sábado, 27 de julho de 2019

Ministros e parlamentares avaliam que Moro extrapolou limites


THAIS ARBEX
Folhapress27 de julho de 2019

***FOTO DE ARQUIVO*** BRASÍLIA, DF, 02.07.2019 - Ministro da Justiça, Sergio Moro, depõe na CCJ da Câmara sobre o vazamento de mensagens ligadas à Lava Jato, em Brasília. (Foto: Pedro Ladeira/Folhapress)




BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O envolvimento do ministro da Justiça, Sergio Moro, nos desdobramentos da Operação Spoofing, que prendeu quatro supostos hackers nesta semana, reacendeu a pressão de alas do STF (Supremo Tribunal Federal) e do Congresso para que os dois Poderes deem resposta à atuação do ex-juiz da Lava Jato.

A avaliação de ministros da corte e de parlamentares da cúpula da Câmara e do Senado é a de que Moro extrapolou os limites de sua competência como ministro de Estado ao indicar que teve acesso a dados de uma investigação sigilosa da Polícia Federal.
A suposta quebra do sigilo do inquérito e o possível abuso de autoridade de Moro tornaram-se eixos de um processo de desestabilização.
Em conversas reservadas, políticos e magistrados dizem que a permanência do ministro no governo de Jair Bolsonaro (PSL) ficou insustentável e defendem que ele se afaste do cargo até a conclusão das investigações.
"Moro está confundindo de vez o papel do juiz com o de ministro. Diferentemente do que disse na Câmara, de que acompanhava a investigação apenas como vítima, ele deu sinais de que comanda a investigação ao violar seu sigilo [da investigação]. A lei de abuso de autoridade está na berlinda", disse à reportagem o líder do PP na Câmara, Arthur Lira (AL).
Há uma discussão em curso para convocar o ministro, tão logo acabe o recesso parlamentar, a dar explicações ao Congresso sobre o seu acesso ao inquérito. A ideia é que Moro seja provocado a responder como e em quais condições obteve a lista de autoridades hackeadas --uma vez que, na condição de ministro, ele não poderia ter ingerência sobre investigações da PF.
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Parte dos congressistas também defende a abertura de uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) para investigar a atuação de Moro e cobrar que ele diga, claramente, se viu o conteúdo das mensagens hackeadas.
Integrantes da base do governo no Congresso dizem, no entanto, que Moro apenas cumpriu seu papel como ministro da Justiça e, consequentemente, comandante da Polícia Federal.
"Moro agiu motivado por excesso de cautela e zelo. Ao tomar conhecimento de que autoridades de todos os Poderes haviam sido vítimas, o ministro expressou sua preocupação", disse à reportagem o senador Major Olímpio (SP), líder do PSL na Casa.
No Supremo, a avaliação é a de que, mais cedo ou mais tarde, o tribunal terá que se manifestar sobre a atuação de Moro --seja no caso da Spoofing ou à frente dos processos da Lava Jato em Curitiba.
Magistrados lembram que a corte pretende retomar, nos primeiros dias de agosto, assim que acabar o recesso do Judiciário, o julgamento da alegada suspeição de Moro no julgamento do caso do tríplex de Guarujá (SP), que levou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva à prisão.
Políticos e magistrados ouvidos pela reportagem na condição de anonimato disseram que, ao entrar em contato com autoridades para informá-las que estavam na lista de alvo dos ataques, o ministro invocou para si superpoderes e, de acordo com um parlamentar, criou uma relação de chantagem implícita com o mundo político e jurídico.
Na quinta (25), depois de Moro avisar autoridades vítimas de hackers que as mensagens capturadas pelo grupo preso pela Polícia Federal seriam destruídas, os presidentes do Supremo, ministro Dias Toffoli, e da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), demonstraram incômodo com a abordagem do ministro.
Os dois relataram a aliados que, diante da gravidade do caso, Moro deveria ter usado a via institucional para comunicar formal e oficialmente. A maneira como Toffoli e Maia foram contatados e o imediato vazamento das conversas causaram incômodo generalizado no Supremo e no Congresso.
Logo após as ligações de Moro, discutiu-se a possibilidade de os partidos de centro se unirem à oposição para ingressar com uma ação no Supremo contra a eventual destruição das mensagens captadas pelos hackers. Ficou decidido, então, que a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) faria a representação à corte.
Nesta sexta (26), em petição endereçada ao juiz Vallisney de Souza Oliveira, da 10ª Vara Federal do Distrito Federal, a OAB solicita que ele não autorize a destruição das provas.
No documento, o presidente nacional da OAB, Felipe Santa Cruz, diz que a indicação de Moro de que as mensagens seriam destruídas "atenta contra a competência do Supremo Tribunal Federal", "que pode eventualmente ser chamado a apreciar os fatos, uma vez que há possíveis autoridades atingidas pela invasão sujeitas a prerrogativa de foro, como no caso de ministro do Superior Tribunal de Justiça".
Moro telefonou para o presidente do STJ (Superior Tribunal de Justiça), João Otávio Noronha, para comunicar que ele estava na lista dos alvos do grupo preso na última terça (23) e que as mensagens capturadas seriam destruídas.
Noronha afirmou à Folha de S.Paulo que a informação foi dada pelo próprio ministro por telefone. A comunicação foi confirmada à reportagem pela assessoria de Moro.
O descarte de qualquer material apreendido em operações policiais é uma decisão que cabe à Justiça e só pode ocorrer com decisão do juiz.
O gesto de Moro provocou reação imediata. A Polícia Federal afirmou, por meio de nota, que caberá à Justiça, "em momento oportuno, definir o destino do material" apreendido na operação.
Também nesta sexta, o PT e o PDT ingressaram com ações no STF contra Moro. O documento dos petistas é assinado pela presidente do partido, a deputada federal Gleisi Hoffmann (PR), e pelos líderes da sigla na Câmara e no Senado, Paulo Pimenta (RS) e Humberto Costa (PE).
Eles classificam como espantoso o fato de "o ministro da Justiça ter acesso a dados de uma investigação sigilosa recém-instaurada pela Polícia Federal".
O PT diz que o ex-juiz cometeu crime de abuso de autoridade e de violação de sigilo funcional, além de querer destruir provas da Spoofing.
"Por estar à frente do Ministério da Justiça e não mais na cadeira de juiz, Sergio Moro não possui qualquer ingerência sobre investigações da Polícia Federal. Moro agiu em flagrante abuso de autoridade."
"A medida de aniquilamento de provas colhidas no contexto de uma investigação não pode ser tomada pelo ministro da Justiça, autoridade do Poder Executivo", diz a ação do PDT, que tem o ex-ministro Ciro Gomes como um dos advogados que a subscrevem.


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