O Partido Comunista Brasileiro (PCB), legítimo herdeiro do centenário movimento que, no Brasil, no ano de 1922, dá início à trajetória da mais longeva e coerente organização partidária associada às lutas da classe trabalhadora e em defesa do socialismo/comunismo, prepara uma série de atividades para comemorar essa gloriosa data.
Por meio de lançamentos de livros, seminários, programas no Canal do Poder Popular, atos públicos, pronunciamentos, artigos em nossos meios digitais e impressos, além de um documentário, vamos promover, em todos os cantos do país, por intermédio da aguerrida militância comunista e dos coletivos do PCB, o resgate histórico dessa heróica legenda, presente, desde o início do século XX até os dias atuais, em todas as lutas do povo brasileiro por direitos sociais, liberdades democráticas, soberania popular, justiça e igualdade.
A trajetória do
Partido Comunista Brasileiro (PCB), fundado em 25 de março de 1922, é parte
constitutiva da história do Brasil. Se, na sua gênese, convergiram os ideais
libertários do nascente proletariado, no seu desenvolvimento e consolidação
foram sintetizados os processos de maturação de uma organização política que
busca busca até hoje conjugar em suas fileiras os mais destacados militantes
das lutas da classe trabalhadora, dos movimentos populares e representantes da
intelectualidade e da cultura brasileira.
Quando se tornou um
verdadeiro partido de dimensões nacionais, o PCB revelou-se como a instância de
universalização de uma vontade política que fundia o mundo do trabalho com o
mundo cultural. Destacados intelectuais como Astrojildo Pereira (um de seus
fundadores), Octávio Brandão, Patrícia Galvão (Pagu), Caio Prado Jr.,
Graciliano Ramos e Mário Schenberg, dentre muitos outros, vinculavam-se a
projetos e perspectivas que tinham nas camadas proletárias o sujeito real da
intervenção social.
Se a história do PCB
foi marcada por uma sistemática repressão, que o compeliu à clandestinidade por
mais da metade de sua existência e que entregou ao povo brasileiro boa parte de
seus maiores heróis do século XX, nem por isto o PCB foi um partido marginal.
Ao contrário: da década de 1920 aos dias atuais, os comunistas, com seus
acertos e erros, mas especialmente com sua profunda ligação aos interesses
históricos das massas trabalhadoras brasileiras, participaram ativamente da
dinâmica social, política e cultural do país. Por isso mesmo, resgatar a
história do PCB é recuperar a memória de um Brasil insurgente, que, no combate
permanente às imposições do modo de produção capitalista e do imperialismo,
comprova que só pode fazer futuro quem tem lastro no passado.
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Os anos de formação
Os primeiros anos,
que vão da fundação do Partido a 1930, assinalam o esforço de se criar no país
uma cultura socialista e um modo proletário de fazer política. Ao contrário de
outros países, o Brasil não teve, antes de 1922, qualquer experiência partidária
anticapitalista de alguma significância (exceção feita à pioneira ação dos
anarquistas, cujo protagonismo esgotou-se com a greve geral de 1917 e a algumas
tentativas malogradas de se constituir no Brasil um partido de matiz operária).
Nestes anos, realizando
três congressos (o de fundação, em 1922, e os de 1925 e 1928/29) e já operando
na clandestinidade, o PCB dá conta da sua dupla tarefa: de um lado, traduz e
divulga o Manifesto do Partido Comunista e lança o jornal A Classe Operária ,
buscando divulgar as teses marxistas junto ao operariado. De outro, dinamiza o
movimento sindical com uma perspectiva classista e independente inserindo-se no
cenário da política institucional, através do Bloco Operário e Camponês.
Em 1930, reconhecido
pela Internacional Comunista e tendo criado a sua Juventude Comunista, o PCB já
multiplicava por quinze os 73 militantes que se integraram ao Partido em 1922.
A década de trinta marca dois movimentos na trajetória do PCB: o primeiro, até
1935, de afirmação política; o segundo, até 1942, de refluxo – ambos
compreensíveis na conjuntura das transformações que a sociedade brasileira
vivia com a chamada Revolução de 1930, que pôs fim à Primeira República e abriu
caminho para a era Vargas.
