ESTADÃO - Redação
O presidente Jair Bolsonaro costuma repetir que não há corrupção em seu governo. O chefe do Executivo já fez essa afirmação em diversas ocasiões, formais e informais - até quando se dirigiu à Assembleia Geral da ONU, em 2021 -, tentando indicar que não tolera desvios de conduta de seus auxiliares.
Mas seu mandato, como os de seus antecessores desde
a redemocratização, também registra denúncias e suspeitas do crime envolvendo
nomes importantes da gestão federal e aliados, que geraram investigações como a que levou à prisão do
ex-ministro Milton Ribeiro, da Educação.
© Fornecido por Estadão Embora Bolsonaro alegue não haver condutas ilegais em seu governo, gestão foi marcada por denúncias de corrupção envolvendo auxiliares e aliados. Foto: Ueslei Marcelino/Reuters
Relembre dez acusações de corrupção nas quais integrantes ou aliados do governo Bolsonaro foram ou são acusados de envolvimento.
Outubro de 2019: Ministro do Turismo
Em outubro de 2019, a Polícia Federal indiciou o então ministro Marcelo Álvaro Antônio, do Turismo, no inquérito da Operação Sufrágio Ostentação – investigação sobre suposto desvio de recursos por meio de candidaturas femininas laranja nas eleições 2018. A PF imputou ao ministro de Bolsonaro os crimes de falsidade ideológica, associação criminosa e apropriação indébita. Na ocasião, Marcelo Álvaro Antônio ocupava o posto de presidente do PSL em Minas.
À época, o presidente disse que
pretendia manter o ministro no cargo e ‘aguardar o desenrolar do processo’.
Segundo as investigações, o então partido do presidente Bolsonaro - ele saiu do
PSL em novembro daquele ano - utilizou candidatas em disputas de fachada para
acessar recursos de fundo eleitoral exclusivo para mulheres. Os investigadores
atribuem ao ministro o papel de articulador do esquema de laranjas.
Abril de 2021: Ricardo Salles
Em abril de 2021, o então ministro
Ricardo Salles, do Meio Ambiente, foi
acusado de dificultar a ação de fiscalização ambiental e
patrocinar diretamente interesses privados de madeireiros investigados por
extração ilegal de madeira. Segundo notícia-crime encaminhada pela PF para
o Supremo Tribunal Federal (STF),
Salles, “na qualidade de braço forte do Estado”, integrava organização
criminosa orquestrada por madeireiros alvos da Operação Handroanthus com o
objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza.
Maio de 2021: Tratoraço
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Em maio de 2021, o Estadão deu início à série de
reportagem que revelou um esquema montado pelo presidente Bolsonaro para manter
sua base de apoio no Congresso. O chefe do Executivo criou, em
parceria com o Congresso, o chamado orçamento secreto. O primeiro lote de emendas
exposto pela reportagem incluia a liberação de R$ 3 bilhões. Boa parte dessas emendas foi
destinada à compra de tratores e equipamentos agrícolas por preços até 259%
acima dos valores de referência fixados pelo governo.
© Fornecido por Estadão Estadão revelou esquema do 'orçamento secreto', no
qual o governo passou a beneficiar base de apoio com emendas do tipo RP9. Foto:
Dida Sampaio/Estadão
No esquema montado por Bolsonaro,
parlamentares que apoiavam o governo conseguiam mais recursos em emendas para
seus redutos eleitorais. O caso virou alvo de investigação por parte da
Controladoria-Geral da União (CGU) e do Tribunal de Contas da União (TCU). O
Supremo Tribunal Federal determinou mudanças no esquema do orçamento secreto,
cobrando mais transparência na dotação das emendas. O Congresso, até o momento,
atendeu apenas em parte a determinação.
Maio de 2021: George Divério
No mesmo mês, o governo
federal teve de demitir George da Silva Divério do cargo de
Superintendente Estadual do Ministério da Saúde no Rio de Janeiro devido a uma
suspeita de corrupção. Ele, que é coronel do Exército, havia sido nomeado para
o cargo pelo então ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello.
O caso veio à tona após reportagem do
Jornal Nacional, da TV Globo. Segundo a emissora, Divério assinou, em novembro
de 2020, contratos de R$ 29 milhões com duas empresas, sem licitação, para
fazer reformas em prédios da pasta no Estado. As obras foram consideradas
urgentes, por isso a licitação foi dispensada. Depois de assinados, os
contratos foram anulados pela Advocacia-Geral da União (AGU), que não constatou
razão para a dispensa de licitação.
Junho de 2021: Covaxin
Em plena pandemia e em meio à Comissão
Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid, mais uma denúncia de corrupção foi
desvelada na Saúde. Documentos do Ministério das Relações Exteriores mostraram
que o governo
aceitou negociar a compra da vacina indiana Covaxin por um preço 1.000% maior
do que, seis meses antes, era anunciado pela própria fabricante.
A ordem para a aquisição da vacina
partiu pessoalmente do presidente Jair Bolsonaro e a negociação durou somente
cerca de três meses, um prazo bem mais curto que o de outros acordos. Os
recursos para a compra da vacina chegaram a ser empenhados pelo governo, mas,
após investigação da CGU, a aquisição foi suspensa. Depoimentos à CPI da Covid
mostraram a pressão interna para acelerar a compra da Covaxin, o que foi
decisivo para o pedido de indiciamento do relatório final que pesou sobre o
próprio Bolsonaro e o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazzuelo.
