EL PAÍS - Afonso Benites
Ministro confirmou, nesta segunda, que permanece no cargo. (Foto: Andre Coelho/Getty Images)
Desconfortável por
ter um subordinado que pensa e age diferente de si, o presidente Jair Bolsonaro pretendia
demitir Luiz Henrique Mandetta do
Ministério da Saúde nesta segunda-feira e trocá-lo pelo
deputado federal Osmar Terra. Não conseguiu. Assim que a notícia veio à tona,
começaram as poderosas pressões para evitar que o mandatário concretizasse a
exoneração do ministro, que é mais popular que o seu próprio chefe por causa da
coordenação das ações de enfrentamento à pandemia da Covid-19.
Houve quatro
frentes de críticas contra a decisão até então tomada pelo presidente:
1) generais do Exército, um
deles na ativa, com assento no Planalto, disseram que lhe faltaria apoio
popular e político para demitir um ministro que tem seguido as recomendações
das principais autoridades sanitárias do mundo;
2) congressistas o alertaram
sobre a possibilidade de atrapalhar ainda mais a relação no Legislativo e de
ver um dos pedidos de impeachment contra ele prosperar em médio prazo;
3) no
Judiciário, ao menos dois ministros do Supremo Tribunal Federal queixaram-se
de falta de liderança política no país e;
4) nas redes sociais, pulularam
manifestações de apoio a Mandetta. O ministro ganhou ainda uma demonstração de
suporte entre os seus: cerca de 150 servidores do Ministério da Saúde fizeram
um protesto em frente à sede do órgão para ameaçar uma demissão coletiva, caso
se concretizasse sua exoneração.
Novo round
No domingo, Bolsonaro demonstrou, mais uma vez,
estar descontente com a atuação de Mandetta na pasta. Ao falar a um grupo de
religiosos apoiadores que o aguardavam na entrada do Palácio da Alvorada, o
presidente disse que havia ministros que estavam se sentindo estrelas e que
poderia usar a “caneta” contra eles. Não citou nomes. Mas o recado foi direto
ao ministro da Saúde. “Algumas pessoas no meu Governo, algo subiu à cabeça
deles. Estão se achando. Eram pessoas normais, mas de repente viraram estrelas.
Falam pelos cotovelos. Tem provocações”, afirmou. “Mas a hora deles não chegou
ainda não. Vai chegar a hora deles. A minha caneta funciona. Não tenho medo de
usar a caneta nem pavor. E ela vai ser usada para o bem do Brasil, não é para o
meu bem. Nada pessoal meu. A gente vai vencer essa”, declarou o presidente.
No sábado, o
ministro deu mais uma demonstração dos holofotes que atraiu: gravou um vídeo
para músicos campeões de audiência no Brasil que fizeram apresentações ao vivo
em suas redes sociais, como Xand do Avião e Jorge & Mateus. Na gravação, Mandetta
disse a eles que o “show não pode parar”, mas as aglomerações, sim. Enquanto
isso, a interlocutores, o ministro reagia às queixas de Bolsonaro. Disse que
não aceitava ameaças. Que se Bolsonaro tivesse algo a fazer, que agisse, que o
demitisse. E insistiu em seu discurso feito na semana passada quando foi
questionado se abandonaria o cargo: “Médico não abandona paciente”.
Depois de um dia de
inteiro de rumores e uma série de reuniões, inclusive com Bolsonaro e sua
equipe de ministros, Mandetta surgiu para falar com a imprensa depois das 20h.
Discursando na sede do Ministério da Saúde, em Brasília, e em mais um sintoma
de uma crise com o Planalto que ganha ares surrealistas em meio à pandemia,
admitiu que vários funcionários seus já estavam limpando suas gavetas para irem
embora, inclusive as dele. E deu o recado: “Nós vamos continuar porque
continuando a gente vai conseguir enfrentar o nosso inimigo, que tem nome e
sobrenome, a Covid-19”.
A altivez do
ex-deputado vinha do respaldo angariado ao longo do dia e na semana passada. O
presidente do Congresso Nacional, senador Davi Alcolumbre (DEM-AP),
transmitiu o seguinte recado a Bolsonaro por meio dos ministros-generais Luiz
Eduardo Ramos (Governo) e Walter Braga Netto (Casa Civil): “o Congresso é
contra a saída de Mandetta. Isso iria prejudicar a relação com o Parlamento”.
Chamado para conversar pessoalmente com o presidente, Alcolumbre avisou que não
o encontraria e que a discussão estava acima de questões partidárias. Mandetta
é filiado ao DEM de Alcolumbre, pelo qual cumpriu dois mandatos de deputado
federal por Mato Grosso do Sul.
A pressão mais
intensa, contudo, veio dos militares dias antes. Na noite de quinta-feira
passada, quatro generais com assento no Planalto se reuniram com Bolsonaro logo
após ele conceder uma polêmica entrevista à rádio Jovem Pan,
na qual disse que faltava humildade a Mandetta e que ele deveria ouvi-lo mais.
O quarteto disse a Bolsonaro que ele deveria se calar para não deixar a crise
sanitária e econômica ainda mais grave. Pediram para ele não mexer em sua
equipe, por enquanto. Tampouco provocar governadores e prefeitos que decretaram
quarentenas. Disseram que, se ele não mudasse sua postura, poderia ser
pressionado a deixar o cargo.
EM TEMPO: Temos dois vírus: Bolsonaro e o COVID-19. Qual você prefere excluir primeiro para vencer o segundo? Lembrando que os militares jamais deveriam apoiar hum ex-militar indisciplinado como foi Bolsonaro. A disciplina militar não permite isso. Agora durma com essa bronca, uma vez que os conflitos internos, agora explícitos, existentes no governo apenas estão começando.
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