ANL e revolta de 1935
Mesmo sem participação
direta no evento político que derrubou a república oligárquica, o PCB logo se
coloca como uma força política importante nesta nova quadra da história
brasileira: é a organização que mais coerentemente enfrenta o avanço do
integralismo (caricatura do movimento nazifascista no Brasil). Já contando em
suas fileiras com a presença de Luiz Carlos Prestes – que haveria de se tornar
a grande figura histórica representante do comunismo no Brasil – o PCB articula
uma ampla frente nacional e antifascista, propondo à sociedade um projeto de
desenvolvimento democrático, anti-imperialista e antilatifundiário.
O Partido torna-se o
núcleo dinâmico da Aliança Nacional Libertadora (ANL), frente antifascista na
qual se reuniram comunistas, socialistas e antigos “tenentes” insatisfeitos com
a aproximação entre o governo de Vargas e os grupos oligárquicos afastados do
poder em 1930. Posta na ilegalidade a ANL, o PCB promove a insurreição de
novembro de 1935. A insurreição comunista parte da tomada de quartéis no Rio
Grande do Norte, Pernambuco e Rio de Janeiro e, devido à sua desarticulação e
ao não envolvimento das massas, foi rapidamente dominada, tendo sofrido
violenta repressão por parte das forças de segurança do Estado.
Derrotada a
insurreição, abate-se sobre o país uma ação repressiva sobre todo o campo
democrático, em especial sobre o PCB que, até inícios dos anos quarenta, viverá
sob intensa repressão política, chegando a casos de extermínio físico de
dirigentes e diversos militantes. Mas nem a duríssima clandestinidade impediu
que os comunistas cumprissem com seus compromissos, até mesmo os
internacionalistas: o PCB não só organizou a solidariedade à República
Espanhola como ainda enviou combatentes para as Brigadas Internacionais.
Liberdade, crescimento e retorno à ilegalidade
A conjuntura
internacional no final da Segunda Guerra Mundial, quando se destacaram a
derrota fascista em Stalingrado, o avanço das tropas soviéticas sobre o Leste
Europeu e a ocupação de Berlim pelas forças antinazistas (com a União Soviética
à frente), favoreceu a ação dos democratas brasileiros na abertura dos anos
quarenta e, como força inserida no campo da democracia, os comunistas têm então
possibilidade de intervenção.
Recuperando-se das
perdas orgânicas dos anos imediatamente anteriores, o PCB – que exigira a
participação do Brasil na guerra contra o nazifascismo e orientara seus
militantes a se incorporarem à Força Expedicionária Brasileira (muitos deles
voltariam do campo de batalha reconhecidos oficialmente como heróis) – se
reestrutura, com a célebre Conferência da Mantiqueira, realizada em agosto de
1943.
A partir dela, o
Partido conquista espaços na vida política e, com o fim da ditadura do Estado
Novo, no ano de 1945, torna-se um partido nacional de massas, atingindo a marca
de cerca de 200 mil filiados em 1947. Conquistando plena legalidade, constitui
significativa bancada parlamentar composta por 14 deputados federais oriundos
das lutas operárias e do universo da cultura e elege, pelo Estado da Guanabara,
ao cargo de senador, o então Secretário-Geral do Partido, Luiz Carlos Prestes,
o “Cavaleiro da Esperança”.
Protagonista essencial dos processos políticos, o PCB dirige o movimento sindical classista, cria uma notável estrutura editorial e jornalística, empolga a intelectualidade democrática e passa a ser a vanguarda democrática na Assembleia Nacional Constituinte, com uma atuação firme na defesa das liberdades e dos direitos de trabalhadores, trabalhadoras e setores populares. Destaca-se ainda a luta das mulheres comunistas, que, na sequência do exemplo de Olga Benário, executada em campo de concentração nazista, atuam à frente de diversos movimentos.
