quinta-feira, 7 de maio de 2020

Aldir Blanc, poeta da vida do povo



O PCB e o Jornal O Poder Popular prestam a devida homenagem ao inigualável artista brasileiro Aldir Blanc, que a crise sanitária e o capitalismo levaram na manhã da segunda-feira. 


Reproduzimos abaixo os textos de Marcelo Chalréo, Heitor César e Ricardo Costa, que foram publicados em nossas páginas do Facebook. Aldir Blanc, presente! Hoje e sempre!



Marcelo Chalréo
Presto aqui nessas breves linhas uma singela homenagem a Aldir Blanc, falecido neste dia 04 de maio por conta do Covid 19. Aldir, o “ourives do palavreado” no dizer de Dorival Caymmi, que versou sobre almirantes negros, boias frias, bêbados e equilibristas, corpos estendidos no chão, roncos de raiva e de fome, band-aid no calcanhar, dos que deviam algum no jogo e tanto mais, era poeta da vida crua e nua de milhões e milhões de brasileiras e brasileiros e tais como esses não dispunha de um plano de saúde privado, caro e custoso, que o permitisse se socorrer da saúde mercantilizada e privada.
Pagamento de direitos autorais em nosso país é pouco mais pouco menos do que uma vergonhosa expropriação do talento dos nossos artistas. Aldir vivia com modéstia. Só não era modesto no pensamento largamente democrático, anárquico, ateu, emotivo e solidário. Recluso há anos na rua Garibaldi – que se presta a homenagear ambos lutadores, Giuseppe e Anita, existência ambivalente ao encaixe da personalidade do Bairro da Tijuca – vivia entre seus milhares de livros (todos lidos), na companhia da combativa Mary, no embalo das visitas das filhas e nos extremos carinhos dos netos e das netas.

Aldir, personalidade carioca e de paixão intensa pela cidade do Rio de Janeiro à qual se referia como sua fonte primária de praticamente tudo, da sua vida e obra. Estaciano com dimensão nacional e do mundo, amigo pra muitas coisas, ferrenho antifascista, agora trova em outra parte do universo, mas, tenham certeza, irmanado conosco estará sempre por uma sociedade mais justa, igual e solidário.
Até qualquer dia, camarada !
Marcelo Chalréo é advogado e conselheiro da OAB-RJ
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Texto de Heitor César:
“Batidas na porta da frente
É o tempo…”

Aldir Blanc do “Me dê a Penúltima” teve sua saideira em tempos de bares fechados. Hoje, dia 4 de maio de 2020, perdemos Aldir Blanc, um dos grandes nomes da música brasileira. Compositor, Aldir Blanc foi responsável, em sua parceria com João Bosco e outros, por produzir poesias sobre o cotidiano e suas maravilhas dramáticas. Bares, vida noturna e boêmia, como poucos Aldir soube descrever o dia a dia, ou melhor, a noite a noite, daqueles que se esbarram e vivem onde a tristeza se encontra fingindo ser alegria e onde alegrias se somam tornando felicidade. Perdemos hoje aquele que melhor soube traduzir botequins e bares em poesia…

“…Mas hoje eu estou de bem comigo
E isso é difícil
Ah, vida noturna
Eu sou a borboleta mais vadia
Na doce flor da tua hipocrisia”

Bom descanso, Aldir Blanc…
Texto de Ricardo Costa para O Poder Popular:
Perdemos o poeta que cantava a vida da gente simples, do morro, do asfalto, da favela, das vielas, das biroscas, das encruzilhadas, das esquinas, das avenidas, dos terreiros, das quadras de samba, de todo o canto desta nação. Da noite, do dia, do alvorecer, entardecer, das madrugadas, dos sonhos e pesadelos, dos porres homéricos, das lutas, das batalhas contra o dragão da ditadura, do permanente bom combate por nossos direitos, pela dignidade, pela vida, pela vida, pela vida! Salve, guerreiro e mestre Aldir Blanc! Presente hoje e sempre!
O Cavaleiro e os Moinhos
Acreditar
Na existência dourada do sol
Mesmo que em plena boca
Nos bata o açoite contínuo da noite
Arrebentar
A corrente que envolve o amanhã
Despertar as espadas
Varrer as esfinges das encruzilhadas
Todo esse tempo
Foi igual a dormir num navio
Sem fazer movimento
Mas tecendo o fio da água e do vento
Eu, baderneiro
Me tornei cavaleiro
Malandramente
Pelos caminhos
Meu companheiro
Tá armado até os dentes
Já não há mais moinhos
Como os de antigamente

Compositores: Aldir Blanc / João Bosco

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