Marcia Carmo - De Buenos Aires para a BBC News Brasil
Sexta-feira, 6 de novembro de
2020
Biden deve ter uma política externa bem diferente da de Trump
Se o democrata
Joe Biden for eleito como novo presidente americano, haverá uma guinada na
relação do Brasil e de outros países com os Estados Unidos.
E as vias
diplomáticas e institucionais voltarão a ter prioridade sobre as relações
pessoais entre os presidentes — como, por exemplo, a relação de Jair Bolsonaro
com Donald Trump.
Estas são
avaliações do professor Arturo Valenzuela, da universidade de Georgetown, nos
EUA. Valenzuela colaborou com a campanha de Joe Biden e foi subsecretário
responsável pelas relações com a América Latina no primeiro governo de Barack
Obama. Também foi chefe do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca no
segundo mandato de Bill Clinton.
"Não pode
ser uma relação de amigos, de compadres, que têm certas tendências parecidas. A
relação terá que ser mais normalizada, no âmbito diplomático", disse.
"Acho que
Biden e sua equipe vão buscar fortalecer as relações com todos os países e,
especialmente, com o Brasil, pela importância que o Brasil tem na América
Latina e no mundo."
Em entrevista à
BBC News Brasil, falando de Washington, Valenzuela disse que Biden retomará a
linha de política externa do governo Obama.
A ideia é
privilegiar o multilateralismo, o diálogo entre os países, e valorizar as
instituições internacionais, como as Nações Unidas, a comissão de direitos
humanos da própria ONU, a Organização Mundial de Saúde (OMS) e a Organização
Mundial de Comércio (OMC), entre outras.
Valenzuela diz
que a postura de Bolsonaro — que chegou a dizer que torcia pela
vitória de Trump —pode ser um problema na relação com Biden,
mas que a tendência é o democrata normalizar as relações para que aconteçam no
plano diplomático, e não pessoal.
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"Ao
contrário de Trump, que, por exemplo, se retirou de instituições
internacionais, da cooperação com os países, Biden voltará a outra lógica. E
não pode ser uma relação de amigos, de compadres, que têm certas tendências
parecidas. A relação terá que ser mais normalizada, no âmbito
diplomático", afirmou.
Amazônia
Para Valenzuela,
se o democrata for o próximo a assumir a Casa Branca, caberá ao Brasil e,
especialmente ao governo Bolsonaro, "ver como manter uma relação
importante" com os Estados Unidos.
Na sua visão,
porém, alguns atritos são esperados em pelo menos duas frentes: a proteção da
Amazônia e a recente eleição do presidente do Banco Interamericano de
Desenvolvimento (BID), Mauricio Claver-Carone, que é o primeiro americano a
ocupar o posto que historicamente era de um latino-americano.
Em um dos
debates com Trump, no dia 29 de setembro, Biden falou claramente sobre sua preocupação com o desmatamento
na Amazônia brasileira.
"Começaria
imediatamente a organizar o hemisfério e o mundo para prover US$ 20 bilhões
para a Amazônia, para o Brasil não queimar mais a Amazônia. (A comunidade
internacional diria ao Brasil) aqui estão US$ 20 bilhões, pare de destruir a
floresta. E se não parar, vai enfrentar consequências econômicas
significativas", disse Biden no debate.
O presidente
Bolsonaro reagiu às declarações do democrata com uma série de postagens
críticas a Biden no Twitter. "Lamentável", "desastroso e
gratuito", disse Bolsonaro.
Valenzuela disse
que a Amazônia e todas as questões ligadas ao meio ambiente e às mudanças
climáticas passaram a estar entre as prioridades de Biden, algo que
"talvez não o motivassem tanto no passado".
Segundo o
professor e ex-assessor de Clinton, de Obama e do próprio Biden, o Brasil tem
um papel muito importante nesta agenda, para o planeta, devido à sua
"importância no mundo ecológico".
"A questão
das mudanças climáticas é essencial para toda a humanidade. E a Amazônia é
importante não só para o Brasil, mas para o mundo", disse Valenzuela.
