Dia 08.04.2019
RIO – O
músico Evaldo Rosa dos Santos, de
46 anos, não foi a única vítima fatal da ação de militares neste fim de semana.
Na madrugada de sexta-feira, Christian Felipe Santana de Almeida Alves, de 19
anos, foi morto pelas costas, durante uma blitz do Exército na Estrada Pedro de
Alcântara, em Realengo, na zona oeste. Especialistas em segurança pública e
direitos humanos questionam a atuação dos militares.
“Não foi o primeiro
incidente”, disse a deputada estadual Renata Souza (PSOL), presidente da Comissão de Direitos
Humanos da Assembleia Legislativa.
“Na semana passada, um jovem foi assassinado pelas costas. Precisamos saber se
já estamos vivendo a política do abate.”
A deputada está
entrando com uma representação junto ao Ministério Público Federal,
pedindo a investigação dos dois casos.
Santana estava na
garupa da moto de um amigo de 17 anos. Segundo o Comando Militar do Leste (CML),
os jovens não obedeceram à ordem de parada na blitz que teria sido dada pelos
militares e furaram o bloqueio, sendo alvejados. A família do jovem contestou a
versão.
Na tarde de
domingo, o carro dirigido por Evaldo Rosa dos Santos foi atingido por mais de 80 disparos,
em uma ação de militares que supostamente teriam confundido o carro dele com o de
criminosos que agiam na região. O sogro de Evaldo, que estava
no banco do carona, ficou ferido.
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“A gente precisa
entender se são dois fatos isolados ou se essas ações já estão refletindo uma
mudança de atitude no comportamento de soldados e policiais na ponta, que já
estariam respondendo com o uso de muita violência mesmo em situação de dúvida”,
afirmou a cientista social Silva Ramos Amorim, do núcleo de violência da
Universidade Cândido Mendes, que coordenou o Observatório da Intervenção. “A
ideia de que atira primeiro e pergunta depois, da lei do abate, de que se for
bandido é legítimo matar já estaria tendo reflexos nos homens que estão nas
ruas?”
As especialistas se
referem à política de segurança pública defendida pelo governador Wilson Witzel, que defendeu em diversas ocasiões a lei do
abate. O governo estadual não quis comentar as análises e limitou-se a dizer
que “tem certeza” de que o caso está sendo apurado com rigor pelo Exército.
“É cedo ainda para
dizer que há uma correlação direta, mas o episódio deve ser visto com
preocupação; acendeu a luz amarela sobre os excesso no uso da força”, disse
Sílvia Amorim. “Eu sei que os dois episódios têm dinâmicas muito diferentes,
mas há protocolo para tudo.”
Pesquisador e
ouvidor da Defensoria Pública, Pedro Strozemberg também questionou a ação
militar de domingo.
“É de um despreparo
absoluto”, afirmou. “É claro que haverá ainda investigação e ela é fundamental,
mas 80 tiros de fuzil em uma viatura sem confirmação plena de que se tratava de
uma ameaça extrema aos agentes públicos é um absurdo.”
Outra questão
questionada pelos especialistas é o fato de a investigação do caso estar a
cargo da Justiça Militar, sob supervisão do Ministério Público Militar.
“Acho muito grave”,
resumiu Sílvia Ramos Amorim, que coordenou o Observatório da Intervenção durante a ação de militares no Rio, no ano
passado. “A Justiça Militar já deu provas, no passado, de que é extremamente
corporativa, parcial e injusta. Tivemos dois casos em 2018, no Salgueiro e na
Chatuba, durante a intervenção, em que houve evidências claras de excesso de
uso da força, mortes e invasões de casas e nada foi feito.”
Em 13 de outubro de
2017, o então presidente Michel Temer sancionou a Lei 13.491, que amplia as
possibilidades de militares acusados de crimes
cometidos no exercício da função passarem a ser julgados pela Justiça Militar,
mesmo em caso de as vítimas serem civis.
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