Várias
camaradas foram eleitas para as Assembleias Estaduais e para as Câmaras de
Vereadores: Adalgisa Cavalcanti, Zuleika Alambert, Arcelina Mochel, Odila
Smith, Lucilia Rosa, entre outras. Em 1947, foi lançado o jornal O Momento
Feminino, dirigido por Mochel, Ana Montenegro e Eneida de Moraes, com uma
linguagem voltada às trabalhadoras. Em 1949, foi fundada a Federação de
Mulheres do Brasil, com o objetivo central de construir um movimento feminino
nacional unificado. Participaram da fundação Arcelina Mochel, Elisa Branco e
Ana Montenegro.
Mas este movimento de
afirmação política foi brutalmente interrompido pela Guerra Fria: entre 1947 e 1948,
o Partido é posto na ilegalidade e perseguido pelo Governo Dutra. Compelido à
clandestinidade, o PCB responde à truculência do governo do Marechal Dutra com
uma política estreita e sectária (expressa nos Manifestos de 1948 e 1950), o
que conduz os comunistas a um profundo isolamento, além de dar início à luta
interna entre as facções partidárias.
Conflitos internos e a estratégia
nacional democrática
As tensões explodem
em 1956, com o impacto do relatório apresentado por Nikita Khrushchov ao XX
Congresso do Partido Comunista da União Soviética (PCUS): a denúncia do chamado
“culto à personalidade de Stalin” cataliza a atenção dos militantes e irrompe
no interior do PCB, provocando a emersão de divergências e conflitos internos.
A luta interna que se
seguiu, na qual, além de um número expressivo de militantes, o PCB perdeu
importantes dirigentes e quadros intelectuais, começou a ser ultrapassada em
março de 1958, quando se divulga a Declaração Política que propõe uma nova
perspectiva de ação dos comunistas. A Declaração de Março vincula a conquista
do socialismo à ampliação dos espaços democráticos e formula uma estratégia
revolucionária de longo prazo.
Propunha-se a
formação de uma frente única nacionalista e democrática, partindo do princípio
segundo o qual o embate central se dava entre nação e povo contra interesses
imperialistas estrangeiros e não entre proletariado e burguesia. Havia a
compreensão de que o desenvolvimento econômico capitalista no Brasil entraria
em choque com a exploração imperialista, fazendo aprofundar a contradição entre
as forças nacionais e progressistas em crescimento e o imperialismo
estadunidense, principal obstáculo para a sua expansão.
As formulações
políticas da Declaração de Março, apesar de terem possibilitado, de imediato, a
liberação dos militantes comunistas para uma atuação mais incisiva nos
movimentos populares do período, desarmaram o Partido para o posterior enfrentamento
à ação golpista da burguesia brasileira.
Partido Comunista Brasileiro, PCB
O V Congresso do PCB
(realizado em agosto-setembro de 1960) consolida esta orientação e põe como
tarefa imediata a conquista da legalidade, para o que era necessário o Partido
se adequar juridicamente à legislação partidária, inclusive com a mudança do
nome “Partido Comunista do Brasil (PCB)”, que existia desde a fundação, em
março de 1922, designando a Seção Brasileira da Internacional Comunista, para
Partido Comunista Brasileiro – PCB.
Posteriormente, o
nome Partido Comunista do Brasil seria restaurado por dirigentes e militantes
comunistas que saíram do PCB e criaram, em fevereiro de 1962, o PC do B, uma
outra organização comunista, que, na época, discordara do processo de “desestalinização”
ocorrido na União Soviética e, mais tarde, numa variação de sua linha
político-ideológica (a exemplo do que voltaria a acontecer outras vezes na
trajetória deste partido), haveria de se vincular ao maoísmo.
Golpe da burguesia e dissidências
O PCB experimenta
grande crescimento e passa a exercer papel hegemônico na intelectualidade de
esquerda, além de aumentar sua influência no movimento sindical, articulando
alianças amplas e flexíveis, que se mostraram eficazes em certas conjunturas
políticas difíceis, como, por exemplo, na posse de João Goulart, em setembro de
1961.
Tais alianças,
contudo, justamente por sua amplitude, acabaram por colocar o Partido, em
alguns momentos, a reboque dos interesses burgueses, fragilizando seu papel de
vanguarda política do proletariado. Foi neste sentido que o golpe de abril de
1964, articulado pelas frações hegemônicas da burguesia monopolista brasileira,
não encontrou resistência imediata da parte das organizações populares, impondo
ao PCB e ao conjunto das forças democráticas e de esquerda mais um duro período
de repressão e clandestinidade.
