp também tem articulado um
outro texto, a ser divulgado nos próximos dias, em tom similar. O documento,
impulsionado pelo presidente da entidade, Josué Gomes, já teve pelo menos duas
versões.
Um dos impasses atuais acerca do
texto, segundo uma pessoa familiarizada com o tema, se relaciona a uma menção à
defesa da Constituição pela entidade. Além disso, alguns sindicatos
empresariais que compõem a federação, como o Sindimaq (de máquinas), afirmam
não ter tido acesso ao documento.
Gomes assumiu a Fiesp em janeiro após
ser o único candidato a concorrer ao cargo, com o apoio do então presidente da
instituição, o bolsonarista Paulo Skaf. O atual líder da Fiesp é filho de José
Alencar, ex-vice-presidente nos dois mandatos de Luiz Inácio Lula da Silva.
Leia na íntegra o documento
organizado pelos advogados:
Carta aos brasileiros em defesa do
Estado Democrático de Direito
"Em agosto de 1977, em meio às
comemorações do sesquicentenário de fundação dos cursos jurídicos no país, o
professor Goffredo da Silva Telles Junior, mestre de todos nós, no território
livre do Largo de São Francisco, leu a Carta aos Brasileiros, na qual
denunciava a ilegitimidade do então governo militar e o estado de exceção em
que vivíamos. Conclamava também o restabelecimento do estado de direito e a
convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte.
A semente plantada rendeu frutos. O
Brasil superou a ditadura militar. A Assembleia Nacional Constituinte resgatou
a legitimidade de nossas instituições, restabelecendo o Estado Democrático de
Direito com a prevalência do respeito aos direitos fundamentais.
Temos os poderes da República, o
Executivo, o Legislativo e o Judiciário, todos independentes, autônomos e com o
compromisso de respeitar e zelar pela observância do pacto maior, a
Constituição Federal.
Sob o manto da Constituição Federal
de 1988, prestes a completar seu 34º aniversário, passamos por eleições livres
e periódicas, nas quais o debate político sobre os projetos para o país sempre
foi democrático, cabendo a decisão final à soberania popular.
A lição de Goffredo está estampada em
nossa Constituição: “ Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de seus
representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.
Nossas eleições com o processo
eletrônico de apuração têm servido de exemplo no mundo. Tivemos várias
alternâncias de poder com respeito aos resultados das urnas e transição
republicana de governo. As urnas eletrônicas revelaram-se seguras e confiáveis,
assim como a Justiça Eleitoral.
Nossa democracia cresceu e
amadureceu, mas muito ainda há de ser feito. Vivemos em um país de profundas
desigualdades sociais, com carências em serviços públicos essenciais, como
saúde, educação, habitação e segurança pública. Temos muito a caminhar no
desenvolvimento das nossas
potencialidades econômicas de forma
sustentável. O Estado apresenta-se ineficiente diante dos seus inúmeros
desafios. Pleitos por maior respeito e igualdade de condições em matéria de
raça, gênero e orientação sexual ainda estão longe de ser atendidos com a
devida plenitude.
Nos próximos dias, em meio a estes
desafios, teremos o início da campanha eleitoral para a renovação dos mandatos
dos legislativos e executivos estaduais e federais. Neste momento, deveríamos
ter o ápice da democracia com a disputa entre os vários projetos políticos
visando convencer o eleitorado da melhor proposta para os rumos do país nos
próximos anos.
Ao invés de uma festa cívica, estamos
passando por momento de imenso perigo para a normalidade democrática, risco às
instituições da República e insinuações de desacato ao resultado das eleições.
Ataques infundados e desacompanhados
de provas questionam a lisura do processo eleitoral e o Estado Democrático de
Direito tão duramente conquistado pela sociedade brasileira. São intoleráveis
as ameaças aos demais poderes e setores da sociedade civil e a incitação à
violência e à ruptura da ordem constitucional.
Assistimos recentemente a desvarios
autoritários que puseram em risco a secular democracia norte-americana. Lá as
tentativas de desestabilizar a democracia e a confiança do povo na lisura das
eleições não tiveram êxito, aqui também não terão.
Nossa consciência cívica é muito
maior do que imaginam os adversários da democracia. Sabemos deixar ao lado
divergências menores em prol de algo muito maior, a defesa da ordem
democrática.
Imbuídos do espírito cívico que
lastreou a Carta aos Brasileiros de 1977 e reunidos no mesmo território livre
do Largo de São Francisco, independentemente da preferência eleitoral ou
partidária de cada um, clamamos as brasileiras e brasileiros a ficarem alertas
na defesa da democracia e do respeito ao resultado das eleições.
No Brasil atual não há mais espaço
para retrocessos autoritários. Ditadura e tortura pertencem ao passado. A
solução dos imensos desafios da sociedade brasileira passa necessariamente pelo
respeito ao resultado das eleições.
Em vigília cívica contra as tentativas de rupturas,
bradamos de forma uníssona: Estado Democrático de Direito Sempre!!!!"
EM TEMPO: Até os capitalistas não querem Bozo e o fascismo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário