Quais os interesses imperialistas no
seio da depredação bolsonarista da Amazonia?
Por André
Acier - Natal | @AcierAndy
Incêndios na
Amazônia, interesses dos imperialistas e do agronegócio brasileiro e a
"briguinha de compadres" entre Macron versus Bolsonaro (grifo do
blog)
A crise com a devastação da
Amazônia pela sede predatória de Bolsonaro e dos capitalistas do
agronegócio ganhou novas proporções. O tema ganhou repercussão
internacional e agora envolve um choque mais direto entre o governo de extrema
direita no Brasil, de um lado, e algumas potências imperialistas, em particular
a França, de outro.
Emmanuel Macron, presidente de uma
das mais antigas nações colonialistas da terra, buscou nestes últimos dias se
apropriar, em função de seus objetivos particulares, da ira mundial desatada
diante da destruição da maior floresta tropical do mundo pelo agronegócio
brasileiro. Na reunião o G7 - cúpula que abriga os países líderes da espoliação
mundial - Macron sugeriu tomar medidas acerca do tema. Jornais alemães como
o Die Zeit sugerem que chegou o momento de aplicar sanções
contra Bolsonaro.
Na fase atual do
conflito, Macron acusou Bolsonaro de mentir ao assumir compromissos
em defesa do ambiente na cúpula do G20, em junho, e afirmou que isso
inviabilizaria a ratificação do acordo comercial entre a União Europeia e o
Mercosul (a Irlanda seguiu a mesma linha). Esse acordo comercial entre os dois blocos
- um pacto de submissão do Cone Sul aos mandamentos do capitalismo europeu -
prevê, em 15 anos, zerar as tarifas de importação sobre cerca de 90% do
comércio bilateral, aprofundando o viés agrário-exportador do Brasil em troca
da importação da manufatura e alta tecnologia.
Desde a cúpula do G20 Macron (com o
beneplácito da chanceler alemã Angela Merkel) e Bolsonaro vem se engalfinhando
em disputas retóricas, e lançando mão de uma verdadeira constelação de
hipocrisias: o governo francês tenta se retratar como “o maior defensor da
biodiversidade e da natureza”, escudado no Acordo de Paris de 2015, enquanto
Bolsonaro chegou ao cúmulo de se postar como “combatente pela
soberania nacional contra a mentalidade colonial” dos europeus.
É impossível defender a
biodiversidade e os recursos naturais amazônicos sem atacar profundamente os
interesses dos capitalistas, tanto os nacionais quanto os estrangeiros, que
fazem a Amazônia - fundamental, entre outras questões, para a regulação da
temperatura na terra - arder em chamas, espremida entre o agronegócio e a
voracidade imperialista.
Em primeiro lugar, é preciso
esclarecer, como se ainda restassem dúvidas: Bolsonaro (assim como a cúpula das
Forças Armadas, estruturalmente vinculadas aos EUA desde a II Guerra Mundial)
não tem nenhum viés de defesa soberana dos recursos naturais brasileiros. É um
capacho que se ajoelha no altar de Trump e dos Estados Unidos; um literal
lambe-botas que entrega tudo o que pode, desde a base de Alcântara no Maranhão,
passando pela privatização de inúmeras empresas estatais com o objetivo de
entregá-las aos Estados Unidos (com a ajuda inestimável da pró-imperialista
Lava Jato), até a permissão para que uma empresa privada dos EUA
monitore a Amazônia no lugar do Instituto Nacional
de Pesquisas Espaciais (Inpe).
As medidas reacionárias de Bolsonaro
são ataques diretos aos povos indígenas e quilombolas, e aos meios de
existência de toda a população em benefício do agronegócio, dos bancos e
empresários.
Prova de seu
capachismo desenvolto é a própria assinatura do acordo comercial
Mercosul-UE. Como dissemos, Bolsonaro e
seu governo firmaram um pacto de escravização dos trabalhadores brasileiros à
volúpia dos conglomerados econômicos da
Alemanha, da Holanda, da Bélgica e da mesma França cuja mentalidade
colonialista julga combater.