O Partido, porém, se
recompôs e definiu uma linha de ação antiditatorial centrada na recusa de
quaisquer propostas que não envolvessem ações políticas de massas. Esta recusa
ao foquismo e às várias formas de luta armada que não levassem em conta a
necessidade de organização e participação do movimento de massas, representando
uma fase de predominância do esquerdismo político no combate à ditadura, custou
ao PCB a perda de importantes dirigentes, tais como Carlos Marighella, Mário
Alves, Jacob Gorender e Apolônio de Carvalho, dentre tantos outros. Esta
orientação foi ratificada no VI Congresso que o PCB realizou em dezembro de
1967, uma vitória contra a repressão que se instalara no país.
Repressão e exílio
Os anos seguintes,
balizados pela fascistização do regime ditatorial (principalmente a partir do
Ato Institucional nº 5, de 13 de dezembro de 1968), marcaram, paradoxalmente, a
comprovação do acerto da tática política do PCB e sua vulnerabilidade orgânica
à repressão. Ao mesmo tempo em que a combinação da ação política clandestina
com a utilização dos espaços legais (especialmente através da atuação no
interior do MDB) revelava-se a forma mais eficaz de isolar o regime ditatorial,
o PCB era violentamente golpeado. Entre 1973 e 1975, um terço de seu Comitê
Central foi assassinado pela repressão, e milhares de militantes foram
submetidos à tortura, alguns até a morte, dentre os quais o jornalista Vladimir
Herzog e o operário Manuel Fiel Filho.
Nem por isso os
comunistas deixaram de intervir ativamente na vida brasileira. Mesmo tendo a
maioria da sua direção exilada e boa parte presa nos presídios da ditadura, o
PCB desenvolveu uma política que privilegiava a unidade das forças
democráticas. Assim, com a conquista da anistia, que fazia parte do programa do
PCB desde o VI Congresso (1967), em setembro de 1979, o retorno de dirigentes e
militantes que estavam no exterior e a volta à vida social de quadros que
estavam na clandestinidade foram elementos centrais na dinamização da luta
contra a ditadura em sua crise mais aguda, após o fim do chamado ciclo do
milagre econômico.
VII Congresso do PCB: a consolidação da
“via democrática”
Reestruturando-se em
todo o país desde 1979, o PCB realizou, em dezembro de 1982, o seu VII
Congresso, que formulou uma linha política para as novas condições da
sociedade, sob o título “Uma alternativa democrática para a crise brasileira”.
O PCB atualizava o seu projeto de tornar-se um partido nacional de massas
vinculando organicamente o objetivo socialista a uma democracia de massas, a
ser construída no respeito ao pluralismo e nos valores fundamentais da
liberdade.
O Partido, no encaminhamento deste Congresso, viu-se mais uma vez engolfado por lutas internas de graves consequências. Por um lado, o chamado eurocomunismo (que propunha a ocupação de espaços no interior da sociedade burguesa sem uma clara afirmação da luta de classes e da derrubada revolucionária do capitalismo, numa leitura deturpada e rasteira das ideias do dirigente comunista italiano Antonio Gramsci) havia construído sólidas bases no pensamento partidário.
Embora não
contassem com grande número de militantes e dirigentes que se assumissem como
tal, as formulações centrais do eurocomunismo permeavam todas as teses
congressuais. Por outro lado, o grupo liderado por Luiz Carlos Prestes,
divergindo da orientação da maioria do Comitê Central, rompe com o Partido,
após inúmeros embates que vinham se acirrando desde o exílio.
Devido às divergências
internas e ao fato de o Congresso não ter terminado, tendo sido invadido pelas
forças de repressão, o Comitê Central, somente no ano de 1984, consegue
publicar o documento final de “Uma Alternativa Democrática para a crise
brasileira”. O documento aprovado é permeado de contradições geradas pela
tentativa de contemplar as principais facções e abafar os conflitos internos,
buscando evitar, por alguns anos, a inevitável fragmentação partidária.
