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DW - Bruno Lupion
Ao esconder dados da doença, Bolsonaro tenta criar confusão entre a população e reduzir verdade factual a uma mera questão de opinião. No exterior, tática deve abalar acordo Mercosul-UE e obtenção de vaga na OCDE.
As mudanças
adotadas pelo governo brasileiro na metodologia para contagem de infectados e
mortos pela covid-19 fazem parte de uma estratégia do governo Jair Bolsonaro
para confundir a população e reduzir o valor da verdade factual nas decisões
políticas.
Esse comportamento
afeta a confiança de outros países nos dados produzidos pelo governo brasileiro
e prejudica iniciativas de projeção global do Brasil, como a tentativa de se
tornar um membro da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE)
e garantir a aprovação do acordo de livre comércio entre o Mercosul e a União
Europeia, avaliam especialistas ouvidos pela DW Brasil.
Na sexta-feira
(05/06), o governo passou a esconder o número total de mortes e de casos da
doença, e anunciou que as divulgações diárias passariam a contabilizar apenas
as mortes por covid-19 ocorridas nas últimas 24 horas. A nova regra deixaria de
fora mortes ocorridas em dias anteriores, mas cujo diagnóstico de covid-19
havia sido confirmado nas últimas 24 horas, reduzindo artificialmente o número
de vítimas da doença.
Após reações
negativas de entidades de saúde, políticos e integrantes do Judiciário, o
governo anunciou nesta segunda-feira (08/06) que voltaria a publicar
informações detalhadas em um novo portal da internet. Posteriormente, o Supremo
Tribunal Federal (STF) determinou que o governo volte a divulgar os dados
totais como vinha ocorrendo até a semana passada. Ainda assim, persiste uma
desconfiança sobre manipulação dos dados relativos à doença, cuja divulgação já
vinha sendo dificultada nas últimas por outras medidas de redução da
transparência.
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Segundo reportagem
publicada pelo jornal Valor, militares em cargos estratégicos no
Ministério da Saúde têm pressionado técnicos da pasta a maquiar os dados sobre
a doença no país. Já o jornal O Estado de S. Paulo apurou que
a mudança nas regras para a contagem de vítimas da covid-19 ocorreu após o presidente
Jair Bolsonaro determinar que o número de mortes pela doença ficasse abaixo de
mil por dia.
Nesta
segunda-feira, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, afirmou
em seu Twitter: "A manipulação de estatísticas é manobra de regimes
totalitários. Tenta-se ocultar os números da #COVID19 para reduzir o controle
social das políticas de saúde. O truque não vai isentar a responsabilidade pelo
eventual genocídio".
Estratégia pensada
Após a mudança de
metodologia, os dados sobre o Brasil ficaram, por algumas horas do sábado
(06/06), fora do painel organizado pela Universidade Johns Hopkins, dos Estados
Unidos, uma das referências mundiais no acompanhamento da pandemia.
Filipe Campante,
professor de economia internacional da Johns Hopkins, afirma à DW Brasil que as
mudanças na contagem de casos determinadas pelo governo têm dois objetivos. Um,
mais superficial, é "esconder a realidade e a extensão do impacto da
pandemia no Brasil". O outro se insere na estratégia política de
Bolsonaro, que seria poluir o ambiente de informação para confundir o público e
enfraquecer a importância da verdade factual como guia para a definição das
políticas públicas.
"Mais do que
tentar convencer as pessoas [que a pandemia está sob controle], a ideia do
governo é criar confusão, criar a sensação de que a verdade é inalcançável e
que tudo se trata de opinião e interesses políticos, para que as pessoas
pensem: ‘Ninguém sabe muito bem o que está acontecendo. O governo está
manipulando, mas o outro lado – quem quer que seja o outro lado – está
manipulando também. Então é melhor nem tentar entender'", diz.
Segundo Campante,
essa estratégia é adotada por outros presidentes de perfil populista e também é
observada na Rússia liderada por Vladimir Putin. "A informação é
manipulada não para convencer alguém, mas para criar essa sensação de que a
verdade não existe", afirma.
A existência de
suspeitas sobre manipulação e ocultação de dados não é algo novo no governo
Bolsonaro, mas sim um "modus operandi" de sua gestão, diz Campante.
Houve problemas semelhantes em 2019 com os dados de desmatamento da Amazônia,
além de tentativas de o governo reduzir o alcance da Lei de Acesso à
Informação, posteriormente revogadas por decisões do Congresso e do Supremo.
Risco às instituições
A alteração da
metodologia para contagem de casos da covid-19 terá impactos não só para o
combate adequado à pandemia, mas também na reputação dos dados produzidos pelo
governo brasileiro como um todo, pois "ilustra um grau extremamente grave
de comprometimento das instituições do estado", afirma o professor da
Johns Hopkins.
Ele lembra um
exemplo ocorrido na Argentina há menos de uma década, quando o país começou a
manipular seus números da inflação – algo "semelhante em espírito e
método" ao que tenta o governo federal com a covid-19, diz. Como
resultado, o Fundo Monetário Internacional deixou de incluir os dados da
Argentina em seus boletins por falta de confiança nos dados.
Bruno Brandão,
diretor-executivo da seção brasileira da organização Transparência
Internacional, também cita a redução da confiança da comunidade global nos
dados brasileiros como efeito colateral das alterações na metodologia sobre a
covid-19.
"Um dos
pressupostos para a inserção internacional de um país é a confiança que ele
projeta nos seus pares e na comunidade internacional, e isso vem a partir da
transparência. Quando há ocultação ou manipulação de informação, isso gera
desconfiança, afasta o país dos processos internacionais e prejudica a
credibilidade do país frente à comunidade internacional", diz.
Brandão avalia que
a desconfiança sobre os dados brasileiros reduz a chance de o país ser aceito
como membro da OCDE, uma meta do governo Bolsonaro. "O principal objetivo
da OCDE é a melhoria e o estabelecimento de padrões de políticas públicas.
Quando um país começa a ter uma agenda própria, uma agenda desviante do padrão
internacional que preza pela transparência e confiança, isso certamente é
prejudicial à sua candidatura", diz.
Da mesma maneira, o
diretor da Transparência Internacional projeta maior dificuldade para a
efetivação do acordo de livre comércio entre o Mercosul e a União Europeia, que
ainda depende da ratificação dos países-membros do bloco europeu. "Na
situação atual, as atitudes do governo brasileiro a respeito da agenda
ambiental e da pandemia provocam um ambiente político muito desfavorável à
aprovação desses acordos, com implicações econômicas muito reais e concretas
para o Brasil", afirma.
Ele lembra que o
acordo estabelece regras sobre transparência e sustentabilidade, mas que a fase
final de avaliação do tratado não diz respeito ao conteúdo em si do texto, e
sim à discussão política sobre sua conveniência. À sensibilidade de parlamentos
de países europeus sobre a questão ambiental, se soma agora a preocupação com
os dados da pandemia, "que também são de interesse da comunidade
internacional".
Nesta segunda-feira
(08/06), a Organização Mundial de Saúde (OMS) se manifestou sobre o Brasil,
afirmando que considera "muito importante que mensagens sobre
transparência sejam consistentes, para que possamos confiar nos nossos
parceiros", e que espera que "qualquer confusão possa ser resolvida
agora, e que o governo e os Estados possam continuar fornecendo dados de forma
consistente para seus cidadãos".
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EM TEMPO: Será que existe alguma dúvida que Bolsonaro é genocida? Agora durmam com essa bronca.
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