Por Milton Pinheiro
BLOG DA BOITEMPO
Com o advento do
coronavírus no quadro de condensação de crises no qual nos encontramos,
abriu-se uma disjuntiva com força na luta de classes: ou a classe trabalhadora
derruba Bolsonaro ou o militar-presidente, na sua lógica bonapartista, fará a
ruptura no Brasil.
O aprofundamento da
crise brasileira, iniciada pelas contendas entre as frações da burguesia
interna quando do afastamento da presidente Dilma, fugiu ao controle desses
segmentos e autonomizou-se com a chegada ao governo do nefasto agitador
fascista, Jair Bolsonaro. A incapacidade político-administrativa do
militar-presidente tem acelerado o quadro de condensação de crises no qual o
Brasil, com o advento do coronavírus, está desenvolvendo.
A grave crise
sistêmica da ordem do capital tem operado mudanças drásticas no capitalismo,
desvelando seu caráter corrosivo, modificando o papel do Estado na relação com
o processo de acumulação da burguesia. Nessa nova dinâmica, o Estado capitalista
foi capturado para esse patamar de uma reiterada tentativa de encontrar formas
extremas no processo de revalorização do capital e, sendo assim, avançar na
espoliação de forma agressiva. Aproveitando-se desse controle, a ordem do
capital estabeleceu uma plataforma ideológica cuja dominação alterou
consistentemente a subjetividade do proletariado e impôs o individualismo como
conduta política para a lógica cotidiana do senso comum.
Afirma-se, portanto,
uma permanente crise sistêmica que se alimentou dos passos incontornáveis que a
crise de 2008 trilhou, sendo importante registrar que ela já manifestava sinais
anteriores a esse epifenômeno. Porém, ao examinar a crise a partir de datas
cíclicas, a vulgata econômica (posição neoclássica) não consegue responder ao
debate em curso e apresenta uma análise de elevador, apenas justificando o que
sobe e o que desce em sua constante fuga da história.
Na ordem
sociometabólica do sistema do capital a estagnação capitalista e a dívida das
empresas com bancos privados têm sido a dupla farsa do jogo de aparências para
executar uma grotesca expropriação de mais-valia. Ao lado dessa operação, o
imperialismo reacendeu a sua formatação binária: crise e guerra, o que
possibilitou à pandemia do coronavírus desvelar a face oculta do capitalismo: a
extração de mais-valia.
A crise em curso tem
demonstrado que o neoliberalismo está cada mais exposto, suas características
primordiais que são as contrarreformas na ordem/forma do Estado capitalista
apresentam-se comprovadamente como falsa solução. A cena política tende a ser
desvelada e a correlação de forças pode modificar de forma célere em escala
global.
O governo de extrema
direita do fascista Jair Bolsonaro colocou o Brasil no laboratório do Caos
Controlado. A visão spenceriana (política pública de desarticulação do
acompanhamento social aos pobres) no comando da lógica do mercado cria um
sentido para que se projete um caos na vida social. Esse projeto tem destruído
a educação básica e superior, a ciência e a pesquisa, ao tempo em que ataca de
forma sem precedente a saúde, portanto, colocando em risco de morte a população
mais carente no Brasil.
A política do Caos
Controlado permitiu que o governo ampliasse, através das redes de contágios (as
várias redes virtuais), a agitação fascista através do militar-presidente e
implementasse pautas obscurantistas na ordem dos costumes, contrariando o
mínimo de progresso que existia nas relações da superestrutura.
Do ponto de vista do
projeto de governo, Bolsonaro tem consolidado um grupo palaciano formado por
militares que são contra a soberania do Brasil e que, apesar de não integrar a
burguesia, grosso modo opera o Estado brasileiro na perspectiva de facilitar
ações para o pleno exercício econômico daquelas frações da burguesia que
conformam o bloco no poder, em especial, aquelas que agem a partir do capital
financeiro e do pequeno círculo monopolista do varejo.
A área econômica do
governo, comandada pelo operador de fundos de pensão, Paulo Guedes, já
demonstrou desconhecimento macroeconômico e completa incapacidade para atuar no
setor público. O Caos Controlado está fugindo do controle do governo do ponto
de vista econômico, direcionando-se para aventuras imprevisíveis no cenário da
política econômica, cujo primeiro sinal é a estagnação e a queda sem limite da
projeção do PIB. A recente queda das bolsas, inclusive no Brasil, estimulada
pelo avanço do vírus, está sendo colocada como elemento central da crise.
