EL PAÍS - Afonso Benites
© SERGIO LIMA (AFP) Bolsonaro durante protesto que pedia o fechamento
de poderes no domingo.
No discurso aos
seus apoiadores, o presidente Jair Bolsonaro (sem
partido) diz que não faz acordos, que representa a nova política e que não
loteia o seu Governo para legendas. Na prática, isolado politicamente desde o
início da pandemia de coronavírus, agiu de maneira distinta e se aproximou de
figuras que foram condenadas ou são rés em dois dos maiores escândalos de
corrupção do país: o mensalão e a Lava Jato. Tudo contou com apoio da ala
militar de sua gestão. Desde a semana passada, Bolsonaro e seus ministros
participaram de reuniões com interlocutores da “velha política” que dizem
combater.
Estiveram à mesa
presidencial representantes de Valdemar Costa Neto (PL)
e Roberto Jefferson (PTB), ambos condenados no mensalão, além de Gilberto Kasab (PSD)
e Ciro Nogueira (Progressistas), investigados pela Operação Lava Jato (na noite
de quinta-feira a CNN e a revista Época publicaram um vídeo de
Jair Bolsonaro ao lado Arthur Lira (PP) onde o presidente cumprimenta a família
do deputado, réu em uma ação ligada à Lava
Jato). Na movimentação. ainda foram ouvidos representantes do
Republicanos. Juntos, esses cinco partidos têm 159 dos 513 deputados federais.
É o núcleo duro do bloco conhecido como Centrão. Atualmente, quase nada no
Legislativo é aprovado sem os votos desse grupo, que está sob a influência
do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM).
Oficialmente,
Bolsonaro pediu integração dos partidos para superar as crises sanitária e
econômica da covid-19. Nos bastidores, contudo, ele ofereceu dezenas de cargos
de segundo e terceiro escalão. Vai desde a presidência do Banco do Nordeste até
o comando dos Fundos Nacionais da Saúde (FNS) e da Educação (FNDE). No curto
prazo seus objetivos são frear o que considera “pautas bombas” que o Congresso
queira votar nesse período e evitar qualquer discussão sobre um eventual
processo de impeachment. No médio prazo, pretende influenciar na sucessão da
Câmara em janeiro de 2021, tendo um candidato governista para se
opor ao próprio Maia – que articula uma mudança constitucional para concorrer a
um quarto mandato consecutivo – ou a quem for indicado por ele.
Em contrapartida,
os partidos que emplacarem seus indicados já teriam maneiras de interferir na
disputa das eleições deste ano, irrigando prefeituras com recursos e ajudando a
eleger parte da base eleitoral que servirá de sustentação para o pleito de
2022. O primeiro sinal de que a articulação está dando certo ocorreu já nesta
quarta-feira, quando a pedido do Governo e de megaempresários, a Câmara
desistiu de votar um projeto de lei que obrigava as empresas bilionárias a
fazerem empréstimos compulsórios ao Executivo no período de combate à pandemia
de coronavírus. O autor da proposta é Wellington Roberto, líder do PL na Casa.
MDB, DEM e PP
O presidente do
MDB, Baleia Rossi, foi outro que se reuniu com o presidente. Mas ele diz que
nada lhe foi oferecido e que esteve na reunião apenas para colocar sua bancada,
de 34 deputados, à disposição do Governo para combater a covid-19. “O MDB não
reivindica, não pede e não indicará nenhuma função no Governo federal”, diz.
Rossi tem a missão de trazer alguma relevância aos emedebistas, que tinham
assentos em todos os governos desde a redemocratização. Diz que sua prioridade
não é buscar o embate, como Bolsonaro tanto apregoou nos últimos meses.
“Momento agora não é de radicalismo, de briga política”.
O próximo a se
reunir com o presidente é Antônio Carlos Magalhães Neto, que preside o DEM e é
prefeito de Salvador (BA). O encontro está previsto para esta quinta-feira. No
caso de ACM Neto, ainda não está clara qual será a postura de Bolsonaro. Os principais
incentivadores da aproximação de Bolsonaro com os representantes partidários
foram os ministros-generais Luiz Eduardo Ramos (Secretaria-Geral) e Walter Braga
Netto (Casa Civil). Eles entendem que, sem um elo entre presidente o
Legislativo, não será possível dar andamento às pautas econômicas necessárias
para auxiliar no combate à covid-19. A preocupação deles é a de evitar que as
pautas governistas inteiramente alteradas no Parlamento, como foi a ajuda
emergencial aos Estados e municípios.
No último dia 13, a
Câmara aprovou uma proposta que mais que dobrava os gastos que União pretendia
ter com essa ajuda financeira, atingindo o patamar de 89,6 bilhões de reais.
Sob a batuta de Maia e de governadores, o Centrão ajudou a desfigurar o pacote
de socorro fiscal desenhado pelo Ministério da Economia. Antes, os mesmos
parlamentares aumentaram de 200 reais para 500 reais mensais a ajuda de custo
que o governo deveria dar à população mais pobre durante o período da crise
– mais tarde o Executivo concordou em
elevar para 600 reais.
As alterações nas
propostas governistas fizeram com que Bolsonaro elevasse as críticas contra o
presidente da Câmara. O mandatário diz que o deputado quer tirá-lo do poder.
Sob a mesa de Maia há sete pedidos de impeachment que dependem de uma decisão
unilateral sua para serem iniciados. O clima esquentou depois que Bolsonaro
participou no domingo de um ato pró-fechamento do Legislativo e do Supremo
Tribunal Federal. E arrefeceu na segunda-feira, quando ele disse a apoiadores
que era a favor da democracia e entendia que todos os poderes deveriam seguir
abertos. Os vaivéns presidenciais, com acenos radicais e supostos recuos, têm
sido praxe, e estão longe de terminarem.
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