Mesmo assim, tendo como Secretário-Geral o ex-combatente de 1935, Giocondo Dias, o Partido alcançou ganhos na cena política, apesar de muito enfraquecido no interior dos movimentos populares (especialmente no interior do movimento operário, no qual sua política de conciliação de classes viu-se amplamente questionada). Esta débil inserção nos movimentos acabaria por fragilizar a intervenção política do PCB, em que pese sua relevância nas articulações institucionais da esquerda e do campo democrático.
Assim, no decurso da derrota da ditadura e da transição
democrática, o Partido não se afirmou como organização de massas, nem esteve na
vanguarda das principais lutas e greves operárias no decorrer dos anos 1980,
apesar de ter tido importante participação em inúmeras lutas sindicais, a
exemplo da atuação no Sindicato dos Bancários do Rio de Janeiro e outros.
Legalidade e crise
O VIII Congresso
(Extraordinário), já realizado sob condições de legalidade, em julho de 1987,
não fez avançar a política do PCB: importantes questões táticas (por exemplo, a
ação sindical e a política de alianças) e estratégicas (o próprio formato da
organização partidária, a concepção de um caminho brasileiro para o socialismo)
não foram efetivamente equacionadas.
Uma crise velada
atingia o conjunto partidário, expressa na estagnação do contingente de
militantes, na perda de inserção no movimento sindical, na pobreza dos
resultados eleitorais e na ineficiência dos instrumentos partidários, como o
semanário Voz da Unidade e todas as publicações da Editora Novos Rumos, que não
eram legitimados pela militância.
O IX Congresso
(1991), levado a cabo na sequência da queda do Muro de Berlim, mostrou o
Partido dividido, desde o Comitê Central até as bases, entre aqueles que
desejavam capitular frente à ofensiva neoliberal e adaptar-se ao novo ciclo de
hegemonia burguesa e aqueles que propugnavam a reconstrução revolucionária do
Partido. Já neste processo, os liquidacionistas pretendiam mudar o nome e o
caráter marxista-leninista do Partido, sendo impedidos de fazê-lo pela enorme
resistência de alguns dirigentes e das bases partidárias.
X Congresso do PCB: o racha
A crise explode no X
Congresso extraordinário (em janeiro de 1992, em São Paulo), montado com o
único intuito de, finalmente, levar a cabo as propostas liquidacionistas. O
embate se dá entre uma maioria numérica forjada, da qual participavam não
filiados ao PCB e membros de outros partidos, e os militantes do Movimento
Nacional em Defesa do PCB, isto é, entre os que sairão para criar o Partido
Popular Socialista – PPS e aqueles que reclamavam a continuidade do PCB.
No mesmo instante em
que a maioria forjada votava pela liquidação do Partido, os militantes do
Movimento Nacional em Defesa do PCB, após exporem sua decisão e objetivo na
abertura do espúrio X Congresso, se retiram em passeata até o Colégio Estadual
Roosevelt. Ali, foi realizada a Conferência Extraordinária de Reorganização do
PCB, que decidiu, por aclamação, pela continuidade do Partido, com manutenção
do seu nome e sigla históricos, prosseguindo na luta pelo socialismo.
A retomada: a luta pela reconstrução
revolucionária do PCB
A luta pela
existência do PCB se deu em várias frentes: na luta de massas e no nível legal
e institucional. Os militantes mantiveram vivo o Partido nos movimentos de
massa, afirmando nos espaços de luta popular a reconstrução revolucionária do
PCB. Na Justiça Eleitoral, foi travado um embate de mais de um ano pelo direito
ao uso da sigla histórica. Ao final da disputa legal, a sentença do então
ministro do TSE, Sepúlveda Pertence, deixou claro que a sigla PCB e seu símbolo
só poderiam pertencer a quem de fato se afirmava herdeiro do legado político e
histórico do Partido.
A tarefa seguinte
imposta aos militantes comunistas foi a batalha pela legalização e pelo
registro definitivo do PCB. A campanha de filiação, para atender às rigorosas
exigências do TSE – a filiação em 20% dos municípios de 9 estados – começou em
1994. Foram exigidos tremendos sacrifícios da direção e da militância, tanto em
nível pessoal quanto financeiro, mas a tarefa foi completada com êxito no final
de 1995.