Entretanto, as frases feitas de
Macron, Merkel, Boris Johnson e outros governos imperialistas sobre a “defesa da Amazônia” não passam disso: frases
demagógicas, cínicas e mentirosas. França, Alemanha, Inglaterra, Estado
Espanhol, Holanda, Bélgica não nutrem qualquer interesse pela preservação do meio ambiente.
São depredadores em grande escala.
Sua patranha em defesa da Amazônia coloca em primeiro plano o alerta contra
qualquer ilusão em que os maiores países opressores do mundo poderiam dar uma
saída benéfica aos problemas ambientais causados
pelo próprio sistema capitalista que comandam.
Há três
grandes eixos de conflito que atravessam a crise amazônica, que
revelam que a brutalidade de Bolsonaro não nos pode levar a cair na
armadilha dos interesses vorazes do imperialismo e seus monopólios, exímios
destruidores das riquezas naturais no mundo todo:
1. Guerra comercial
Estados Unidos e China
Um dos principais fatores materiais
que movem a crise ambiental brasileira é a postura do Brasil em meio a guerra
comercial entre Donald Trump e Xi Jinping.
O agronegócio brasileiro quer
aproveitar a janela de oportunidade que se abriu para a exportação de grãos
para a China. Isso porque este país aplicou tarifas à soja dos EUA,
prejudicando o preço desse produto norte-americano em represália às tarifas que
Trump aplicou contra a China. As novas tarifas chinesas atingem o valor de
U$S75 bilhões sobre a soja estadunidense.
Como o grão norte-americano ficou
mais caro, a China substituiu as compras dos EUA pelo produto do Brasil. Com
isso, o Brasil se tornou o maior exportador de soja para China – e do mundo. Em
2018, o primeiro ano da guerra comercial, as exportações brasileiras para a
China cresceram 35% na comparação com 2017, gerando uma balança comercial
positiva para o Brasil em US$ 30 bilhões. A soja foi a maior beneficiada, com
uma exportação adicional de US$ 7 bilhões para a China, na comparação com 2017.
As queimadas criminosas promovidas pelo agronegócio amigo de
Bolsonaro seguem a trilha da expansão da fronteira sojeira,
especialmente no Mato Grosso e no Mato Grosso do Sul, cujo aumento exponencial,
feito em base à destruição do meio ambiente, busca atender à sede de lucro dos
capitalistas do agronegócio com as exportações à China.
Desde 1850, quando o chefe do
Observatório Naval dos Estados Unidos, Matthew Fontaine Maury, sugeriu que seu
país evitasse a Guerra Civil e continuasse expandindo sua produção de algodão
com mão de obra escrava levando toda a estrutura, incluindo os escravos
africanos, para a região da Amazônia brasileira (como conta Gerald Home, no
livro “O Sul mais distante”), os
Estados Unidos tem interesses materiais diretos na Floresta Amazônica, e não
tem nada a ver com sua preservação.
São dezenas de monopolios e fundos de
investimento norte-americanos cuja cadeia produtiva está ligada ao
desmatamento, incluindo a BlackRock, maior gestora de ativos do mundo, e a
Capital Group, traders de grãos como Cargill e ADM, além de
empresas farmacêuticas (Johnson&Johnson e Pfizer), de engenharia genética e
de cosméticos que exploram as riquezas da região. Lucram com a destruição da
Amazônia, muito bem monitorada pelo Pentágono e pelo Exército ianque.
Diante disso, não espanta que
instituições como a NASA divulguem informações "preocupan-tes” sobre o avanço do desmatamento. Não
estão preocupados com a Amazônia ou o meio ambiente, e sim com os interesses
norte-americanos na maior floresta tropical do mundo, e também com a eficácia
da guerra comercial de Trump.
