Por Ney Nunes – membro do Comitê Central do PCB
A denominada “Marcha
sobre o Supremo Tribunal Federal”, realizada por uma comitiva de industriais¹
sob a liderança de Bolsonaro e do ministro da economia Paulo Guedes no dia 07/5,
teve o objetivo declarado de pressionar os ministros do STF com relação às
medidas restritivas adotadas por governadores e prefeitos face a pandemia do
coronavírus. O ato deixou evidente, mais uma vez, o alinhamento desse setor da
burguesia com o que existe de mais reacionário no cenário político brasileiro.
Só um grau muito
elevado de ingenuidade ou de má fé pode explicar a persistência, entre aqueles
que se reivindicam de “esquerda”, do antigo discurso colocando em campos
opostos o chamado “capital financeiro” (banqueiros, rentistas e especuladores)
e o “capital produtivo” (indústria, agronegócio e serviços). Segundo eles, o
primeiro seria reacionário e entreguista, já o segundo teria um perfil
nacionalista e progressista.
Faz sessenta anos que
essa dicotomia, seguindo a tendência do desenvolvimento capitalista, perdeu
qualquer validade no Brasil. No final da década de 1950 se cristalizou uma
aliança estratégica entre estes dois setores. Aliança que, sob os auspícios do
imperialismo norte-americano, iria desaguar no golpe empresarial-militar de
1964.² A partir daí, a conjugação de interesses avançou, até chegarmos a
perfeita simbiose atual entre os setores burgueses hegemonizados pelo capital
financeiro.
Não sobreviveu nenhum
projeto nacional, democrático, desenvolvimentista que esteja amparado em
qualquer setor importante da burguesia brasileira. O projeto hegemônico não
contempla nada que não esteja inserido na associação, obviamente subalterna,
com os ditames econômicos e políticos do imperialismo.
Ao alinharem-se com a
política do governo Bolsonaro, os industriais prosseguem no curso da aliança
que fomentou o golpe de 1964. Sabedores de que, na atual fase do capitalismo,
necessitam intensificar a exploração dos trabalhadores em níveis similares ao
começo do século passado e que o exército reserva de mão de obra no Brasil
excede em muito as necessidades empresariais³, não hesitaram em promover a
marcha genocida sobre o STF, sob a batuta do presidente neofascista e do
ministro representante do “Deus Mercado”.
Nem com lupa se
encontram vestígios de progressismo entre os industriais brasileiros, mas, por
incrível que pareça, decorridos sessenta anos, ainda há quem insista nessa
procura.
¹ José Ricardo Roriz
Coelho, da Abiplast (Associação Brasileira da Indústria de Plástico);
Fernando Valente Pimentel, da Abit (Associação Brasileira da Indústria Têxtil e
de Confecção);
José Velloso Dias Cardoso, da Abimaq (Associação Brasileira da Indústria de
Máquinas e Equipamentos);
Paulo Camilo Penna, presidente do Snic (Sindicato Nacional da Indústria do
Cimento);
Elizabeth de Carvalhaes, da Interfarma (Associação da Indústria Farmacêutica de
Pesquisa);
Synesio Batista da Costa, da Abrinq;
Haroldo Ferreira, da Abicalçados (Associação Brasileira da Indústria de
Calçados);
Ciro Marino, da Abiquim (Associação Brasileira da Indústria Química);
José Jorge do Nascimento Junior, da Eletros (Associação Nacional de Fabricantes
de Produtos Eletroeletrônicos);
José Rodrigues Martins, da CBIC (Câmara Brasileira da Indústria da Construção);
Reginaldo Arcuri, da FarmaBrasil;
José Augusto de Castro, da AEB (Associação de Comércio Exterior do Brasil);
Marco Polo de Mello Lopes, da Coalizão Indústria;
Humberto Barbato, da Abinee (Associação Brasileira da Indústria Elétrica e
Eletrônica);
Um Representante da Anfavea.
² René Armand
Dreifuss; 1964: A Conquista do Estado; p.93. “As associações de classe: As
novas condições de desenvolvimento durante a década de cinquenta e o fato de os
empresários multinacionais e associados haverem percebido os seus interesses
comuns na modernização do país, assim como a necessidade do estabelecimento de
canais apropriados para sua crescente penetração, estimularam a rápida expansão
da estrutura associativa e a procura de novas formas de organização de interesses.
(…)
Três dos mais importantes focos de pressão política onde predominavam os
interesses multinacionais e associados eram a então renovada Federação das
Indústrias do Estado de São Paulo – FIESP, e sua organização idêntica CIESP,
Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (às quais estava ligado o fórum de
debate Roberto Simonsen), a Federation of the American Chambers of Commerce do
Brasil e o CONCLAP, Conselho Nacional das Classes Produtoras.”
³
https://economia.uol.com.br/noticias/estadao-conteudo/2020/02/15/informalidade-cresce-e-e-recorde-em-20-estados.htm.
EM TEMPO: Lembrando que essa "invasão" ao STF (Supremo Tribunal Federal) possa ter sido combinado com o Presidente do STF, Dias Toffoli
Nenhum comentário:
Postar um comentário