Junho de 2021: Propina de US$ 1
Em junho de 2021, o ex-diretor do Departamento de Logística do Ministério da Saúde Roberto Ferreira Dias foi acusado de pedir propina para autorizar a compra de vacinas pelo governo. Segundo a denúncia, ele teria condicionado a aquisição de imunizantes da AstraZeneca ao recebimento ilícito de US$ 1 por dose. Dias chegou ao cargo por apadrinhamento do Centrão e foi exonerado do posto em 29 de junho, depois da denúncia. Ele foi alvo da CPI da Covid e chegou a receber ordem de prisão durante sua oitiva.
Março de 2022: Gabinete paralelo do MEC
O Estadão revelou que dois
pastores capturaram o Ministério da Educação e passaram a interferir na agenda
do então titular da pasta, Milton Ribeiro, para privilegiar
determinados municípios no empenho de recursos do órgão. Gilmar dos Santos e
Arilton Moura levam demandas de prefeitos a Ribeiro e conseguem a liberação dos
recursos em tempo recorde.
Os municípios mais beneficiados são
aqueles governados pelos partidos do Centrão - PL, Republicanos e
Progressistas. Em conversas reveladas pelo Estadão, os próprios pastores admitem priorizar as demandas de
prefeitos ligados à igreja Assembleia de Deus, da qual eles fazem parte.
O ex-ministro Ribeiro acabou preso
pela Polícia Federal no âmbito da investigação sobre o caso.
© Fornecido por Estadão O ex-ministro da Educação Milton Ribeiro é alvo de
mandado de prisão preventiva devido ao 'gabinete paralelo' do MEC. Foto:
Abril de 2022: Ônibus escolares
Em abril deste ano, o Estadão revelou que uma licitação
bilionária do Fundo
Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) previa a compra
de ônibus escolares com preços inflados. O alerta partiu de instâncias de
controle e da própria área técnica do fundo. Segundo documentos obtidos pela
reportagem, o governo aceitava pagar até R$ 480 mil por um ônibus que, de
acordo com o setor técnico, deveria custar no máximo R$ 270,6 mil. Os recursos
sairiam de um programa destinado a atender crianças da área rural, que precisam
caminhar a pé quilômetros em estradas de terra para chegar à escola.
Após a publicação da reportagem, o
governo recuou e reduziu na véspera as cotações dos veículos. Por fim, o pregão
ficou R$ 500 milhões a menos do que o governo estava disposto a pagar quando os
preços estavam superestimados.
Abril de 2022: Escolas fake
Também em abril, o Estadão mostrou que, apesar da
falta de recursos para terminar 3,5 mil escolas em construção há anos, o MEC
autorizou a construção de outras 2 mil unidades. Bom para mostrar no palanque
de campanha, o projeto não tinha recursos previstos no orçamento, e só faria
aumentar o estoque de escolas não entregues pelo governo e esqueletos de obras
inacabadas. Mesmo assim, os colégios já vinham sendo anunciados por deputados e
senadores aos seus eleitores.
O esquema de “escolas fake” tinha
como base o FNDE, controlado pelo ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, por
meio de um apadrinhado. O fundo precisaria ter R$ 5,9 bilhões para tocar todas
as novas escolas contratadas. Com o orçamento atual, levaria 51 anos para isso.
Maio de 2022: Farra do caminhão do lixo
Em maio, o Estadão revelou que o investimento
público federal com coleta de lixo virou foco de despesas milionárias
crescentes e fora do padrão nos últimos anos.
Nas mãos do Congresso e do governo, a
compra e distribuição de caminhões de lixo para pequenas cidades saltaram de 85
para 488 veículos de 2019 para 2021.
Avaliados com cuidado, esses gastos
revelam transações difíceis de entender, como a da cidade do interior de
Alagoas que tem menos lixo do que caminhões para recolhê-lo ou a diferença de
R$ 114 mil no preço de veículos iguais, comprados no espaço de apenas um mês.
© Fornecido por Estadão. Falta de critérios para destinação dos caminhões de
lixo levantou suspeita de corrupção. Foto: Wilton Junior/Estadão
A distribuição de caminhões
compactadores de lixo é usada por senadores, deputados e prefeitos para ganhar
a simpatia e o voto dos eleitores de cidades pobres, onde a chegada desse tipo
de auxílio é visível e faz enorme diferença. Até a publicação da reportagem, o
governo havia destinado R$ 381 milhões para essa finalidade.
A reportagem identificou pagamentos
inflados de R$ 109 milhões. A diferença dos preços de compra de modelos
idênticos, em alguns casos, chegou a 30%.
EM TEMPO: A corrupção é inerente a sociedade de economia capitalista. É imperioso que a Justiça, a PF e o Ministério Público, tenham mais autonomia e apurem todas as irregularidades ocorridas no governo Bozo para descobrirem outras ocorrências de corrupção, perseguições e diversos crimes de responsabilidade. O "Orçamento Secreto" se constitui num dos maiores esquemas de corrupção desde a redemocratização do país.
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