sábado, 1 de março de 2025

A hora e a vez do pesquisismo


Lula (aparecendo no celular) com outras lideranças durante evento em São Paulo (Foto: Ricardo Stuckert / PR)

 




 



A imprensa tradicional quer fazer Lula 'tropeçar e desidratar antes de chegar às urnas em 2026', alerta a jornalista Denise Assis.

Em 1964 os estadunidenses viram desfilar diante dos seus olhos o produto acabado de um golpe, cujas diretrizes ditaram e acompanharam par e passo, dando, inclusive, apoio financeiro, que impulsionou o protagonismo do Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (Ipês), até que o presidente João Goulart fosse derrubado. Na retaguarda, a imprensa, falada, escrita e televisada, que eram os veículos da época. A trama aparece em todo o seu vigor, nas gravações e documentos exibidos no filme de Camilo Tavares, “O Dia que Durou 21 anos”, e em obras sobre o período, fartamente estudado por historiadores e jornalistas.

Em 2016, novamente estavam na cena do crime, tendo a oportunidade de concretizar o golpe novo, com novas feições, sem sangue, de mãos limpas. A experiência de se verem ligados a um regime que torturava e matava não lhes agradou. Por isso, ficaram cheios de expectativa para ver ser colocada em prática as teorias de William Lind, que em 1989 previu em um artigo na Marine Corps Gazette que a próxima geração de guerras e golpes de estado seriam mais “fluidos” do que as guerras do passado.

Desta vez, usariam armas psicológicas, “arma operacional e estratégica dominante, assumindo a forma de intervenção midiática/informativa. As notícias televisionadas se tornarão uma arma operacional mais poderosa do que as divisões armadas”, previa o militar. Dito e feito. Quem acompanhou o noticiário sobre a Lava-Jato saberá bem do que estamos falando. Dilma sofreu um impeachment sem crime, provando, na prática, que a tese de Lind era, de fato, eficiente.

Acontece que se em 1964 a conta do golpe contra Jango e seus desdobramentos (as torturas) foi dividida com os EUA, em 2016 foi debitada flagrantemente no escaninho da mídia, que não teve como se esquivar das acusações de “golpista”. O país inteiro viu o noticiário apressado, unilateral, persecutório, que de tão pesado errou a mão. O que era para beneficiar o candidato do PSDB, levou ao poder, em 2018, como consequência da campanha desenfreada contra Lula e o PT, um quadro da ultradireita, tosco, autoritário, que reintroduziu no poder do país, os militares. Deu no que deu.

Agora, com vistas a 2026, quando o governo de Luiz Inácio Lula da Silva debela o desemprego, apresenta um PIB próximo a 4% e não para de divulgar bons resultados, é preciso colocar o pé no seu trajeto, fazê-lo tropeçar e desidratá-lo antes de chegar às urnas, ou até mesmo levá-lo a desistir de concorrer em 2026.

Para isto, a mídia não pode mais se expor em inventar “escândalos” e operações policiais espetaculosas. Criativos que são, como definiu o expert em pesquisas, o ex-diretor do Instituto Vox Populi Marcos Coimbra partiram para o “pesquisismo”, usando, numa operação casada, um noticiário obstinado sobre temas negativos antes, e uma pesquisa a seguir, explorando aquele nicho do noticiário, que já se impregnou na opinião pública.

Reparem que, até há uns dois meses, a pauta era o “arcabouço fiscal”. Eis que, no final do ano, quando foi aferido o déficit fiscal, o resultado bateu num mísero 0,9%, decepcionando geral. Como continuar batendo nesta tecla, se o resultado não justificava a grita? Não fazia mais sentido. Era hora de trocar de tema.

Com a alta de preços devido a quebra de safras, alterações climáticas, dólar subindo por causa das guerras lá fora e até estiagens no Sul, a escassez de alimentos veio a calhar. Sem esclarecer os motivos com veemência, para o respeitável público, mas escrevendo em bold todos os dias sobre a alta dos alimentos, encontraram, agora sim, o tema ideal. Deu certo nos EUA, onde elegeram Trump, apesar dos ajustes econômicos de Biden – não vai aqui nenhuma torcida -, por certo dará aqui.

O que nos disse Marcos Coimbra num dia, ficou evidente no outro, quando uma pesquisa encomendada por um grandão do mercado financeiro mostrou uma queda vertiginosa da aprovação do governo Lula, ficando acima dos 60% a margem de desaprovação. Perfeito.

Enquanto a pesquisa mostrava um retrato do momento, em que o “governo” e não o presidente Lula, é reprovado, as manchetes colavam em Lula o índice de desaprovação. É dele a conta? É, mas uma coisa é a rejeição ao governo. A outra, à pessoa de Lula, como dão a entender.

Assim, de pesquisa em pesquisa, a mídia tem suas manchetes atribuídas aos resultados delas e não mais ao “denuncismo”, dos tempos de Lava-Jato. Limpinha, sorridente, gasta horas com comentaristas discutindo onde estão as falhas da Comunicação, e as deficiências do ministro A, e do B.

Por hora, Lula aparece nas pesquisas ao lado de um quase condenado por golpe de Estado, ombreando com um inelegível. Por fora, sorridentes jornalistas olham para as lâminas das pesquisas – como quem diz: não somos nós, são elas que estão dizendo. No final de cada fala, apontam que existe um nome novo, que contentaria a todos, bem ali, à direita (só não dizem que é à extrema direita), que pode resolver todo esse quadro para 2026.

Deputados, às nossas custas, tramam com eles, de novo eles, os EUA, uma guerra por redes sociais – big techs -, numa ação de fora para dentro.

Enquanto isto, tome de entrevistas ao quase condenado, para manter a tal da polarização, tão danosa ao país. Como diria Lula, há tempo de plantar e tempo de colher. Do jeito que vamos, estamos plantando vento e, certamente, colheremos tempestade.

EM TEMPO: A legislação eleitoral deve se adequar a essa realidade típica de manipulação, exigindo a devida Prestação de Contas dos institutos de pesquisa antes e durante as eleições. Observem que as pesquisas em Pernambuco visam desgatar o governo Raquel Lyra. 

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