Coordenação Nacional do Coletivo Feminista Classista Ana Montenegro
As prisões
brasileiras possuem a quarta maior população carcerária feminina do mundo, com
cerca de 42 mil mulheres encarceradas. O número total de mulheres em privação
de liberdade teve um aumento de 656% entre 2000 e 2016 no país. Segundo o
INFOPEN de 2018, 45% das mulheres em situação de cárcere estão presas sem
condenação. O perfil das mulheres presas no Brasil é de maioria negra, jovens,
possuem ensino fundamental incompleto e estão sendo punidas por crimes ligados
ao tráfico de drogas [1]. Diante desses dados, fica claro que o debate acerca
do encarceramento feminino no nosso país se faz urgente.
Vivemos em uma
sociedade dividida em classes e quando pensamos em um país de capitalismo
dependente como o Brasil, é evidente que há uma superexploração da força de
trabalho com o objetivo de acumular capital. Portanto, o Estado penal e as
prisões nascem com o intuito de manter a dominação de classe, manter o controle
da propriedade privada e como forma de conter a revolta e organização da classe
trabalhadora. Além disso, essas instituições perpetuam estruturas racistas e,
ao mesmo tempo, são produzidas por ela e operam através da busca desenfreada
pelo lucro, já que acabam gerando mão de obra barata.
Enquanto as prisões
se transformavam na principal forma de punição pública, as mulheres continuavam
a ser submetidas diariamente a formas de punição que não eram reconhecidas como
tal, como as instituições psiquiátricas que encarceravam essas mulheres se
utilizando da justificativa de que elas eram “insanas”. Nesse sentido, há uma
dupla penalização das mulheres: na maioria das vezes são consideradas como
“irremediavelmente perdidas”, pois além de quebrarem o “contrato social”, são
vistas como transgressoras dos princípios da condição de feminilidade. A
imposição de estereótipos e papéis sociais às mulheres é combustível central no
punitivismo e no encarceramento dos quais são alvo [2].
O abuso sexual é
institucionalizado nos sistemas prisionais e se apresenta em um dos aspectos
mais habituais do encarceramento feminino: a revista íntima. O Estado
naturaliza essa violência permitindo que essa revista vexatória permaneça, e
por deixar essas mulheres vulneráveis à coerção sexual imposta pelos
funcionários da prisão. É uma política de criminalização e de tortura
institucional que reafirma a orientação punitivista do sistema penal e
precariza ainda mais as condições de sobrevivência das mulheres presas.
Além das múltiplas
violências sofridas por essas mulheres, elas vivem o abandono da família e da
comunidade, a separação abrupta de seus filhos/as, falta de atendimento à saúde
adequado principalmente as gestantes, lactantes e mães, ausência de materiais
de uso pessoal e de roupas íntimas, entre outras inúmeras violações de
direitos.
Em 2006 foi
promulgada a Lei 11.343, nomeada “Lei das Drogas”, a qual endurece as penas por
tráfico de drogas e, consequentemente, aumenta o encarceramento. Antes dela,
13% dos presos cumpriam sentença por tráfico, enquanto, atualmente, no estado
de São Paulo, esse contingente é de 60% nas cadeias femininas [3]. O
encarceramento de usuários e pequenos traficantes se tornou regra na atividade
policial. Estamos diante de um encarceramento em massa, um fenômeno que vai
para além de evidenciar o aumento do número de pessoas em privação de
liberdade, mas que também escancara a desproporcionalidade racial, etária e de
gênero, e que demonstra que a tese de que a prisão colabora na redução da
violência é uma falácia [4].
Diante da pandemia do
novo coronavírus que já ultrapassa a marca de 111 mil mortos, a situação das
pessoas privadas de liberdade se mostram ainda mais precarizadas. Há escassez
de materiais de higiene, os número de casos estão subnotificados e há relatos
de torturas e negligência no tratamento de presos que apresentam sintomas
similares aos da COVID-19 [5]. As mulheres gestantes e lactantes sofrem com as
condições de saúde, higiene e segurança, são privadas de manter contato com
seus/suas familiares, se encontram em celas superlotadas e sem acesso a
materiais de higiene adequados. Apesar de terem sido incluídas pelo Ministério
da Saúde no grupo de risco, elas têm recebido reiteradas negativas da Justiça
para penas alternativas ou prisão domiciliar.
Entendemos portanto
que enquanto a classe dominante deter os meios de produção, haverá cada vez
mais prisões e outros diversos aparelhos punitivos do Estado que servem de
ferramenta para a manutenção dos interesses dessa classe. O sistema prisional
brasileiro criminaliza a pobreza e faz uma higienização étnica. Portanto, as
reformas a esse sistema se mostram insuficientes. Precisamos nos organizar
enquanto classe trabalhadora, por uma sociedade igualitária, pelo fim de todas
as opressões, pela construção do poder popular e por um mundo onde as prisões
não sejam necessárias.
O encarceramento das
mulheres negras é o encarceramento do povo negro!
Por uma sociedade
onde as prisões não sejam necessárias!
Pelo fim da
exploração e das opressões!
[1] Brasil. Sistema
Integrado de Informações Penitenciárias – INFOPEN. Brasília:
DEPEN/Ministério da
Justiça, 2018.
[2] Davis, A. (2003)
Como o gênero estrutura o sistema prisional. In: Estarão as prisões
obsoletas?
[3]
https://carceraria.org.br/mulher-encarcerada
Nenhum comentário:
Postar um comentário