ESTADÃO - Idiana Tomazelli
© Marcelo Camargo/Agência Brasil Reforma da Previdência está rendendo mais do que o esperado e parlamentares estão de olho nesses recursos.
BRASÍLIA - O Congresso Nacional quer tirar recursos previstos para o
pagamento de benefícios previdenciários e direcioná-los a obras e ações de
interesse parlamentar, segundo apurou o Estadão/Broadcast com três fontes que acompanham as
discussões. A estratégia é amparada em uma expectativa de economia maior com
a reforma da Previdência aprovada
em 2019, mas a área econômica é contra a medida porque a realocação de recursos
pode colocar em risco uma despesa que é obrigatória. Além disso, o reajuste
maior do salário mínimo, para R$ 1,1 mil, deixou quase nenhuma margem de
manobra dentro do Orçamento.
Os parlamentares
estão de olho nas despesas com a Previdência depois de verem frustrada a
tentativa anterior de abrir espaço no Orçamento: patrocinados pelo
presidente Jair Bolsonaro, eles
queriam retirar os gastos com o Bolsa Família do alcance do teto de gastos, a regra que
limita o avanço das despesas à inflação. Emendas parlamentares já estavam engatilhadas para
preencher o espaço deixado pelos quase R$ 35 bilhões previstos para o programa
social. Com a ameaça de chaminé no teto, o ministro da Economia, Paulo Guedes, entrou em campo para desarmar a bomba.
Segundo apurou a
reportagem, a pressão inicial mirava em R$ 16,5 bilhões em gastos com Previdência, mas fontes que participam das discussões
reconhecem que até mesmo o relator do Orçamento, senador Marcio Bittar (MDB-AC), está reticente em bancar um
remanejamento dessa monta. As despesas previdenciárias são obrigatórias, e uma
reavaliação nesses números precisa ser criteriosa para não cair na vala da
contabilidade criativa.
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Técnicos da área
econômica têm alertado que, para mexer em gastos como os previdenciários, é
preciso ter “boas estimativas”, sob o risco de retomar a “magia do Orçamento”
que antecedeu a criação do teto de gastos – quando parlamentares inflavam
receitas apenas para prever mais despesas, sem garantias de que a arrecadação
se concretizaria.
Restrições
A estratégia dos
parlamentares também esbarra no Orçamento já apertado. Como mostrou a colunista Adriana
Fernandes, do Estadão, a equipe econômica já calculava no início do mês um
buraco de R$ 17 bilhões na regra do teto de gastos. Isso significa
que, antes mesmo de qualquer remanejamento de recursos pelos parlamentares, já
seria necessário cortar gastos nesse valor para evitar o descumprimento do
limite. Enquanto isso, as chamadas despesas discricionárias (que incluem
custeio e investimento) já estão no limite mínimo para garantir o funcionamento
da máquina, ao redor de R$ 92 bilhões.
Na prática,
qualquer mudança radical feita pelo Congresso pode acabar sendo revertida nos
relatórios bimestrais de avaliação do Orçamento. Segundo uma fonte da área
econômica, será preciso contingenciar os gastos agora “beneficiados” pelos
parlamentares para devolver à Previdência, uma vez que são despesas
obrigatórias e o governo tem o dever de atendê-las.
A explicação de
técnicos é que a reforma da Previdência está de fato rendendo economia maior
que o esperado, mas o repique da inflação no ano passado levou a um aumento
acima do previsto no salário mínimo, elevando as despesas do governo. A
proposta orçamentária foi enviada em agosto de 2020 com uma previsão de salário
mínimo de R$ 1.067. O reajuste acabou resultando em um valor de R$ 1.100. Como
cada R$ 1 a mais no piso eleva as despesas em R$ 351,1 milhões, a pressão
gerada por esse fator seria de R$ 11,6 bilhões.
A Previdência não é
a única despesa obrigatória na mira dos parlamentares. Segundo apurou o Estadão/Broadcast, congressistas
querem tirar também cerca de R$ 5 bilhões que estão destinados ao
auxílio-doença e ao Plano Safra para contemplar ações de três ministérios do
governo: Desenvolvimento Regional, Infraestrutura e Agricultura.
O que tem barrado o
sucesso desses movimentos até agora é a dificuldade do relator em encontrar os
espaços e justificar os cortes. Ao Estadão/Broadcast,
Bittar disse que “tudo é legítimo, mas não tem cobertura”. “Vou fazer o melhor
possível”, afirmou.
O diretor-executivo
da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado, Felipe Salto, diz não ver “muita gordura” nos gastos com
o INSS, que na projeção da entidade devem ficar em R$ 704,6
bilhões, já considerando efeitos da reforma de 2019. “A despesa obrigatória só
deveria ser revista se, de fato, houver justificativa técnica plausível, a
exemplo de uma revisão de parâmetros macroeconômicos ou constatações sobre a
evolução dos benefícios emitidos. Não dá para se cogitar mudar projeções de
despesas como esta, a mais importante do orçamento primário, porque
parlamentares querem”, diz Salto.
“Se o cálculo ficar subestimado no Orçamento, isso será péssimo para a transparência e a gestão fiscal. Espaço fiscal se abre com aumento de receita ou corte de despesa. Parece não haver disposição a isso”, alerta o diretor-executivo da IFI.
EM TEMPO: O autor desta reportagem deveria dizer quais são os setores dos congressistas que querem este recurso para fazer suas propagandas em seus redutos eleitorais. Porque desta forma ficam todos envolvidos. Mas, existem os prós e contra.
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