2. Conflito entre os
interesses do imperialismo europeu e o agronegócio brasileiro
Macron, assim como Trump, não tem
mais interesse na Amazônia do que proteger os negócios de seus monopólios
nacionais. Algumas das empresas que mais desmatam a floresta amazônica são
francesas: os bancos Crédit Agricole (maior banco varejista da
França) e o BNP Paribas, instituição financeira mais rica da
França, estão vinculados ao desmatamento, segundo relatório da Amazon Watch.
Empresas como Guillemette & Cie e Groupe
Rougier recebem regularmente toneladas de madeira da empresa
brasileira Benevides Madeiras, segundo o mesmo relatório. A francesa Dreyfuss
também tem altos negócios na Amazônia. Consideram-na
seu quintal de exploração capitalista.
Assim como os Estados Unidos, a
França e a Alemanha não desejam ver seu terreno de exploração eliminado em
função do agrobusiness tupiniquim.
Como velha potência colonial, que
submetia os países oprimidos a uma selvagem exploração, a França também foi
responsável pela liquidação dos recursos naturais e ambientais nos quatro
cantos do mundo. Basta como exemplo citar a história da colonização sangrenta
da África pela França nos séculos XIX e XX.
Os processos de descolonização entre
as décadas de 1950 e 1970 representaram uma nova fase da extração predatória
das riquezas nacionais africanas, junto ao brutal processo de extermínio da
população de países como o Congo, Guiné, Togo, Mali, Níger, Chade, Mauritânia,
e especialmente a Argélia, que vivenciou massacres sucessivos de sua população
entre 1954 e 1962.
A demagogia de Macron não pode
esconder que a França não tem nenhuma vocação de “respeito a biodiversidade”: é, sim, um dos países
que mais devastam a Amazônia.
3. Disputa entre
França e Alemanha no acordo com o Mercosul
Outro conflito inscrito na crise
amazônica ocorre entre a França e a Alemanha acerca do acordo pactuado entre o
Mercosul e a União Europeia. Berlim e Paris comungam do objetivo de sujeitar a
classe trabalhadora latino-americana a uma exploração superior. Este acordo de
submissão do Cone Sul da América Latina pelas potências européias, entretanto,
não as favorece por igual. Os principais ganhadores seriam os exportadores de veículos
alemães, que teriam tarifas zeradas para o escoamento da produção
automotriz.
Já a França seria consideravelmente prejudicada em seu setor agrícola,
que veria a entrada sem tarifas dos produtos agrícolas brasileiros aos mercados
europeus que ora domina.
A política agrícola é um dos pilares
da integração da União Europeia e é fundamental para a França. São os franceses
que conduzem a agricultura para o restante do continente. Além da França, a
Irlanda também exigiu insistentemente no último período para que a União
Europeia não fosse tão generosa no setor agrícola, especialmente o de carnes,
nesse acordo. O acordo vai na contramão dessas exigências: inclui uma cota
anual de 99 mil toneladas de carne com tarifas reduzidas.
Por isso o presidente francês ameaça
o cancelamento do acordo, usando a crise amazônica provocada pela sede
capitalista de Bolsonaro como álibi. Macron busca atender os interesses do agronegócio francês, que não deseja
a entrada de produtos brasileiros com maior facilidade na Europa, sem
com isso diminuir os acordos de exploração do Cone Sul. Assim também o primeiro
ministro da Irlanda, Leo Varadkar, anunciou que “diante dos acontecimentos” vai
bloquear a implantação do acordo.
A Alemanha, por sua vez, defende a
manutenção do acordo comercial, em vista do cenário caótico de sua economia,
que apresenta fortes sinais recessivos devido à retração do comércio mundial
(efeito do atrito entre EUA e China), que deprime sua produção industrial,
altamente dependente das exportações. O capital alemão precisa de novas zonas
de escoamento de sua produção, que não pode depender tanto da China e da UE em
crise.
Este conflito ainda está em curso e não
tem um final estabelecido.