Biden afirmou que
Brasil pode sofrer sanções econômicas se destruição da Amazônia continuar
A questão do BID
O professor da
Universidade de Georgetown diz que o presidente do BID hoje poderia ser um
latino-americano, caso o Brasil não tivesse dado seu apoio decisivo ao
candidato de Trump, Claver-Carone.
"Existiram
algumas relações muito privilegiadas do presidente Trump e (decisões) muito
próximas com o Brasil. Isso aconteceu no caso do BID", diz Valenzuela.
Ele diz que,
caso Biden seja eleito, sua intenção é que o banco tenha forte participação na
tentativa de recuperação econômica da América Latina — região muito castigada pelos
efeitos da pandemia no desemprego e no aumento da desigualdade social.
'Discurso vergonhoso'
Uma das
primeiras guinadas na política externa de Biden em relação à Trump será
relativa à situação dos imigrantes, diz Valenzuela.
"Biden não
vai repetir, de forma alguma, o discurso contra imigrantes, o discurso vergonhoso
contra os latino-americanos. Contra os que estão tentando chegar aos Estados
Unidos. Vai proteger os que estão buscando asilo de acordo com a lei",
afirma.
No segundo
mandato de Obama, quando era vice-presidente, Biden era o responsável pelos
temas latino-americanos e visitou os países da região.
Para Valenzuela,
pelo conhecimento que tem da América Latina, o provável futuro presidente dos
Estados Unidos entende a situação dos venezuelanos e dos cubanos que tentam
chegar ao território norte-americano.
"O desprezo
pelos imigrantes foi um pilar da política de Trump. Isso vai mudar. Biden vai
mudar o tom com todos os países e não somente com os mexicanos que querem
chegar aos Estados Unidos. Não são todos estupradores, como Trump disse",
afirmou Valenzuela.
Venezuela e Cuba
Valenzuela
afirma que a postura de Trump sobre a Venezuela, governada por Nicolás Maduro,
não deu resultados para resolver a "catástrofe humanitária". De
acordo com a ACNUR, agência da ONU para os refugiados, existem mais de quatro
milhões de imigrantes e refugiados venezuelanos no mundo.
"A política
em relação à Venezuela não deveria ser só com alguns aliados da América Latina,
deveria ser um esforço multilateral", afirma o professor.
Trump disse em
um dos debates com Biden que Obama tinha mandado construir "jaulas"
para imigrantes. Valenzuela contesta: "Isso é uma mentira. Não é verdade
que Obama fez jaulas para os imigrantes. O que foi feito, e que para muita
gente foi controverso, é que tinha gente que tinha cometido crimes nos Estados
Unidos e o que se buscava era, em alguns casos, repatriá-los. Mas isso das
jaulas e da separação das famílias foi algo que o presidente Trump implementou
violando todos os direitos das pessoas."
Valenzuela diz
que a relação fluida entre Trump e o presidente do México, Manuel López
Obrador, também é um caso de atuação de forma pessoal. "Com Biden, se
buscará um tratamento normal e não improvisado", disse.
O professor da
Universidade de Georgetown também afirma que estratégia de Obama para Cuba
"não era uma política de entendimento com (Raúl) Castro ou de apoio ao
governo cubano", mas de "tentar fortalecer a relação da cidadania
norte-americana e a cubana, diante de um dos últimos governos autoritários do
mundo".
"O governo
de Cuba controla tudo, salários e até o que os cubanos podem comer. Essa
política de 50 anos atrás não deu resultados. Acho que muita gente no Partido
Democrata quer voltar àquela política de Obama, e isso não é fortalecer um
governo autoritário, mas dar mais ao povo de Cuba para que possa evoluir para
um sistema democrático", diz o ex-assessor de Clinton e de Obama.
China
Valenzuela
afirma também que disputa entre os Estados Unidos e a China, na era Trump, não
beneficiou os americanos.
Na sua visão,
caso eleito, Biden não realizará uma política de confronto com outros países,
"mas de diálogo".
EM TEMPO: E agora Bolsonaro, com sua "arminha", vai guerrear, ou não, contra Biden? Será que Biden é "comunista" (rsrsrs)? Esse Bolsonaro é uma fuleragem. Não acha? Agora durmam com esse pesadelo.
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