Contudo, a crise sistêmica já havia encapsulado o governo do
militar-presidente, diante da sua incapacidade, e se estabelecido de forma
sustentável.
O governo do
militar-bonapartista Jair Bolsonaro tem privilegiado o capital financeiro,
atacado o setor público e beneficiado o capital monopolista e suas empresas.
Contudo, apesar das tradicionais frações da burguesia não terem, até este
momento, aprimorado o duelo entre elas, avançou a pequena política de balcão
com o estímulo do Palácio do Planalto para o imediato sequestro do fundo
público.
O caos político tem
estimulado projeções e começam a iluminar a luta de classes. Com o provável
acirramento da condensação de crises existe uma consistente possibilidade das
frações burguesas que, até aqui, restringiram seus confrontos ao ambiente do
balcão, alimentarem o confronto entre elas e o imponderável entrar em cena, com
escolhas políticas mais abruptas.
O governo da
repetição monetarista tem usado as reservas cambiais para conter o dólar, ao
lado disso sinaliza com um provável aporte para permitir que os bancos
continuem na zona de conforto; o farol da escolha acendeu uma opção pela fração
financeira dentro do bloco no poder. Mas, a lógica da insensatez é a marca
registrada do governo. Apesar da imensa subordinação à geopolítica
estadunidense, e, em particular, aos ditames do despachante da Casa Branca,
Donald Trump, o governo do agitador fascista provavelmente se manterá ainda
mais distante da defesa da economia global e procurará saídas dentro da lógica
da pequena política numa configuração retórica antiglobalista e de conteúdo
fascista para afirmar o projeto da extrema direita.
A lógica do caos
controlado está fugindo ao controle do chefe fascista no Brasil. A convocação
para que a sua base de apoio fosse às ruas contra o STF, o Congresso Nacional e
a esquerda, em momento de forte manifestação da crise econômica, abriu algumas
possibilidades para a constituição de um novo cenário. Todavia, existe uma
questão, a pauta do capital monopolista no Brasil será efetivada na
infraestrutura e na superestrutura com a visível condensação da instabilidade?
Essa condensação de
crises, causada pela expansão do vírus e da crise econômica, tem levado
Bolsonaro a jogar sua liderança na aposta pelo isolamento político e na
histérica defesa do capital financeiro e do varejo. Ao afirmar que o vírus, no
Brasil, será uma gripe sem maior importância, ele garante, se isso ocorrer, uma
confortável presença entre as massas e pode avançar no seu projeto
bonapartista. Contudo, se houver a confirmação dos especialistas de que o vírus
será letal em nosso país, Bolsonaro recorrerá ao que ainda tem: expressivos
segmentos neopentecostais, hordas de policiais (militares e civis), setores das
Forças Armadas e seguranças privados, bem como extratos racistas da pequena
burguesia (classe média), latifundiários e assaltantes de terras para operar o
mesmo projeto: a ruptura da ordem institucional.
Nesse quadro de
possibilidades, dentro do novo cenário, percebe-se que a correlação de forças
na luta de classes tem se alterado. Existe presença de massa para o fora
Bolsonaro, contudo, precisamos ir mais longe. A emergência da crise sistêmica,
o ataque imperialista no mundo, a lógica do ataque aos trabalhadores, a
escassez em tempos de abundância, a tentativa de destruir as diversas
identidades que são desrespeitadas no capitalismo em curso, nos permite
analisar que só o proletariado com seu freio histórico conterá a barbárie, o
golpe da extrema direita e o fascismo em curso. Abriu-se uma disjuntiva com
força na luta de classes: ou a classe trabalhadora derruba Bolsonaro ou o
militar-presidente, na sua lógica bonapartista, fará a ruptura no Brasil.
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Milton Pinheiro é
Cientista Político e professor Titular de História Política da Universidade do
Estado da Bahia (UNEB). Autor/Organizador de vários livros, entres eles,
Ditadura: o que resta da transição (Boitempo, São Paulo, 2014). Colabora com o
Blog da Boitempo esporadicamente.
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