João Paulo Saconi e Natália Portinari
Extra, 19 de abril de 2020
O presidente Jair
Bolsonaro discursa para apoiadores em Brasília
A presença do presidente Jair
Bolsonaro em um protesto em frente ao Quartel General do Exército, em Brasília,
gerou reações de autoridades ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e
parlamentares. No ato, os manifestantes utilizaram cartazes e gritos de ordem
para expressar demanda inconstitucionais, como uma intervenção militar, o
fechamento do Congresso e do STF e um novo AI-5, ato que marcou o início da
fase mais violenta da ditadura militar. Entre os principais pedidos estava
também a retomada de atividades econômicas não-essenciais, interrompidas por
prefeitos e governadores como forma de combater o avanço do novo coronavírus.
O incômodo com o episódio ficou
evidente em mensagens publicadas nas redes sociais pelos ministros do Supremo
Marco Aurélio Mello e Luis Roberto Barroso, recém-eleito para presidir o
Superior Tribunal Eleitoral (TSE). Também se manifestaram o ex-presidente
Fernando Henrique Cardoso e o governador João Doria (SP). Houve ainda falas de
senadores — incluindo Randolfe Rodrigues (REDE-AC), líder da oposição no Senado
— e deputados. O PSDB, partido de FHC e Doria, se expressou por meio de nota
assinada pelo presidente da sigla, Bruno Araújo.
Além de ter se encontrado com os
manifestantes, que estavam aglomerados e contrariavam recomendações da
Organização Mundial da Saúde (OMS) e do próprio Ministério da Saúde, Bolsonaro
discursou para eles e depois reproduziu imagens da reunião nas redes sociais.
O ministro Marco Aurélio disse que o
ato é uma atitude de "saudosistas inoportunos":
— Tempos estranhos! Não há espaço
para retrocesso. Os ares são democráticos e assim continuarão. Visão
totalitária merece a excomunhão maior. Saudosistas inoportunos. As instituições
estão funcionando.
Barroso publicou duas mensagens no
Twitter nas quais classificou o traço autoritário do movimento como
"assustador" e afirmou que "pessoas de bem e que amam o
Brasil" não desejam o retorno do estado de exceção vivido entre as décadas
de 1960 e 1980.
"É assustador ver manifestações
pela volta do regime militar, após 30 anos de democracia. Defender a
Constituição e as instituições democráticas faz parte do meu papel e do meu dever.
Pior do que o grito dos maus é o silêncio dos bons (Martin Luther King). Só
pode desejar intervenção militar quem perdeu a fé no futuro e sonha com um
passado que nunca houve. Ditaduras vêm com violência contra os adversários,
censura e intolerância. Pessoas de bem e que amam o Brasil não desejam
isso", escreveu Barroso.
O ministro Gilmar Mendes não chegou a
se pronunciar, mas replicou em sua rede social a fala de Barroso, apesar de os
dois pouco se falarem.
O ex-presidente Fernando Henrique
Cardoso disse, em rede social, que é "lamentável que o PR adira a
manifestações antidemocráticas. É hora de união ao redor da Constituição contra
toda ameaça à democracia. Ideal que deve unir civis e militares; ricos e
pobres. Juntos pela liberdade e pelo Brasil."
Adversário político do presidente,
Doria fez menção direta à atitude de Bolsonaro.
"Lamentável que o presidente da
república apoie um ato antidemocrático, que afronta a democracia e exalta o
AI-5. Repudio também os ataques ao Congresso Nacional e ao Supremo Tribunal
Federal. O Brasil precisa vencer a pandemia e deve preservar sua
democracia", publicou o governador.
A nota emitida pelo PSDB e assinada
por Bruno Araújo, presidente da legenda tucana, diz que "o presidente
eleito jurou obedecer à Constituição brasileira" e que "ao apoiar
abertamente movimento golpista, coloca em risco a democracia e desmoraliza o
cargo que ocupa". Em nome do PSDB, Araújo afirmou ainda que "o povo e
as instituições brasileiras não aceitarão".
Eco na Câmara e no Senado
Também por meio do Twitter, senadores
e deputados se manifestaram sobre a presença de Bolsonaro na manifestação.
Houve publicações de Randolfe Rodrigues (Rede-AP), líder da oposição no Senado,
e dos deputados Marcelo Freixo (PSOL-RJ); Ivan Valente (PSOL-RJ), entre outros.
"Enquanto enfrentamos a pior
crise da nossa geração, com a capacidade do nosso sistema de Saúde
comprometida, com pessoas morrendo e os casos aumentando, Bolsonaro vai às
ruas, além de aglomerar pessoas, atacar as instituições democráticas. É patético!",
diz trecho da mensagem compartilhada por Randolfe.
O senador ainda cobrou atitudes do
procurador-geral da República, Augusto Aras, para que a participação de
Bolsonaro no ato tenha consequências jurídicas:
"Agora cabe ao procurador-geral
da República, Augusto Aras, abrir processo contra o Presidente da República por
mais esse atentado ao povo brasileiro. Se Bolsonaro não respeita a Constituição
Federal, as instituições devem funcionar tanto para ele, enquanto presidente,
como para qualquer cidadão que comete crimes!", defendeu Randolfe.
Para o líder da oposição na Câmara,
André Figueiredo (PDT-CE), o Congresso não pode cair no "jogo" de
Bolsonaro em prol de uma "ruptura democrática".
— Temos que ter muita serenidade para não cair
nessa cilada. Eu vejo que a irresponsabilidade dele já ultrapassou todos os
limites. Ir para o enfrentamento agora é colocar em risco a vida de milhões de
brasileiros. Não é o momento de jogar o jogo que ele quer jogar e que a legião
de cegos que o acompanha querem jogar.
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