Esses três elementos se imbricam na
catastrófica crise ambiental do Brasil. O certo é que a sanha dos
latifundiários sojeiros no Brasil por incrementar seus
negócios chineses se choca com a necessidade dos distintos imperialistas de
preservar seus próprios negócios na Amazônia, o que pode levar a que a crise
saia do controle nos marcos dos perigosos indícios de uma nova recessão
mundial.
Não podemos perder de vista a
antipatia entre Trump e os governos da França e da Alemanha. Golpear Bolsonaro
é um movimento que sugere indiretamente um ataque a Trump, que o tem como
aliado central na América Latina. Tanto assim que Trump anunciou ter falado por
telefone com Bolsonaro nesta sexta-feira (23), indicando que a relação entre
EUA e Brasil "nunca esteve melhor".
Bolsonaro, agronegócio e G7: tirem
suas mãos da Amazônia
Se é evidente que a expansão da soja
e os interesses do agronegócio brasileiro - intimamente vinculados ao capital
financeiro e aos bancos - são uma ameaça
direta ao meio ambiente, é certo que a voracidade dos governos imperialistas e
colonialistas estrangeiros não representa perigo menor. Falam da
Amazônia porque a querem integralmente para seus interesses monopólicos. Ao
lutar contra Bolsonaro, não podemos esquecer
de exigir que as grandes potências capitalistas tirem suas mãos de nossos
recursos naturais.
Em diversas partes do mundo os jovens
protagonizam inúmeras manifestações contra as mudanças climáticas fruto da
devastação ambiental, como as "sextas-feiras pelo futuro na Europa".
No Brasil também são os jovens a linha de frente dos questionamentos às
políticas devastadoras de Bolsonaro.
Proposições:
* É preciso um programa e uma
estratégia anticapitalista ao lado da classe trabalhadora para que essa jovem
geração possa lutar pelo seu futuro.
* É necessário impor a imediata
suspensão de todos os repasses financeiros bilionários do plano Safra aos latifundiários
e sua imediata aplicação em planos de combate ao incêndio, reflorestamento e
gestão das florestas.
* Frente aos bilhões de dólares
exportados anualmente em soja, milho e carne às custas de devastação ambiental
e humana, é preciso levantar uma campanha pela estatização sem indenização de
todas as traders e seus bilionários recursos financeiros,
logísticos e tecnológicos. A posse dessas empresas implicaria em um monopólio
estatal do comércio da soja, permitindo que essas riquezas não sirvam apenas a
um punhado de imperialistas e latifundiários. Uma empresa estatal, controlada
pelos trabalhadores, permitiria o uso das mais modernas tecnologias, hoje
empregadas para o lucro e a devastação, para o desenvolvimento humano e de
outro metabolismo, orgânico com a natureza e todos povos tradicionais e
originários.
* Uma reforma agrária radical,
abolindo o latifúndio depredador, é uma tarefa democrática que no Brasil está
indissociavelmente vinculada com a perspectiva de um governo dos trabalhadores
de ruptura com o capitalismo. Os governos
do PT, de conciliação com a direita e o agronegócio, apenas incrementaram os
milhões de hectares em latifúndios, que passaram a representar quase 25% do PIB
em 2015. O projeto de país petista, apoiado naqueles que hoje são
base do bolsonarismo, não é nenhuma alternativa ao cataclismo da extrema
direita.
* Elementos de um programa como este,
operário e anticapitalista, seriam uma poderosa alavanca na luta para os
trabalhadores de todo país tomarem em suas mãos a luta junto dos camponeses,
quilombolas e povos originários para abolir essa herança colonial e
escravocrata do latifúndio, e oferecer terra, crédito e tecnologias a todos que
queiram trabalhar nela.
* Impulsionemos com todas as forças
os atos em todo o país contra a destruição do meio ambiente pelos capitalistas,
inclusive aqueles que se revestem com peles de cordeiro para melhor explorar os
recursos mundiais.
Texto publicado em 23.08.2019 que ora reproduzimos
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