seg., 5 de julho de 2021
Presidente Jair Bolsonaro também estaria envolvido em crime de corrupção pela prática de rachadinha; Flavio Bolsonaro é investigado pelo mesmo motivo (Foto: Andressa Anholete/Getty Images)
· Áudio indicam que Jair Bolsonaro mantinha a prática de rachadinha no gabinete quando era deputado federal
· Ex-cunhado teria sido demitido por Bolsonaro por não devolver quantia combinada entre eles
·
Revelação foi
descoberta em áudio da ex-cunhada de Bolsonaro, Andrea Siqueira Valle
Desde 2019, o senador Flavio
Bolsonaro (Patriotas-RJ) é investigado pela prática de rachadinha no período em que foi deputado estadual pelo Rio de
Janeiro. Outros indícios já mostraram que o crime, uma espécie de
corrupção, também envolvia Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ). Nesta
segunda-feira (5), o UOL revelou áudios que indicam
que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), também estava
envolvido na prática de corrupção quando era parlamentar.
A prática de rachadinha consiste em
recolher parte dos salários dos funcionários do gabinete para si. No caso da
família Bolsonaro, os assessores empregados não trabalhavam de verdade e
funcionavam apenas como laranjas.
Os áudios revelados pela colunista
Juliana Dal Piva são da ex-cunhada de Bolsonaro, Andrea Siqueira Valle, irmã de
Ana Cristina Valle, ex-mulher de Jair e mãe de Jair Renan, o 04. Na gravação,
Andrea revela que Bolsonaro demitiu o irmão dela, André Siqueira Valle, porque
ele não queria devolver a quantia prometia ao então deputado. Esse seria o
primeiro indício de que Bolsonaro estava pessoalmente envolvido.
Na mensagem de voz enviada por Andrea
a um destinatário que não foi revelado, ela conta que Jair Bolsonaro demitiu
André do gabinete porque ele não quis devolver ao então deputado o valor
combinado, correspondente a quase 90% do salário.
“O André dava muito problema, porque o André
nunca devolveu o dinheiro certo que tinha que ser devolvido, entendeu? Tinha
que devolver R$ 6 mil, o André devolvia R$ 2 mil, R$ 3 mil”, detalhou a
ex-cunhada. “Foi um tempão assim até que o Jair pegou e falou: ‘Chega. Pode
tirar ele, porque ele nunca me devolve o dinheiro certo.’”
André Valle trabalhou como assessor
de Jair Bolsonaro entre 2006 e 2007, mas foi exonerado por não cumprir com o
combinado.
Nas gravações reveladas pelo UOL,
Andrea Siqueira Valle diz que pode “ferrar a vida do Flavio, posso ferrar a
vida do Jair, posso ferrar a vida da Cristina. É por isso que eles têm medo e
manda eu ficar quietinha”.
As declarações de Andrea teriam sido
feitas a duas pessoas, ouvidas pela colunista Juliana Dal Piva, entre 2018 e
2019. Os áudios foram entregues à reportagem por uma delas.
O que diz a defesa
de Bolsonaro
A reportagem do UOL procurou
Frederick Wassef, advogado de Jair Bolsonaro. Wassef negou
que Bolsonaro esteja envolvido em ilegalidade e disse se tratar de uma
antecipação da campanha eleitoral de 2022.
Sobre os fatos apresentados por
Andrea, o advogado alegou que “são narrativas de fatos inverídicos,
inexistentes” e que “jamais existiu qualquer esquema de rachadinha no gabinete
do deputado Jair Bolsonaro ou de qualquer de seus filhos”.
Apesar de o portal ter atestado a
veracidade dos áudios, Wassef afirmou que trata-se de uma “gravação
clandestinas” e disse que não houve perícia.
Posts misteriosos
Na noite do último domingo (4), o
presidente Jair Bolsonaro fez uma série de postagens misteriosas nas redes
sociais. Nas publicações, ele falava sobre “uma autoridade filmada” que estaria
sendo chantageada.
“Essa prática de chantagem, muito
utilizada em Cuba, se encontra na página 143 do livro ‘A vida secreta de Fidel’
de Juan Reinaldo Sánchez. Parece que isso está sendo utilizado no Brasil
(importado de Cuba pela esquerda) onde certas autoridades tomam decisões
simplesmente absurdas, para atender ao chantageador”, escreveu Bolsonaro.
“Quando nada têm contra seu alvo
principal, vão para cima de filhos, parentes, e amigos do mesmo. Inquéritos e
acusações absurdas, ... Daí quebram sigilos, determinam buscas e apreensões,
decretam prisões arbitrárias, etc...”, diz o presidente nos posts.
A suspeita é que o post dissesse
respeito aos áudios revelados pelo UOL.
O que é
rachadinha
Segundo o advogado criminalista
Flavio Grossi, especialista em direitos fundamentais pela Universidade de
Coimbra, a prática ilícita consiste em dividir os vencimentos de servidores
públicos, geralmente em troca de algum benefício.
“Por exemplo: digamos,
hipoteticamente, que eu seja parlamentar e uma pessoa me procura querendo muito
a nomeação para um cargo. Eu o nomeio para o cargo, de forma lícita, porém, por
debaixo dos panos, eu determino que, em troca, o salário que a repartição pagar
a ele será dividido entre ele e algum parente meu, ou até mesmo entre outro
servidor”, explica.
Ele reforça que, normalmente, os
contratados funcionam como laranjas para o recebimento de parte do dinheiro. Ou
seja, não são funcionários que efetivamente exercem o serviço pelo qual foram
contratados para fazer, apenas ocupam o cargo para fazer parte do esquema
ilegal.
O advogado ainda explica que todos os
envolvidos no esquema podem ser responsabilizados: quem determina que a divisão
do dinheiro seja feita, os que repassam o dinheiro e também quem recebe o
dinheiro de forma ilegal.
“Não há dúvidas de que a chamada ‘rachadinha’ visa
o recebimento ou obtenção de vantagem ilícita por parte de alguém. Para se
chegar a isso, a fim de maquiar toda a estrutura, várias pessoas podem estar
envolvidas e todas elas podem ser responsabilizadas”, afirma Grossi.
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