ESTADÃO - Mateus Vargas
BRASÍLIA - Em reunião a portas fechadas no fim de maio, já sob a gestão interina do general Eduardo Pazuello, técnicos do Ministério da Saúde que integram um comitê sobre o novo coronavírus alertaram que, sem medidas de isolamento social, os impactos da doença serão sentidos por até dois anos. Segundo a equipe de Pazuello, “todas as pesquisas” levam a crer que o distanciamento é “favorável” até mesmo para o retorno da economia mais rápido.
“Sem intervenção,
esgotamos UTIs, os picos vão aumentar descontroladamente, levando insegurança à
população que vai se recolher mesmo com tudo funcionando, o que geraria um
desgaste maior ou igual ao isolamento na economia”, afirmam técnicos da pasta.
A discussão está registrada em ata de reunião do Comitê de Operações de
Emergência (COE) do ministério, obtida pelo Estadão. “Sem isolamento, um tempo muito grande de 1 a 2 anos para
controlarmos a situação”, informa a ata de reunião ocorrida em 25 de maio no
3.º andar do Ministério da Saúde.
No mesmo documento,
o comitê discute a criação de um aplicativo para monitorar pacientes da
covid-19 e até dez pessoas que tiveram contato com a pessoa infectada, o que
nunca saiu do papel. Como encaminhamento da reunião, outra ideia que não
prosperou: criar protocolo que “atenda nossas necessidades específicas”.
Para Paulo Lotufo,
professor de epidemiologia da USP, o
distanciamento social se mostrou eficaz em diversos países, incluindo o Brasil.
“Veja na cidade de São Paulo. Conseguimos ter um número de mortos bem abaixo de
outros locais. Em Manaus foi uma catástrofe.”
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O presidente Jair
Bolsonaro entrou em conflito com dois ministros da Saúde durante a pandemia por
divergências, entre outros pontos, sobre a adoção de quarentenas. Em 16 de
abril, Luiz Henrique Mandetta (DEM) foi
demitido. Em 15 de maio, Nelson Teich pediu para sair da
pasta. “Vamos enfrentar o vírus. Vai chegar, vai passar. Infelizmente algumas
mortes terão. Paciência, acontece, e vamos tocar o barco. As consequências,
depois dessas medidas equivocadas, vão ser muito mais danosas do que o próprio
vírus”, disse Bolsonaro à TV Band em 27 de março.
Depois, o
ministério foi interinamente para Pazuello. Sob a gestão do militar, técnicos
do ministério deixaram de ressaltar o benefício do distanciamento social.
Questionado em 1.º de julho se a aceleração de casos no País tem relação com a
flexibilização de quarentenas, o secretário de Vigilância em Saúde, Arnaldo Correia,
esquivou-se. “Não posso afirmar que este aumento tem relação direta com a
decisão do gestor local.”
Para Lotufo,
criou-se uma corrente de negacionismo sobre a pandemia no Brasil. “Tenho a
impressão de que a coisa no Ministério da Saúde é totalmente no estilo militar.
Esse tipo de conselho (o COE), não dão a mínima importância.”
Criado no começo de
fevereiro, o COE serve para “planejar, organizar, coordenar e controlar” a
resposta à covid-19 no Brasil. Além disso, deve encaminhar ao Ministério da
Saúde relatórios técnicos sobre a pandemia e ações que estão sendo tomadas. As
reuniões são feitas entre secretários do Ministério da Saúde, representantes de
Estados e municípios e gestores de órgãos que lidam com a pandemia, como a
Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). A
composição de cada encontro varia. Membros de conselhos de secretários de
Estados e municípios chegaram a ficar de fora dos encontros por divergências
com o ministério.
Portaria
Procurado, o
Ministério da Saúde disse que o resultado da reunião do COE foi a publicação de
portaria, em 19 de junho, que estabelece “orientações gerais” para a prevenção,
controle e mitigação da covid-19. O texto traz recomendações gerais sobre
distanciamento social, etiqueta respiratória, higienização de ambientes e uso
de equipamentos de proteção individual. Também orienta a elaboração de “plano
de ação para a retomada” por todos os setores da economia. Outra recomendação é
para triagem e monitoramento de pessoas que podem estar doentes. Na portaria, o
ministério recomenda distanciamento social de 1 metro e uso de máscara em
locais públicos e de “convívio social”.
O Ministério da
Saúde não informou a relação completa dos participantes da reunião do COE nem
explicou os pontos levantados na ata. No dia da reunião, a agenda de Pazuello
informava outros compromissos.
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