Postado por Magno Martins às 10:00
Com edição de Ítala Alves
A Justiça Federal decidiu suspender o abate de
jumentos no Brasil para exportação à China. A medida foi tomada por 10 dos 13
desembargadores da Corte Especial do Tribunal Regional Federal da 1ª Região
(TRF-1), em Brasília, na noite da quinta-feira (3/2).
Desde 2016, o Brasil passou a exportar a couro do
animal para a produção de um remédio conhecido como ejiao, bastante popular na
China. Não há comprovação científica de que ele funcione, mas, no país
asiático, o ejiao é utilizado com a promessa de tratar diversos problemas de
saúde, como menstruação irregular, anemia, insônia e até impotência sexual. Ele
é consumido de várias maneiras, como em chás e bolos.
Para fabricar o produto, os animais são recolhidos
da caatinga e de zonas rurais do Nordeste em grande volume, sem que exista uma
cadeia de produção que renove o rebanho, como ocorre com o gado. Ou seja, eles
são abatidos em uma velocidade maior do que a capacidade de reprodução, o que
acendeu um alerta de que a população de jegues pode ser eliminada nos próximos
ano no Nordeste.
No final de dezembro, uma reportagem da BBC News Brasil mostrou que
cidades do centro-sul da Bahia se tornaram dependentes economicamente do abate
de jumentos. No entanto, o setor cresceu em consonância com o aumento da fome e
da pobreza em uma região historicamente já castigada por esses problemas, além
de denúncias de maus-tratos, contaminação de animais por mormo (uma doença
mortal), trabalho análogo à escravidão e abandono de jegues à morte por
inanição.
A decisão do TRF-1 é mais um passo jurídico de uma
ação que corre desde 2018, quando entidades de defesa do direito dos animais
entraram com um processo solicitando a proibição. Em um primeiro momento, a
Justiça da Bahia concedeu uma liminar proibindo os abates no Estado.
Em 2019, porém, a medida foi suspensa por Kassio
Nunes Marques, hoje ministro do STF e à época desembargador do TRF-1. Ele
voltou a liberar os abates atendendo a um pedido dos governos estadual e
federal, além prefeitura de Amargosa, onde funciona o maior frigorífico de
abates de jegues do país.
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O magistrado concordou com o argumento de que a
proibição do mercado prejudicava a economia do município e da Bahia. Nesta
quinta-feira, a maioria dos desembargadores do TRF-1 refutou esse argumento,
alegando que a prefeitura de Amargosa não conseguiu provar os supostos
prejuízos econômicos provocados pela suspensão inicial do setor.
"Não se demonstrou (no argumento) a existência
de uma grave lesão à economia pública", afirmou o desembargador Carlos
Eduardo Moreira Alves, que votou pela nova suspensão. Segundo ele, também não
ficou ficou comprovada a existência de uma cadeia produtiva para abate no
Brasil, o que coloca a espécie em risco. "Não há noticia de que haja
rastreabilidade em cadeias de produção ou algo semelhante com que ocorre com o
abate de gados", disse.
Já o desembargador Carlos Augusto Pires Brandão,
que também votou pela suspensão, citou a importância cultural do jumento para o
Nordeste brasileiro. "O que se vê nos autos é que a exportação é
proveniente de um animal que está muito associado às nossa tradições, à nossa
colonização e à nossa inserção no interior do Brasil", disse.
"Há músicas e poemas sobre o jumento. Há uma
música do Luiz Gonzaga (Apologia ao Jumento) que fala que o animal é nosso
irmão, que relata essa proximidade do jumento como um animal de estimação.
Imagina se a gente começa a exportar carne de cachorro e de gato para outras
culturas que não têm essa proximidade com o animal", disse.
A decisão foi comemorada por ativistas que há anos
lutam contra o mercado de ejiao no Brasil. "Recebemos a decisão com muita
felicidade, com sentimento de que vale a pena lutar pelo que é o correto. O
abate de jumentos é inaceitável do ponto de vista ético, ambiental e cultural.
Não existe motivo para exterminar um animal que faz parte da nossa história,
uma espécie com tantos laços afetivos com o Brasil", diz a advogada
Gislane Brandão, coordenadora-geral da Frente Nacional de Defesa dos Jumentos,
uma das entidades que entrou na Justiça contra o setor.
A suspensão do abate vale para todo território
nacional, mas ainda cabe recurso. Além disso, há outros processos na Justiça e
investigações do Ministério Público sobre esse mercado.
A matéria completa está disponível no portal
da BBC News Brasil.
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