domingo, 16 de agosto de 2020

Delação de Palocci sobre BTG e Lula não tem provas e foi baseada em notícias de jornais, diz PF

 

MÔNICA BERGAMO

Folhapress, 16 de agosto de 2020

 

*ARQUIVO* BRASÍLIA, DF, BRASIL, 07-06-2011: O ministro-chefe da Casa Civil Antonio Palocci, no Palácio do Planalto, em Brasília (DF). (Foto: Lula Marques/Folhapress)

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A Policia Federal concluiu que as acusações feitas pelo ex-ministro Antonio Palocci, da Fazenda, sobre um caixa milionário de propinas para Lula administrado pelo banqueiro André Esteves, do BTG, não têm provas e foram todas desmentidas pela investigação –inclusive em depoimentos de testemunhas e de delatores que incriminaram o PT em outros processos.

Na semana passada, o delegado Marcelo Daher encerrou o inquérito sem indiciar os acusados e afirmando que as informações dadas por Palocci em sua delação "parecem todas terem sido encontradas em pesquisas de internet", sem "acréscimo de elementos de corroboração, a não ser notícias de jornais".

De acordo com Daher, "as notícias jornalísticas, embora suficientes para iniciar o inquérito policial, parece que não foram corroboradas pelas provas produzidas, no sentido de dar continuidade à persecução penal". Ele encaminhou o resultado ao Ministério Público Federal. O inquérito foi aberto para investigar declarações de um dos anexos da delação premiada de Palocci homologada pelo ministro Edson Fachin, do STF (Supremo Tribuna Federal).

Palocci havia dito que, a partir de fevereiro de 2011, André Esteves "teria passado a ser o responsável por movimentar e ocultar os valores recebidos" por Lula, "a título de corrupção e caixa dois, em contas bancárias abertas e mantidas no BTG Pactual S/A, em nome de terceiros". O banqueiro teria depositado para Lula, num primeiro momento, R$ 10 milhões "de vantagens indevidas" para garantir influência no governo federal.

Em troca, receberia informações privilegiadas de decisões do Banco Central sobre taxas de juros. E depois dividiria parte dos lucros bilionários em operações com Lula, depositando os recursos em contas de terceiros. O esquema, segundo Palocci, teria sido bolado em 2009, em uma reunião informal "em uma mesa ao lado da piscina do Palácio da Alvorada". Nela estariam Lula, o então ministro da Fazenda Guido Mantega e o pecuarista José Carlos Bumlai.

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Lula teria comunicado que demitiria Henrique Meirelles do Banco Central. Guido e Bumlai armariam o esquema com André Esteves e o novo presidente da instituição. Esteves faria as operações por meio do Fundo Bintang, administrado pelo BTG. Em agosto de 2011, o esquema teria sido colocado em prática: segundo Palocci, Guido Mantega teria avisado Esteves de que o Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central baixaria abruptamente a taxa de juros Selic em 1 de setembro. Até então, ela seguia tendência de alta.

De posse da informação, Esteves teria atuado para que o Fundo Bintang tivesse lucros astronômicos, de 400% no ano. Parte dos ganhos teria sido destinada a Lula. Palocci afirmou também que André Esteves queria administrar, em seu banco, R$ 300 milhões de propinas que seriam dados ao PT pela Odebrecht. O ex-ministro "acreditava" que o banqueiro teria conversado sobre isso com Marcelo Odebrecht, numa reunião que ele, Palocci, havia marcado.

No relatório de conclusão do inquérito, a Polícia Federal relata que foram feitas operações de busca e apreensão e que o sigilo do Fundo Bintang foi quebrado. Análises técnicas foram feitas pelo Laboratório de Tecnologia Contra Lavagem de Dinheiro da PF de São Paulo. Os dados, segundo a PF, mostraram que o fundo, apesar de ter lucrado no mês apontado por Palocci, não teve ganhos em outras operações feitas com base em decisões do Copom. "Restou afastada eventual utilização de informação privilegiada quanto a outras datas de reuniões do Copom", diz o relatório do delegado Daher.

Intimado novamente para explicar o motivo de ter indicado especificamente o fundo Bintang como instrumento de operações com uso de informações privilegiadas, Palocci admitiu que "acompanhou as notícias do mercado na época" e que o "o nome Bintang foi o que ficou na memória". Os jornais, na época, haviam feito reportagens sobre os ganhos astronômicos do Bintang em setembro de 2011.

Já Marcelo Odebrecht afirmou que "houve uma certa confusão" de Palocci sobre o destino de propinas pagas pela empreiteira ao PT. Segundo ele, André Esteves nunca administrou esses recursos. Apesar de os dois terem boa relação, o banqueiro nunca teria comentado nada com ele sobre contas que administraria para o PT. Em depoimento, André Esteves negou as acusações. Disse que nunca administrou recursos para Lula e afirmou que conheceu Bumlai apenas em 2012 —três anos depois, portanto, da reunião na piscina apontada por Palocci em que o esquema teria sido arquitetado.

Além disso, o BTG não teria nenhuma ingerência sobre o Fundo Bintang, gerido por um único cotista, Marcelo Augusto Lustoza de Souza, que administrava seus próprios recursos. Lustoza também afirmou que não conhecia Esteves. O banqueiro afirmou ainda que seria estranho recorrer a Palocci para marcar um encontro com Marcelo Odebrecht, já que ele era muito mais próximo do empreiteiro do que do ex-ministro.

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