Embora fosse árduo o esforço pela legalização, não foi a campanha de filiação a única atividade do PCB neste período. Iniciou-se a reorganização do Partido nos movimentos de massa, especialmente nos movimentos estudantil e sindical. Neste período, para definir nova linha política e o caráter do Partido, foram realizados uma Conferência Política Nacional em Brasília (1995) e dois Congressos: o X Congresso no Rio de Janeiro (1993), que ratifica o propósito de construir no Brasil uma alternativa revolucionária, tendo no marxismo sua base teórica e na construção do Partido junto ao movimento de massas a tarefa primordial visando a organização consciente do proletariado para as transformações rumo ao socialismo no Brasil; o XI Congresso, também no Rio (1996), que supera as avaliações nacional-libertadoras e etapistas que ainda vicejavam desde o racha com o PPS.
Estes ricos processos de debates da militância partidária afastaram
de vez qualquer formulação reformista e enfatizaram o caráter revolucionário do
PCB. Retomaram o conceito de centralismo democrático, de acordo com suas
origens, e reafirmaram o caráter marxista-leninista do Partido.
No mês de abril de
2000, em Xerém (Rio), realizou-se o XII Congresso. Além de aprofundar sua
leitura sobre a conjuntura política nacional e internacional e formular a sua
atuação política, os comunistas do PCB avançaram em outras questões que se
colocam para a sociedade no enfrentamento à exploração capitalista. A
construção de uma frente das esquerdas em um projeto de confronto ao
neoliberalismo e a unidade dos comunistas no Brasil foram importantes
resoluções aprovadas pelo Congresso. A consolidação da política de organização
leninista foi concretizada na aprovação do novo estatuto partidário.
Em março de 2005, em Belo Horizonte, o PCB realizou seu XIII Congresso e reforçou a compreensão de que a “revolução socialista é um processo histórico complexo”, isto é, que o “triunfo do Socialismo não é um fato que acontecerá de forma natural ou inexorável, como afirmam algumas leituras mecanicistas da obra de Marx, mas sim uma possibilidade histórica que deve ser construída”. Baliza a necessidade de ruptura com a política governamental que o então Presidente Lula desenvolvia no país, sob uma orientação social-liberal e conciliadora com os interesses e perspectivas das elites e do imperialismo.
Em janeiro de 2006, o PCB rompe sua
participação nos fóruns da CUT (Central Única dos Trabalhadores), por entender
que esta entidade torna-se um braço governamental e promotor da conciliação de
classe junto aos trabalhadores. O Partido contribui para a construção da
Intersindical – instrumento de organização e luta da classe trabalhadora – e
propõe o debate sobre os desafios colocados para o movimento sindical de corte
classista, na perspectiva da construção de uma nova e ampla entidade sindical,
classista, democrática e independente, capaz de conduzir as lutas do
proletariado, em especial da classe operária brasileira.
Construir o Bloco Revolucionário do
Proletariado
No XIV Congresso,
realizado em outubro de 2009 no Rio, comprova-se o acerto no trabalho de
reinserção do PCB no movimento comunista internacional e de solidariedade
militante aos partidos, movimentos e governos que avançam na luta
anticapitalista e anti-imperialista em todo o mundo. Verificou-se a forte
presença de convidados estrangeiros ao Congresso, através das delegações dos
Partidos Comunistas Cubano, Grego, da Alemanha, dos Povos da Espanha, dos
Mexicanos, Libanês, Colombiano, da Venezuela, da Bolívia, do Chile, Peruano,
Paraguaio, Argentino, do Polo do Renascimento Comunista Francês, da Frente
Popular de Libertação da Palestina, da Coordenadora Continental Bolivariana, do
Partido Comunista do Vietnã e do Partido do Trabalho da Coréia.
