Postado por Magno Martins Em 18.07.2021
Com edição de Ítala Alves
Por Merval Pereira,
de O Globo
O escandaloso aumento do fundo eleitoral aprovado
pelo Congresso a toque de caixa é apenas uma das facetas de um golpe
legislativo que está em curso para mudar também o sistema eleitoral e aprovar a
maior reforma política já feita desde a redemocratização. Tudo sem o debate
público necessário, a fim de que as novas regras sejam aprovadas até o começo
de outubro, para que entrem em vigor já na eleição geral de 2022.
O valor triplicado do Fundo Eleitoral, passando de
R$ 2 bilhões para R$ 5,7 bilhões, deve ser judicializado no Supremo Tribunal
Federal, pois dificilmente o presidente Bolsonaro terá condições de vetar o
aumento, embora tenha interesses pessoais nisso: PT e o PSL, partidos opositores
de Bolsonaro, receberão cada cerca de R$ 600 milhões para a campanha. No
entanto, esse aumento abusivo interessa também aos partidos do Centrão, hoje a
base de apoio do governo.
Além do mais, há um problema técnico: o valor do
Fundo Eleitoral foi definido por uma porcentagem da verba do Tribunal Superior
Eleitoral (TSE), e se o presidente vetar o artigo, estará acabando com o Fundo,
pois não é possível simplesmente passar a porcentagem de 25%, como aprovado,
para outra qualquer.
Num momento de crise, é simplesmente inaceitável
que os partidos políticos aumentem irrazoavelmente o gasto eleitoral. Mas
há mais. A mudança do sistema eleitoral foi apresentada pela deputada
Renata Abreu a partir de uma proposta original de mudança constitucional do
PSDB que tratava da mudança de datas em eleições próximas a feriados nacionais.
A relatora, advogada especializada em direito eleitoral, propôs uma série de
mudanças, que abrange do sistema eleitoral à cláusula de barreiras e ao
incentivo ao voto em mulheres, que valeriam o dobro para o cálculo do Fundo
Eleitoral.
Até mesmo a democracia direta, com incentivo a plebiscitos municipais, é sugerida na reforma. O mais grave, no entanto, é a adoção do distritão, considerado pelo especialista Jairo Nicolau “o pior modelo eleitoral do mundo”. O sistema tem o poder de retirar da disputa os votos de legenda para favorecer os chamados puxadores de votos. O temor é que os partidos escolham apenas os candidatos populares, como artistas, jogadores de futebol, jornalistas de rádio e televisão, em detrimento de candidatos de voto de opinião. Ou prefiram candidatos já eleitos com boa votação. Assim, a renovação política seria inviabilizada.
Os partidos perderiam também o controle
programático, pois cada eleito teria sua própria representatividade, sem
necessariamente coincidir com o programa partidário. O que já é ruim ficaria
pior. Há, concomitantemente, uma reforma eleitoral profunda que está
sendo debatida em comissão que, segundo Marcelo Issa, cientista político que
dirige a ONG Transparência Partidária, representa um retrocesso no nosso
processo eleitoral, retirando da Justiça Eleitoral algumas de suas
prerrogativas.
Ela admite que os partidos contratem empresas
privadas para analisar suas contas e informá-las à Justiça Eleitoral, prevendo
neste caso multa irrisória se houver a reprovação (art. 70); acaba com a
divulgação de bens dos candidatos, que permite ao eleitor conhecer as empresas,
propriedades e investimentos e evolução patrimonial dos candidatos (art. 209,
§9º). Faz com que os gastos de campanha sejam conhecidos só após a eleição.
A proposta permite ao Congresso Nacional cassar
resolução do TSE que considere exorbitar os limites e atribuições previstos em
lei (art.130, §1º); exige comprovação de gastos para caracterizar propaganda
eleitoral antecipada, afastando desse conceito algumas condutas que ocorrem,
por exemplo, em igrejas, templos e similares (art. 504); restringe a aplicação
de multa no caso de propaganda eleitoral negativa apenas aos casos em que
ocorrer “acusações inverídicas graves e com emprego de gastos diretos” (art.
507, §2º), podendo levar a um aumento dos discursos de ódio e ofensas pessoais
durante as campanhas e institui o crime de caixa dois eleitoral, mas com pena
máxima passível de acordo de não persecução penal (art. 893 e art. 28-A do
CPP).
Uma reforma feita “pelos partidos, para os
partidos”, como define Marcelo Issa.
EM TEMPO: Nem 2 e nem 6 bilhões de reais. Na sociedade capitalista há coisas interessantes. Os empresários querem privatizar as empresas estatais e defendem o Estado Mínimo, mas se lembram do Estado para financiar seus empreendimentos, seja em infra-estrutura, seja em financiamentos via BNDES, BB, BNB e CEF. Já que a sociedade é capitalista, opino que não haja financiamento público de campanha eleitoral e que os candidatos sejam financiados pela iniciativa privada ou com recursos próprios, seguindo normas específicas e transparência. Evidentemente que a maioria dos candidatos não iriam sensibilizar a classe empresarial para financiar suas campanhas políticas e de interesse pessoal.
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