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© MPF - A sede da PGR, em Brasília; após interferência de
Bolsonaro na PF denunciada por Moro, integrantes do MPF temem riscos para
outros órgãos de controle
O ex-ministro da
Justiça Sergio Moro indicou o cometimento de crimes por parte do presidente
Jair Bolsonaro, e é preciso que as acusações feitas por ele sejam alvo de
apuração rigorosa — inclusive para que a Polícia Federal e outras instituições
de controle possam trabalhar livremente. Esta é a opinião da maioria dos
integrantes do Ministério Público Federal (MPF) ouvidos pela BBC News Brasil.
O clima na
corporação é de preocupação diante das informações trazidas pelo agora
ex-ministro — a avaliação é de que outras instituições de controle também podem
estar em perigo, caso a Polícia Federal deixe de ter as condições para
trabalhar.
Na tarde desta
sexta, o procurador-geral da República, Augusto Aras, pediu ao Supremo Tribunal
Federal a abertura de um inquérito para investigar as acusações feitas por Moro
contra Bolsonaro. Na peça, Aras aponta a "eventual ocorrência, em
tese", dos crimes de falsidade ideológica, coação no curso do processo,
advocacia administrativa, prevaricação e vários outros.
Sergio Moro
apresentou seu pedido de demissão em um pronunciamento à imprensa na manhã
desta sexta-feira. Em seu discurso de despedida, o agora ex-ministro da Justiça
e Segurança Pública acusou o presidente da República de querer trocar o comando
da Polícia Federal para ter acesso a dados sigilosos de investigações. Ele deixou o cargo
depois que o Diário Oficial da União (DOU) desta sexta-feira trouxe a
exoneração do então diretor-geral da Polícia Federal, Maurício Valeixo — o
policial foi indicado por Moro para o cargo e
era considerado seu braço direito na pasta. A demissão ocorreu contra a vontade
de Moro.
No pronunciamento à
imprensa, Moro também acusou o Palácio do Planalto de ter usado sua assinatura
eletrônica de forma indevida. Moro disse que nunca assinou a exoneração de
Valeixo, o contrário do que foi publicado no Diário Oficial na manhã de
sexta-feira.
Para o procurador e
professor de direito penal Vladimir Aras, as acusações dirigidas por Moro são
"bastante graves" — as funções da PF extrapolam as investigações
sobre corrupção, lembra ele.
Estudiosos do
direito consultados pela BBC News Brasil dizem que, em seu discurso de
despedida, Sergio Moro atribuiu a prática de crimes a Jair
Bolsonaro. "Vamos
esquecer um pouco a Lava Jato. A Polícia
Federal cuida de tráfico de pessoas; de tráfico de drogas; de questões
migratórias; de tráfico de armas; do combate ao tráfico de animais silvestres. E nós sabemos quais são as implicações disto tudo, se os órgãos que lidam com a
temática de defesa do meio ambiente, de defesa da sociedade contra a
disseminação de armas ilícitas, se isto tudo passa pela Polícia Federal",
diz Aras à BBC News Brasil. "Então, sem a
gente falar a palavra 'corrupção', já é bastante grave. Quando estamos falando
de uma interferência política sobre a corporação, é ainda mais grave. A
corrupção é criminógena (gera outros crimes), pois se o Estado não funciona
para reprimir a corrupção, ela vai continuar operando e permitindo que as
outras formas de delinquência se acentuem", disse ele. Vladimir é também
primo do atual procurador-geral da República, Augusto Aras.
O presidente da
Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), Fábio George Cruz da
Nóbrega, diz que a maioria dos procuradores avalia como "muito
graves" as alegações de Moro.
"Esta
avaliação, de que há indícios de crimes comuns da parte do presidente da
República, e até mesmo crimes de responsabilidade, ela é compartilhada (por
vários procuradores)", diz ele.
"Vamos lembrar
que, durante a evolução da nossa democracia, e da Constituição de 1988 para cá,
a independência das instituições, sem que um poder interfira nos outros, é uma
garantia fundamental. E que vem sendo, ou vinha sendo, respeitada", diz
ele. "A compreensão
nossa é a de que este fatos revelados hoje são mais um motivo para que as instituições
continuem apurando essas ocorrências. Há um reconhecimento da carreira de que o
momento é grave, de que as acusações do ex-ministro são gravíssimas",
disse o presidente da ANPR, entidade que representa os membros do Ministério
Público Federal.
"São bastante
preocupantes estas informações sobre tentativas de interferências em
investigações em curso. Até porque são investigações que correm sob segredo de
justiça, muitas delas. E só quem deve ter conhecimento sobre elas são os
juízes, servidores, policiais e membros do Ministério Público que nelas atuam.
E não outra autoridade que não tenha relação com os fatos", diz Alan
Mansur, atual procurador-chefe do MPF/PA.
"Portanto,
isso representa uma grave preocupação para todos que atuam nessas
investigações", disse ele. "É importante que as pessoas percebam o
quanto isso é ilegal (interferências). A cada vez que surge uma informação
dessa, a sociedade precisa demonstrar que não aceitará", diz ele.
Para um procurador
que atuou na Força-Tarefa da Lava Jato em Brasília, Bolsonaro não conseguiu
demonstrar trazer elementos suficientes para refutar as acusações feitas por
Moro. "Não foram
apresentadas, nem na declaração do ministro, e na declaração que o presidente
deu agora, qualquer razão plausível para a troca do comando da Polícia Federal.
Ou pelo menos, não foi totalmente convincente. Isso indica que este relato do
ministro Moro é, no mínimo, verossímil, e precisa ser apurado", diz ele.
Um outro
profissional, que foi contemporâneo de Moro na Força-Tarefa da Lava Jato em
Curitiba, disse não ter se surpreendido com a decisão do ex-ministro de deixar
o governo. "Ele agiu
corretissimamente. Ele nunca compactuou com estas coisas, não ia ser agora. Está
certíssimo. Não estou surpreso com a decisão dele não. É ruim (o ocorrido), mas
não estou surpreso não", disse.
EM TEMPO: Enquanto a maioria da população brasileira for excessivamente conservadora, sempre correremos o risco de serem eleitos políticos despreparados, ditadores, psicopatas e de todas as matizes da Direita e Ultra Direita. Escolham sempre os melhores e que apresentem propostas convincentes.
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