No XIV Congresso, o PCB afirma que o Brasil já cumpriu o ciclo burguês, tornando-se uma formação social capitalista desenvolvida, terreno propício para a luta de classes aberta entre a burguesia e o proletariado. E assevera que o cenário da luta de classes mundial e suas manifestações no continente latino-americano, o caráter do capitalismo monopolista brasileiro e sua profunda articulação com o sistema imperialista mundial, a hegemonia conservadora, os resultados deste domínio sobre os trabalhadores e as massas populares no sentido de precarização da qualidade de vida, desemprego, crescente concentração da riqueza e flexibilização de direitos levam a reafirmar que o caráter da luta de classes no Brasil inscreve a necessidade de uma ESTRATÉGIA SOCIALISTA.
Para tanto, propõe a formação de
uma frente política permanente de caráter anticapitalista e anti-imperialista,
que não se confunda com mera coligação eleitoral, na perspectiva da
constituição do Bloco Revolucionário do Proletariado como um movimento rumo ao
socialismo.
Lutar, criar Poder Popular!
No XV Congresso, realizado em abril de 2014, os militantes do PCB reafirmam categoricamente a contradição entre capital e trabalho em nível global como a contradição fundamental a exigir a organização da classe trabalhadora na luta contra o sistema dominante. A luta central, pois, é a luta entre classes, não a luta entre nações.
Mesmo reconhecendo que as mutações sofridas pela classe
trabalhadora no quadro do redimensionamento global do capitalismo atual
acarretaram alterações muito expressivas no conjunto do proletariado, fazendo
com que, nos dias de hoje, ela seja bastante diferente do proletariado
industrial identificado como sujeito revolucionário do Manifesto do Partido
Comunista, consideram ser esse contingente de trabalhadores, por sua posição
central no processo de produção de riquezas, o grupo capacitado a assumir o
protagonismo na luta de classes, rumo à construção do socialismo e da sociedade
comunista.
Ao analisar a conjuntura brasileira, o PCB entende que a chegada do PT ao governo só fez avançar a proposta de realização de um “pacto nacional” de submissão consentida dos trabalhadores à hegemonia burguesa. O apelo ao tratamento compensatório à fome e à miséria integra a estratégia de construção do consenso em torno do projeto de transformação do Brasil em um país de capitalismo avançado com “face humana”: a economia privada deve dar lucros, o Estado arrecadar e, depois de garantir os prioritários interesses do grande capital, deve chegar, de maneira focalizada, até pontos da miserabilidade, para amortecer a explosividade da miséria.
Trata-se de uma política que propõe a conciliação e a harmonização
entre o capital e o trabalho, colocando o interesse da “nação” acima dos
interesses de classes, partindo da crença segundo a qual o desenvolvimento da
economia capitalista resolve as desigualdades sociais através do “ciclo
virtuoso” da produção, emprego, consumo, restando aos mais miseráveis as
políticas compensatórias.
Como alternativa à ordem burguesa, o XV Congresso avança na formulação acerca do Poder Popular, cujo processo de construção deve se dar a partir das ações independentes da classe trabalhadora em seus embates contra as manifestações concretas do capitalismo, através de mobilizações, greves e movimentos que coloquem em marcha os diferentes segmentos do proletariado e da classe trabalhadora em geral.
Tais lutas podem a se transformar em enfrentamentos mais intensos contra
o sistema capitalista, mas somente a unidade programática em torno de eixos
comuns capazes de unificar as demandas setoriais fragmentadas em uma pauta cada
vez mais precisa de bandeiras e reivindicações, dará forma efetiva ao campo
popular e de esquerda, no rumo de um programa político de transformações de
caráter anticapitalista. Deste modo, o Poder Popular assumirá sua
potencialidade como germe de um novo Estado sustentado pelas massas populares e
pela classe trabalhadora, como germe de um Estado Proletário – a Ditadura do
Proletariado – que conduzirá a transição socialista visando a erradicar a
propriedade privada, as classes e, portanto, o próprio Estado através da livre
associação dos produtores.
