"Não há por que o TSE se dobrar aos ditames e
à tutela das Forças Armadas", escreve a jornalista Denise Assis (*)
6 de maio de 2022
Jair Bolsonaro, urnas eletrônicas e Forças Armadas
(Foto: Alan Santos/PR | ABr)
Por Denise Assis, para o Jornalistas pela Democracia
De que cor é o cavalo branco de Napoleão? A
pergunta lhe soa absurda? Pois muito mais são as 88 questões enviadas pelas
Forças Armadas ao Tribunal Superior Eleitoral (STE). Simplesmente porque elas
não querem dirimir dúvida alguma, mas tumultuar o processo eleitoral deste ano,
previsto para outubro. A cada soma de respostas, eles enviam mais uma rama de
perguntas, cujas respostas já estão contempladas no Código Eleitoral.
E a cada nova investida o TSE cede um pouco do seu
poder de controle sobre o pleito. Onde estão os congressistas? Onde estão as
instituições da sociedade civil que não se posicionam de maneira dura contra o
golpe em curso que já fez eco até mesmo no Estado americano?
Vamos deixar que eles venham nos “formatar”, ou
vamos nós desmascarar de vez esta farsa à qual já se incorporou o general Paulo
Sérgio Nogueira de Oliveira, que abdicou do cargo de Comandante Geral do
Exército, para ser investido no de ministro subordinado aos devaneios de um
presidente que deve demais para aceitar perder a eleição?
Bolsonaro teme trocar a faixa presidencial por um par de algemas para si e para os filhos – isto se a mulher escapar de também ser processada – e arrasta para a sua desdita o mesmo general que em Sete de Setembro do ano passado foi capaz de frear o golpe já em curso, às portas da suprema Corte. O Brasil anseia por votar no início de outubro, general, e o seu papel não é o de colocar tudo a perder.
Continue lendo
É hora de nos perguntarmos para onde foram os brios
do general? Mergulhou no lago Paranoá? Para onde foi o seu senso de
responsabilidade para com o país, que espera de alguém que permanece na ativa,
tendo sob si um contingente de quase 500 mil homens -outro grave erro e
permissividade -, a garantia da democracia e da vontade popular?
Já não menciono o “modo Barrichello” dos
presidentes do Supremo, Luiz Fux e do Senado Federal, Rodrigo Pacheco, que só
foram perceber a agudez da crise nacional, 14 dias depois de verem aquele poder
desafiado por um miliciano, “adotado” por um presidente que de longe vem dando
apoio para esse segmento do crime.
Remexam nos arquivos da Câmara e o verão lamentar
em discurso, que os milicianos do Rio de Janeiro não estivessem tão organizados
quanto os da Bahia. Pesquisem os anais da Assembleia do Rio de Janeiro (Alerj)
e lá encontrarão homenagens de Flávio Bolsonaro a um policial que recebeu a
comenda em sua cela do sistema penitenciário.
Fux e Pacheco não se tocaram da gravidade do
momento, (ou se fizeram de mortos), cozinharam a crise a fogo brando até sentir
o calor do fogão nos fundilhos, motivados que foram pelo vazamento da notícia
de que o diretor da CIA, Williams Burns, que por aqui esteve em julho do ano
passado e ontem fez chegar à imprensa brasileira, pela Reuters, sua preocupação
com a corrida eleitoral no país.
E por que só agora? Porque só agora chegou às suas
mãos – e a de vários parlamentares do Congresso americano e autoridades do alto
escalão daquele país, um relatório elaborado por acadêmicos e instituições da
sociedade civil no Brasil e nos Estados Unidos, conforme noticiado pela BBC
News Brasil. Isto porque o Brasil nem sequer conta com um embaixador americano
designado para aqui servir. O dossiê de 25 páginas pede aos americanos que se
mantenham vigilantes sobre a eleição de 2022 e zelem pelas liberdades
individuais e a democracia, em sua relação diplomática com o país, acima de
interesses geopolíticos e comerciais.
"Bolsonaro está criando condições para um
ambiente eleitoral muito instável e, se perder, o mundo deve lembrar o ataque
de 6 de janeiro de 2021 ao Capitólio dos EUA e estar preparado para testemunhar
uma versão provavelmente mais extrema disso no Brasil", afirma o documento
ao qual a BBC News Brasil teve acesso.
A pouco mais de cinco meses das eleições, membros
do alto escalão do governo Joe Biden e do Congresso dos Estados Unidos tomaram
conhecimento que, tal como nos anos de 1970, o Brasil se prepara para uma
“quartelada”, ou o que quer que esteja Bolsonaro preparando, com a conivência
das Forças Armadas. É vergonhoso, é démodé, é ação de republiqueta.
Não há por que o TSE se dobrar aos ditames e à
tutela das Forças Armadas, quando desde que as urnas eletrônicas foram criadas
em 1995, por pesquisadores do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais),
do Centro Técnico Aeroespacial e técnicos da Justiça Eleitoral, elas funcionam
perfeitamente. As urnas entraram em atividade nas eleições municipais do ano
seguinte (1996), em 57 cidades, com sucesso. E já em 2000 todo o processo
eleitoral foi eletrônico. Com o passar do tempo, o sistema se aprimorou.
As urnas são produzidas por uma empresa externa,
sob acompanhamento do TSE. Para as eleições de 2020, a fornecedora foi a
empresa americana Diebold, que já atuou em outras eleições. Para
2022, a companhia brasileira Positivo venceu a licitação do governo brasileiro
para fornecer o equipamento.
Os aparelhos contam com sistema próprio, produzido
por técnicos do TSE, e não tem conexão com a internet ou redes externas. Os votos
são armazenados em cartões de memória que, após o término da eleição, são
compartilhados com o TSE.
O processo eleitoral é claro e preciso. O seu
cargo, general Paulo Sérgio, é o de ministro da Defesa. O senhor pode ter
jurado fidelidade a um governo passageiro - espera-se -, mas enquanto general
da ativa o senhor serve ao país, ao Estado Brasileiro, e não ao governo
Bolsonaro. O senhor está, no momento, cedendo às aventuras de alguém que deve e
teme, mas ao retornar para o comando de suas fileiras, terá na sua biografia a
nódoa de ter corroborado com os delírios de alguém que ameaça arrastar o país
para uma ditadura.
(*) Jornalista. Passou pelos
principais veículos, tais como: O Globo; Jornal do Brasil; Veja; Isto É e o
Dia. Autora de "Propaganda e cinema a serviço do golpe - 1962/1964" e
"Imaculada". Membro do Jornalistas pela Democracia
Nenhum comentário:
Postar um comentário