Na Conferência
Política e de Organização de 2016, acontecida no Rio de Janeiro, o Partido
reafirmou a organização da militância nas células, estruturadas por espaços
comuns de atuação e luta, assim como aprofundou o debate sobre o papel dos
coletivos partidários, organizações formadas com o objetivo de dirigir as ações
nas lutas específicas da juventude, das mulheres, de negros e negras, LGBTs,
por meio da União da Juventude Comunista, do Coletivo Feminista Classista Ana Montenegro,
do Coletivo Negro Minervino de Oliveira, do Coletivo LGTB Comunista, sempre de
acordo com a linha política geral do partido, mas buscando captar as
especificidades de cada um desses movimentos populares e dar a essas lutas o
caráter de classe necessário ao combate central contra o capitalismo e pela
construção do Poder Popular e do Socialismo.
Reorganizar a classe trabalhadora, rumo
ao Socialismo
Nos últimos anos o
PCB e a militância dos Coletivos seguem ampliando sua atuação organizada junto
à classe trabalhadora e aos movimentos populares. Particularmente no ano de
2021, diante da deterioração das condições dramáticas da vida da população
brasileira em função da pandemia do Coronavírus, foram realizadas grandes
manifestações de massa contra o governo antipopular de Bolsonaro, Mourão e
Guedes, em protesto ao crescimento vertiginoso do desemprego, da carestia, da
fome e da miséria, de aumento da violência contra as mulheres, negros e negras,
povos indígenas e juventude da das periferias, bem como para tentar barrar as
medidas de destruição de direitos e dos serviços públicos, de entrega da
soberania e privatizações, iniciativas adotadas em favor do grande capital
nacional e internacional. O PCB e seus coletivos de luta tiveram papel
protagonista, tanto no chamado às manifestações quanto na presença organizada e
disciplinada nos atos convocados.
Os setores
revolucionários conseguiram imprimir tamanha intensidade à luta nas ruas que
mesmo os reformistas foram compelidos a aderir às manifestações. Contudo,
guiadas por uma tática oportunista de reconciliação com a burguesia, limitada à
sangria eleitoral de Bolsonaro, as forças predominantes no movimento de massas
foram incapazes de travar a luta pelo impeachment de modo consistente e com
independência de classe. Mesmo assim, as manifestações contribuíram para
ampliar o isolamento nacional e internacional de Bolsonaro, cujos reflexos se
expressam na perda de popularidade do governo.
O XVI Congresso, cujas teses políticas começaram a ser debatidas pelo conjunto da militância em 2019, em virtude da pandemia da Covid-19, somente pôde ser concluído, em São Paulo, em outubro/novembro de 2021. O Congresso reafirma a necessidade de o PCB enraizar-se junto ao proletariado, construindo-se como organização revolucionária de acordo com a vida real da população, presente em todos os organismos vivos da sociedade.
As lutas contra a exploração, contra os monopólios econômicos e
financeiros e contra o latifúndio são essencialmente lutas anticapitalistas,
dado que o grande capital exerce seu domínio em todas as esferas da vida social
e que as lutas de resistência de trabalhadores e trabalhadoras na defesa dos
direitos e salários, por educação e saúde públicas, moradia, direitos
previdenciários, mobilidade urbana, as lutas no campo, as reivindicações por
acesso à informação e aos bens culturais e ao lazer se chocam com a lógica
privada e do mercado. As lutas anticapitalistas se unem à luta contra o
imperialismo, pois o sistema capitalista brasileiro está associado aos centros imperialistas
mundiais, e a burguesia brasileira é parte integrante e aliada do imperialismo
e de seus interesses no Brasil.
A Declaração Política
elaborada pelo Comitê Central eleito no XVI Congresso afirma:
“O PCB completará 100
anos de existência em 2022. O XVI Congresso do PCB reafirma o seu compromisso
com a revolução brasileira e com a construção do socialismo em nosso país, na
perspectiva da sociedade comunista. Lutaremos com todos os meios possíveis para
a derrota da hegemonia burguesa no Brasil, pela socialização dos meios de
produção e o controle do poder popular, como forma de criar a sociedade da
igualdade, da fraternidade, da solidariedade, da abundância para todos e da
felicidade humana: a sociedade comunista!
Viva a revolução
brasileira e o socialismo!
Viva o
internacionalismo proletário!
Viva o Partido
Comunista Brasileiro!”
(Partido Comunista
Brasileiro)
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